Há fantasmas na esplanada da Cinemateca
"Um fantasma é o medo que a gente tem dele", escreveu João Bénard da Costa a propósito de um certo filme de Joseph L. Mankiewicz. O título é O Fantasma Apaixonado (1947), com Gene Tierney e Rex Harrison, e inaugurou no último sábado a temporada de sessões na esplanada da Cinemateca. O que Bénard da Costa nos diz com essa frase é que, tal como Mrs. Muir (Tierney), não devemos temer o fantasma do Capitão Daniel Gregg (Harrison), porque depois de este se revelar, há um tal conforto na sua companhia que se descura a imaterialidade da presença. Por isso é tão adequado o nome do ciclo ao qual se extraíram os filmes a apresentar ao ar livre, durante este mês de julho: Fantasmas ao Nosso Encontro.
É uma sensação mágica que envolve a audiência nestas sessões em que os espetros do cinema estão connosco a céu aberto. Repare-se no derradeiro filme do programa, esse onírico O Retrato de Jennie (1947), de William Dieterle, que certamente transformará a própria tela em matéria vaporosa, onde Jennifer Jones, vinda das nuvens, se oferece à pintura de Joseph Cotten. Por falar em matéria vaporosa - desta vez bem longe da tradição romântica de Hollywood - eis aqui uma singular oportunidade para ver O Nevoeiro (1980), terror fantástico de John Carpenter, ou a silhueta de Joan Bennett na neblina noturna de uma cena de O Segredo da Porta Fechada (1947), de Fritz Lang.
Dentro do conjunto de filmes, que conta ainda com duas obras emblemáticas sobre as assombrações da mente - Contos da Lua Vaga (1953), de Mizoguchi, e A Mulher Que Viveu Duas Vezes (1958), de Hitchcock - saltam ainda à vista outros títulos raros. São eles The Tomb of Ligeia (1964), de Roger Corman, devoto da literatura escura de Allan Poe, e Carnival of Souls (1962), de Herk Harvey, filmes de atmosfera mórbida para uma bela noite de verão.
À parte do ciclo temático, acontece hoje, também na esplanada da Cinemateca, uma sessão de antecipação do DocLisboa, em que serão exibidas as curtas-metragens O Teto, da realizadora checa Vera Chytolová (em retrospetiva na próxima edição do Festival), e Un Jeu si Simple, de Gilles Groulx.