A lição de Storaro
A presença de Vittorio Storaro em Cannes, na qualidade de diretor de fotografia de Café Society teve qualquer coisa de um renascimento. Não que ele tenha deixado de trabalhar, mantendo até uma colaboração regular com o espanhol Carlos Saura. O certo é que, talvez desde Bulworth - Candidato em Perigo (1998), de e com Warren Beatty, que o seu nome não surgia associado a um título com tanta divulgação mediática como este novo filme de Woody Allen. Das suas palavras, vale a pena reter a noção de que os novos recursos técnicos não constituem, em si mesmo, um valor: o que importa é conceber a intervenção técnica (neste caso no domínio fotográfico) como algo que só se justifica enquanto gesto ao serviço da conceção global da narrativa de um filme.
Claro que Storaro é o criador das imagens de filmes tão invulgares como Apocalypse Now (1979) ou Do Fundo do Coração (1981), para apenas citarmos duas referências com realização de Francis Ford Coppola. De qualquer modo, foi através de Bernardo Bertolucci que começámos a conhecer um pouco melhor o modo de trabalhar do director de fotografia. Bertolucci revelou que, durante a preparação de Um Chá no Deserto (1990), inspirado em Paul Bowles, Storaro lhe apresentou aquilo que era, no fundo, um novo guião, fundamentado na criação de uma paleta de cores para o filme, com as devidas variações previstas para cada uma das cenas.
Tudo isto envolve uma lição que importa não menosprezar, em particular no contexto de Cannes em que, não poucas vezes, tudo parece reduzir-se a peripécias mais ou menos fúteis das "celebridades": para Storaro, mesmo a mais sofisticada das intervenções técnicas só faz sentido em função de valores e parâmetros narrativos. À sua maneira com a luz e as cores, ele é também um contador de histórias.