Volta a Portugal. Uma edição especial com montanha logo a abrir
A 82.ª edição da Volta a Portugal em bicicleta arranca este domingo (27 de setembro) em Fafe para aquela que será uma edição especial, própria para este tempo de pandemia de covid-19. Em agosto, a prova rainha não foi para a estrada, mas como as tradições são para manter eis que a Federação Portuguesa de Ciclismo (FPC) assumiu as rédeas para que fosse possível salvar uma competição que teve a sua primeira edição em 1927, e que se realiza de forma consecutiva desde 1975.
A habitual organizadora - a Podium - renunciou ao seu papel em face do contexto sanitário e a FPC assumiu as suas responsabilidades, tendo o antigo ciclista Joaquim Gomes anunciado que, desta vez, não será o diretor da corrida.
Uma prova que não vai contar com a seleção nacional por decisão da delegada de saúde de Anadia, onde a formação estagiava, na sequência de um caso positivo de covid-19 num atleta.
O percurso possível desta edição especial da Volta, que terá um total de 1183,9 quilómetros, concentrou a montanha a abrir, deixando apreensivo um pelotão sem ritmo competitivo, que ao quinto dos nove dias da prova já terá subido Senhora da Graça e Torre. No fundo, é um percurso à imagem de Joaquim Gomes, com um prólogo a abrir, um contrarrelógio a fechar, e as incontornáveis chegadas a Santa Luzia e Senhora da Graça, com a Torre de regresso para desempenhar o papel de convidada especial.
Após quase seis meses de paragem devido à pandemia de covid-19, o pelotão nacional vai enfrentar três chegadas em alto, logo nas quatro primeiras etapas em linha, um risco calculado que pode significar que, no final da quarta tirada, a geral individual possa já estar definida, com possíveis acertos a serem realizados no contrarrelógio final ou a resultarem de azares envolvendo candidatos, e que, consequentemente, haja um desinteresse do público, desta vez obrigado a ver a corrida pela televisão.
Coube a Fafe, uma das paragens habituais da Volta a Portugal, a honra de inaugurar esta edição especial, com um prólogo de sete quilómetros que entregará a primeira amarela e que é talhado para homens velozes que se dão bem na luta contra o cronómetro.
A versão mais curta da corrida não permite momentos de descanso ou de transição e, assim, logo ao segundo dia, os ciclistas enfrentam a etapa mais longa da competição, uma ligação de 180 quilómetros entre Montalegre e o alto de Santa Luzia, em Viana do Castelo, onde está instalada uma contagem de montanha de terceira categoria coincidente com a meta.
O primeiro grande teste às forças dos favoritos está, todavia, reservado para a segunda etapa, que começa em Paredes e termina, depois de ultrapassados 167 quilómetros, no mítico alto da Senhora da Graça, em Mondim de Basto. Nesse dia 29 de setembro, o pelotão irá ainda enfrentar, antes da subida ao ponto mais alto do monte Farinha, outras duas outras contagens de primeira categoria, na serra do Marão (aos 96 quilómetros) e no Barreiro (131,7).
Os sprinters deverão ter uma oportunidade no final dos 171,9 quilómetros da terceira tirada, entre Felgueiras e Viseu, um dia teoricamente tranquilo para os homens da geral, antes da jornada que poderá ser a mais decisiva na luta pela amarela: na quarta etapa, há 148 quilómetros para percorrer entre a Guarda e a Torre, o ponto mais alto de Portugal continental.
A meta, coincidente com um prémio de montanha de categoria especial, será alcançada pela vertente que muitos consideram a mais exigente da Serra da Estrela, a subida de 20,2 quilómetros desde a Covilhã, com passagem pelas Penhas da Saúde. A escalada de segunda categoria nas Penhas Douradas (ao quilómetro 72,5) e a subida de terceira categoria em Sarzedo (111) completam a ementa montanhosa do dia.
A quinta etapa, que vai ligar Oliveira do Hospital a Águeda, ao longo de 176,3 quilómetros, dará nova hipótese de vitória aos mais velozes, na véspera de a Volta a Portugal assinalar o cinquentenário da primeira vitória de Joaquim Agostinho, num périplo de 155 quilómetros na região Oeste, entre Caldas da Rainha e Torres Vedras.
Loures, onde a República foi declarada um dia antes do resto do país, em 4 de outubro de 1910, assinala a efeméride com o arranque da sétima etapa, que terminará em Setúbal, já depois de uma subida de segunda categoria na Arrábida, a 13,4 quilómetros da chegada, e de percorridos 161 quilómetros.
No dia em que se celebram oficialmente 110 anos da Implantação da República Portuguesa, Lisboa vai coroar o vencedor da Volta a Portugal de 2020. O dono da camisola amarela será encontrado no final do contrarrelógio de 17,7 quilómetros, que parte da Avenida Ribeira das Naus para chegar na Praça do Comércio, depois de percorridas algumas das artérias mais simbólicas da zona ribeirinha e da baixa da cidade.
Nem os efeitos da pandemia de covid-19 parecem poder contrariar a hegemonia da W52-FC Porto nesta prova, que tem uma panóplia de líderes, além do ciclista João Rodrigues, para impedir o triunfo do pretendente Joni Brandão.
Desde 2013 que ninguém consegue travar a supremacia da formação baseada em Sobrado (Valongo) e, em ano de edição especial da Volta, será difícil que tal venha a acontecer, apesar de Joni Brandão querer vingar a dura derrota de 2019 e de os homens de Nuno Ribeiro terem sofrido um inesperado revés no último fim de semana, com as quedas de João Rodrigues e Amaro Antunes no Troféu Joaquim Agostinho.
