Paulo Fonseca: "Vimos as colunas militares, ouvimos a sirenes, sempre com aquele sentimento de perigo"

Voo de 38 pessoas, cidadãos portugueses e luso-ucranianos, chegou a Lisboa na noite desta segunda-feira.
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Um dos 38 cidadãos portugueses que chegaram esta segunda-feira à noite em Portugal foi o treinador de futebol Paulo Fonseca, exausto após "muitas horas de viagem".

"Foi um alívio para mim e para a minha família, mas custa-me deixar aquele povo, que está a lutar de forma heroica. Sinto-me aliviado mas sinto uma tristeza muito grande", confessou o técnico português, atualmente desempregado, que contou como viveu as primeiras horas de guerra.

"Tínhamos viagem marcada para as 10.00 de quinta-feira, mas era 4.00 e começámos a ouvir as bombas a cair. Tentámos sair de Kiev, mas o trânsito era muito", lembrou, deixando elogios ao povo ucraniano: "Não tenho palavras para descrever o que se passa na Ucrânia. Aquele povo está a sofrer mas está a defender a sua pátria e o presidente é o primeiro. Há uma lista de pessoas que querem entrar para ajudar o Exército. Há figuras públicas que se estão a alistar. Já ganharam esta guerra."

Paulo Fonseca diz que tem amigos "que se alistaram para ajudar o Exército", que "estão bem, mas que estão na frente de batalha", e recordou a viagem de autocarro desde Kiev até à fronteira com a Moldávia: "Foi uma viagem difícil. Vimos as colunas militares, ouvimos a sirenes, sempre com aquele sentimento de perigo. As filas no trânsito eram enormes, nas bombas de gasolinas já não havia combustível nem comida."

Embora tenha chegado à Ucrânia para trabalhar em 2017, e logo no Shakhtar Donetsk, clube que estava deslocado em Kiev, o antigo treinador de FC Porto, Sp. Braga e AS Roma diz que "era imaginável que isto pudesse acontecer".

Em conferência de imprensa concedida ao lado da mulher, Katerina, Paulo Fonseca referiu que a comunidade internacional tem que "lutar" pela Ucrânia. "A comunidade internacional tem feito muito para ajudar a Ucrânia, mas é manifestamente pouco para salvar as vidas daquelas pessoas. Há algo mais a fazer. Temos que lutar por aquele povo", vincou, confessando que a situação até o fez esquecer do futebol, embora pense em regressar à atividade o início da próxima época.

Um voo de 38 pessoas, cidadãos portugueses e luso-ucranianos, chegou a Lisboa na noite desta segunda-feira, onde o ministro dos Negócios Estrangeiros, Augusto Santos Silva, explicou aos jornalistas como foi feita a operação.

"Organizámos a evacuação desde quinta-feira. Um grupo saiu na quinta-feira, outro na sexta. Os dois grupos atravessaram fronteira por via terrestre com a Moldávia e depois juntaram-se na Roménia, em Bucareste, de onde foi feita a ligação aérea com Lisboa. Neste voo vêm 38 pessoas, cidadãos portugueses e luso-ucranianos, alguns com os seus familiares. Alguns vão precisar de apoio do SEF e da Segurança Social", afirmou o governante, que revelou que um dos passageiros é uma "grávida mesmo no fim do tempo", que "por isso foi acompanhada por uma equipa do INEM"

Santos Silva explicou que a "embaixada de Portugal em Kiev não está operacional, porque o embaixador saiu por razões de segurança, mas mantivemos três funcionários ucranianos mas fluentes em português, que têm dado apoio aos portugueses na Ucrânia".

"Com estes 38, temos 75 cidadãos portugueses ou cidadãos ucranianos que saíram da Ucrânia com os seus familiares. Tive a felicidade de saber que dois estudantes que estavam com dificuldades em chegar à Polónia que já chegaram. Dos portugueses que ainda estão na Ucrânia, estamos a trabalhar com vários que desejam sair, mas a grande maioria quer ficar. Estamos a falar ainda de quatro dezenas de pessoas", explicou o ministro, que apelou "a todos, mesmo aos jornalistas, que não se desloquem para a Ucrânia", nomeadamente para Kiev e Kharkiv.

Santos Silva deu ainda conta da disponibilidade ilimitada de Portugal para receber refugiados ucranianos. "Não há limite para acolher refugiados. Estamos disponíveis para os receber. Temos 28 mil ucranianos em Portugal e têm-se integrado todos muito bem. A nossa capacidade está longe de estar esgotada, o nosso mercado tem um problema não de oferta de trabalho mas sim de oferta de trabalhadores. Há muitas empresas a oferecer trabalho", reiterou.

Sobre o pedido de adesão da Ucrânia à União Europeia, o ministro diz que "temos de nos focar no agora no envio de material humanitário e no combate à agressão russa". "É isso que a Ucrânia precisa agora", rematou.

A Rússia lançou na quinta-feira de madrugada uma ofensiva militar na Ucrânia, com forças terrestres e bombardeamento de alvos em várias cidades, que já mataram mais de 350 civis, incluindo crianças, segundo Kiev.

A ONU deu conta de mais de 100 mil deslocados e quase 500 mil refugiados na Polónia, Hungria, Moldávia e Roménia.

O Presidente russo, Vladimir Putin, disse que a "operação militar especial" na Ucrânia visa desmilitarizar o país vizinho e que era a única maneira de a Rússia se defender, precisando o Kremlin que a ofensiva durará o tempo necessário.

O ataque foi condenado pela generalidade da comunidade internacional e a União Europeia e os Estados Unidos, entre outros, responderam com o envio de armas e munições para a Ucrânia e o reforço de sanções para isolar ainda mais Moscovo.

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