A senhora que se segue: Isabel Mota, há 20 anos na Fundação Gulbenkian
"Arguta, inteligente, sabedora e uma negociadora com imenso empenhamento." Luís Valente de Oliveira recua no tempo, à década de 1970, e lembra a primeira impressão que lhe deixou Isabel Mota, que hoje toma posse como presidente do conselho de administração da Fundação Calouste Gulbenkian, em Lisboa, sucedendo a Artur Santos Silva.
O encontro aconteceu em Washington e durou cinco dias. Valente de Oliveira liderava um projeto de desenvolvimento de Trás-os-Montes e Isabel Mota, licenciada em Finanças pela Universidade de Lisboa desde 1973, representava o Gabinete de Cooperação Económica Externa e do outro lado da mesa sentava-se o Banco Mundial. "Fiquei com a melhor impressão dela como técnica e como pessoa, qualidades determinantes na sua maneira de ser."
Em 1986, já ministro do Planeamento e Administração do Território do governo de Cavaco Silva, convidou-a para secretária de Estado. Isabel Mota, então conselheira na Representação Permanente de Portugal, em Bruxelas, aceitou. "Foi ao vê-la no trabalho que me apercebi da valia que ela poderia ter numa equipa", afirma Valente de Oliveira, hoje amigo de Isabel Mota e uma das pessoas que estarão na tomada de posse, às 15.00, no auditório 2 da fundação. "Podia lá faltar", exclama. "Ela merece ser presidente e a Fundação lucra muito em tê-la como presidente."
Consensualmente, fala-se da amabilidade e discrição da nova presidente da Fundação Calouste Gulbenkian, a primeira mulher a assumir o cargo. Ferreira do Amaral quase não precisa de ouvir as perguntas do DN para dizer sobre Isabel Mota: "Sou um admirador." Conheceram-se sendo ele ministro das Obras Públicas de Cavaco Silva. "Ela estava à frente dos Fundos Europeus e eu era um utilizador dos Fundos Europeus. Ela arranjava o dinheiro e eu gastava", ri-se. "Sempre admirei a competência. Sabia muito bem o que estava a fazer."
Depois da vitória do PS e de António Guterres nas eleições legislativas de 1995 filia-se no PSD e faz parte da direção de Marcelo Rebelo de Sousa. Hoje, o Presidente da República estará na tomada de posse.
O encontro com a Fundação Calouste Gulbenkian acontece em 1996. Emílio Rui Vilar, então presidente, convida-a para chefiar o departamento de Orçamento, Planeamento e Controlo. Três anos depois, Isabel Mota tornava-se administradora da instituição fundada pelo milionário arménio Calouste Gulbenkian. Por essa altura, desliga-se definitivamente da política.
Saúde e ação social
Nas duas décadas passadas na Fundação Calouste Gulbenkian sobressai o seu trabalho na área social e da ação social. Desempenha funções no Comité de Supervisão da Partex Oil and Gas (Holdings) Corporation, que gere os ativos de petróleo e gás da fundação, responsáveis por cerca de 20% do rendimento da instituição, sem fins lucrativos, fundada em 1956, seguindo as disposições testamentárias de Calouste Sarkis Gulbenkian, e a partir dos bens do mecenas.
A nova presidente foi eleita por unanimidade em dezembro de 2016 e é a sexta pessoa a ocupar a cadeira da presidência, depois de Azeredo Perdigão (1955-1993), Ferrer Correia (1993-1998), Victor Sá Machado (1998-2002), Emílio Rui Vilar (2002-2012) e Artur Santos Silva (2012-2017).
Nas suas primeiras declarações, em comunicado de imprensa, após a escolha, Isabel Mota refere a missão de acompanhar "os mais vulneráveis, que deverão ser os principais beneficiários da atividade da Fundação".
Carta de intenções para o mandato de cinco anos que hoje se inicia, o comunicado focava as outras áreas fundamentais de ação da Gulbenkian (arte, beneficência, educação e ciência): "O futuro, prosseguindo o propósito de manter a Fundação a acompanhar os novos tempos, tanto em Portugal como nas diferentes comunidades que serve" e "a arte e a cultura, que nos dão a sabedoria e constituem os alicerces da tão necessária tolerância nos tempos conturbados em que vivemos".
A Fundação Calouste Gulbenkian tem uma orquestra própria com cerca de 80 elementos, um coro, uma biblioteca, salas de espetáculos e duas coleções de arte - a do próprio Calouste Gulbenkian e a moderna, iniciada por Azeredo Perdigão e reunida a partir de 1983 no Centro de Arte Moderna. Em 2016, a administração liderada por Artur Santos Silva juntou as duas coleções num museu, liderado pela britânica Penelope Curtis.
Outra marca do mandato do banqueiro Artur Santos Silva foi a remodelação do Grande Auditório, um dos trabalhos em que Isabel Mota, 65 anos, esteve mais envolvida. "Foi feito com ela a coordenar as várias áreas. Foi ela que foi capaz de vencer todas as dificuldades e apresentar o que lá está hoje e que é ótimo. A remodelação foi profundíssima", lembra Valente de Oliveira. Se à época de reabertura o papel de Isabel Mota passou despercebido é, mais uma vez, porque "é discreta". "É uma senhora que não se põe em bicos de pé para nada, é uma das partes simpáticas da sua personalidade."
Mãe de quatro filhos e avó de onze netos, "tem uma vida familiar muito exigente", diz Valente de Oliveira. "E muitos amigos que gostam de estar com ela." Entre eles, Leonor Beleza, presidente da Fundação Champalimaud e outra antiga colega dos tempos do governo de Cavaco Silva.