Virtuosos e carregadores de piano.Nada mais justo e merecido do que a atribuição do famoso troféu Bola de Ouro ao extraordinário futebolista brasileiro Ronaldinho, do Barcelona. É um virtuoso capaz de executar os mais belos recitais de pontapé na bola de que há memória, nestes poucos anos que já leva o século XXI. Também constitui uma prova inequívoca de que o futuro do futebol precisa, como de pão para a boca, de artistas de grande talento para continuar a ser um espectáculo que atrai multidões, fazendo-as vibrar com interpretações geniais. Tal como a grande música, o futebol reclama excelentes orquestras, óptimos maestros e magníficos solistas para convencer e conquistar o maior número de adeptos..Dito isto, não desdenho os "carregadores de pianos" capazes de acartar com uma equipa às costas durante os 90 minutos que dura um jogo de futebol. São indispensáveis porque, sem eles, a equipa pode desarticular-se e desconjuntar-se, por mais notável que seja o treinador e por mais geniais que sejam os solistas. É por isso que admiro tanto um jogador como Frank Lam- pard, o mais talentoso "carregador de pianos" do futebol actual. Com uma vantagem enorme sobre os outros "carregadores de pianos" é que ele também sabe "tocar" muito bem "piano". É o esteio e a "dobradiça de ouro" do Chelsea. Como diz Mourinho, Lampard é um "superatleta": "defende, ataca, assiste, marca golos"..Admito que teria alguma dificuldade em eleger o Bola de Ouro de 2005, tendo em conta as espantosas exibições que Ronaldinho tem feito e o extraordinário recorde de 160 jogos consecutivos como titular na Premiership alcançado por Frank Lampard neste último fim-de--semana. Mas penso que acabaria por votar no artista brasileiro do Barça, sobretudo por razões de ordem estética, que tanta falta fazem ao futebol actual. .Ronaldinho é um artista capaz de sentar os adversários e de levantar os estádios. É um futebolista da estirpe de Di Stéfano, Puskas, Pelé, Eusébio, Cruyff, Beckenbauer, Maradona, Platini ou Zidane. Sem ignorar outros jogadores fabulosos, ainda que menos mediáticos, como Suárez, Sivori, Rivera ou Roberto Baggio. Para já nem falar do seu actual treinador, Frank Rijkaard, o único do trio maravilha holandês (constituído por ele próprio, Gullit e Van Basten) que, injustamente, nunca recebeu a Bola de Ouro..Mas eu percebo muito bem José Mourinho quando ele exalta Frank Lampard (foto) e o considera "um jogador de outro mundo". Porque é "o jogador de todos os dias, de todos os jogos, de Inverno e campos pesados, de Verão e relva seca, de adversários agressivos ou frágeis, de marcações directas ou zonais". Também porque treina "com intensidade e qualidade", tem "uma personalidade forte, uma ambição sem limites" e, ainda por cima, é "um exemplo de fair-play para fugir a amarelos e vermelhos". Lam- pard é um alicerce e Ronaldinho o violinista no telhado de uma casa construída com solidez e rigor..Digo mais se o meu clube tivesse dinheiro para adquirir apenas um destes dois magníficos futebolistas e eu fosse chamado a dar parecer, não hesitaria em aconselhar a compra de Frank Lampard. Para alicerçar a equipa numa base consistente e flexível. É, aliás, por isso mesmo que aposto tanto na progressão e amadurecimento de um jogador como João Moutinho, porventura capaz de se transformar, com experiência e tempo, na "dobradiça de ouro" do Sporting, tal como Lampard no Chelsea ou como Deco no Barça e na selecção nacional. Um meio-campo sólido e dinâmico é meio caminho andado para que os solistas que dão brilho às equipas encham o palco e dêem recitais de bola..De resto, firmando os pés na terra e olhando para a nossa Liga doméstica, gostei da exibição do Sporting, mas continuo ciente de que o teste mais difícil vai ser no Porto, na próxima sexta- -feira. Não me basta que, nos alcatruzes da Segunda Circular, a equipa de Alvalade esteja, agora, na mó de cima. Quero é que o Sporting dispute o título! .Alfredo .barroso