Visita régia
Na queijada Dona Amélia esconde-se outra parte da história de Portugal. Terá sido criada por freiras da ilha, para assinalar a visita de D. Carlos e Dona Amélia, em 1901. A monarquia estava no fim. O império resistiria algumas décadas, com esse ou com outro nome. A queijada dura até hoje.
Como-a aos sábados, e, neste domingo em que escrevo, parece-me sentir ainda no palato o sabor da canela, do mel de cana e da noz-moscada que nos ofereceram os navegadores, os aventureiros e os loucos.
Batem-se 500 g de açúcar com 250 g de manteiga. Juntam-se--lhes quatro ovos inteiros, mais quatro gemas e a raspa de um limão. Adicionam-se quatro colheres de sopa de mel de cana, 250 g de farinha de milho e uma pitada fermento, batendo sempre. Acrescentam-se 100 g de sultanas, uma colher de chá de noz-moscada e duas colheres de sopa de canela.
Mexe-se tudo e toma-se uma decisão importante: fazer uma tarte grande, para comer à fatia, ou enformar em queijadinhas? Eu prefiro as queijadas. Unto as formas, encho-as com o preparado e levo ao forno - 20 minutos a 150º C, não mais, para as deixar húmidas. No fim, polvilho tudo com açúcar de confeiteiro e enfio em papel plissado.
Não enfio nada. Ando há anos de volta da receita, que ma detalhou a Lídia, e ainda não a experimentei. Continuo a comê-las n"O Forno, da D. Ana Maria, com quem nunca me detive a conversar porque sou tímido com os meus heróis.
Há dias perguntaram-me, a propósito da vizinhança aqui da Terra Chã, se eu conhecia o engenheiro não-sei-quê. Encolhi os ombros e expliquei que, de qualquer modo, era mais provável conhecê-lo se se tratasse de um camponês, de um bêbedo ou de um ladrão.
Os aventureiros que nos trouxeram os ingredientes da dona amélia podiam ser meus vizinhos. Seriam visitas cá de casa.