É certo que a covid-19, e a paragem competitiva por ela motivada, impediu os dragões de intimidarem os seus adversários ao longo da temporada, mas perspetivar um resultado final em que um dos líderes da W52-FC Porto não seja o vencedor é quase uma miragem. E eles são vários: o primeiro, inevitavelmente, é João Rodrigues, o campeão em título, que terá a previsível companhia do regressado Amaro Antunes, um espírito livre que já foi segundo em 2017, no seu último ano no pelotão nacional, e do veterano Gustavo Veloso, vencedor em 2014 e 2015 e terceiro classificado no ano passado.
A eles, juntam-se os suspeitos do costume, os antigos vencedores da prova Ricardo Mestre (2011) e Rui Vinhas (2016), além do eterno Samuel Caldeira e de Daniel Mestre, o dono da camisola por pontos da última edição, com todos focados num objetivo único: que a amarela final fique na equipa, independentemente de quem seja o vencedor.
Talvez seja esse o segredo do sucesso de uma W52-FC Porto que só encontra rival numa Efapel super reforçada, apostada em levar Joni Brandão ao triunfo que lhe escapou em 2019, no contrarrelógio da última etapa, por apenas 27 segundos.
Num golpe de mestre, o mais consistente representante nacional nas últimas edições da Volta a Portugal não só apetrechou a sua equipa, como também roubou trabalhadores ao seu maior rival, contratando António Carvalho e César Fonte, ex-ciclistas dos dragões, além do experiente Tiago Machado e do explosivo Luís Mendonça, para tentar, finalmente, melhorar os segundos lugares conquistados em 2019, 2018 e 2015.
A obsessão de Joni Brandão pode, contudo, esbarrar noutros aspirantes ao trono: o incontornável Vicente García de Mateos (Aviludo-Louletano), terceiro em 2017 e 2018 e consideravelmente melhor contrarrelogista do que o chefe de fila da Efapel; o confiante Frederico Figueiredo (Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel), vencedor do Troféu Joaquim Agostinho disputado no último fim de semana; ou o reaparecido Delio Fernández (Nippo Delko Provence), terceiro da edição de 2014 e quarto no ano seguinte.
Embora a vitória final seja, à partida, uma luta restrita entre estes corredores, os quase seis meses de paragem competitiva motivados pela pandemia poderão causar surpresas na edição especial da Volta a Portugal, com homens como João Benta (Rádio Popular-Boavista), Henrique Casimiro (Kelly-Simoldes-UDO), Joaquim Silva (Miranda-Mortágua), Ricardo Vilela (Burgos BH), ou até Alejandro Marque (Atum General-Tavira-Maria Nova Hotel), vencedor no distante ano de 2013, à espreita de uma oportunidade para brilhar entre Fafe, onde no domingo arranca a edição especial, e Lisboa, palco do contrarrelógio final, a 5 de outubro.
Etapas
Aqui ficam alguns números a ter em conta para esta edição especial da Volta a Portugal, que arranca este domingo e vai até ao dia 5 de outubro, num total de 1183,9 quilómetros, percorridos entre Fafe e Lisboa:
0 equipas do World Tour, o escalão principal do ciclismo.
0 dias de descanso.
3 corredores cujo tempo conta para a classificação por equipas.
3 chegadas em alto (1.ª, 2.ª e 4.ª etapas).
4 camisolas em disputa - amarela (geral individual), vermelha (pontos), branca e vermelha (montanha) e branca (juventude).
5 equipas ProTeam (Arkéa-Samsic, Burgos-BH, Caja Rural, Nippo Delko Provence e Rally Cycling), o segundo escalão do ciclismo.
5 vencedores de edições anteriores presentes (João Rodrigues, Rui Vinhas, Gustavo Veloso, Alejandro Marque e Ricardo Mestre).
5 é o recorde de vitórias (David Blanco).
7 são os quilómetros do prólogo, em Fafe.
7 é o máximo de ciclistas por equipa.
9 dias de competição, menos dois do que nas edições anteriores.
15 equipas participantes (dez portuguesas, duas espanholas, duas francesas e uma norte-americana), menos quatro do que no ano passado.
17 contagens do prémio da montanha (uma de categoria especial, três de primeira categoria, três de segunda, quatro de terceira e seis de quarta).
21 metas volantes.
30 é a percentagem máxima de fecho de controlo de tempo previsto pelos regulamentos (8.ª etapa).
33 são as horas estimadas para o vencedor completar o percurso.
105 é o número máximo de corredores.
125 pontos atribuídos ao vencedor para o ranking Continental da União Ciclista Internacional.
148 quilómetros compõem a etapa mais curta (excluindo os contrarrelógios), entre a Guarda e a Torre (4.ª).
160.2375 é a frequência em que as informações da corrida são transmitidas na Rádio-Volta.
180 quilómetros compõem a etapa mais longa (2.ª), entre Montalegre e o alto de Santa Luzia (Viana do Castelo).
1183,9 é a extensão total em quilómetros, menos 347,1 do que no ano passado. *
1961 metros é a maior altitude a que os ciclistas vão chegar, na Torre, Serra da Estrela, ponto de chegada da 4.ª etapa.
2142 euros é o prémio para o vencedor da cada etapa, com exceção do prólogo (1043).
9090 euros é o prémio para o vencedor da Volta a Portugal.
70 754 euros é montante total dos prémios.