Vinte razões que vão dar ao vício Guerra dos Tronos
Amanhã, no momento preciso em que se estrear na TV a sétima temporada de A Guerra dos Tronos, com um argumento quase escondido e com milhões de espectadores a alterar as rotinas dominicais em função das vidas dos Lannister, dos Stark e dos Targaryen, vai reacender-se uma febre que manifestou os primeiros sintomas a 11 de outubro de 2011, num episódio em que se anunciava a chegada do inverno. Muitas estações depois, as razões para não ficar excluído desta torrente são muitas...
1. É uma série premiada, em múltiplas frentes. Se o único Globo de Ouro foi entregue ao ator Peter Dinklage (Tyrion Lannister) - que um estudo de matemáticos (!) determinou ser a personagem principal, em função do tempo de permanência em cena, do número de aparições e da interação com os seus pares -, tudo muda se olharmos para os Emmy. Em 2015, ao conquistar 12 troféus, tornou-se a série mais vitoriosa numa só edição. E ainda não acabou...
2. Não há cortes no investimento para conseguir a excelência: se a série começou com um orçamento de seis milhões de dólares por episódio, na temporada de 2016 todos os dez episódios tiveram um custo individual superior a dez milhões. Ou seja, a par de Friends, já é a mais cara de sempre. Os números, neste caso, querem mesmo dizer alguma coisa: na sexta época, houve filmagens em cinco países, 151 cenários diferentes, durante 240 dias, envolvendo 166 figuras no elenco, mil técnicos e cinco mil figurantes.
3. Dessa diversidade de ambientes resulta uma montagem esplendorosa. Estratégica, no sentido de prender o espectador. Mas que não atropela acontecimentos, bem pelo contrário - demora o tempo necessário e suficiente para que ninguém perca o comboio do argumento.
4. A procura dos melhores ambientes para cada uma das passagens da história, complexa e múltipla, permite, ainda assim, que se gaste menos em efeitos especiais, que também dispõem do seu quinhão, mas sem exageros.
5. A estratégia da escassez é inteligente: limitar as seis primeiras temporadas a dez episódios cada, com "aperto" para apenas sete naquela que amanhã se inicia, garante que não se "enchem chouriços".
6. Muito própria, a geografia da série é voluntariamente indefinida (além de alternada, para manter a dinâmica). Ainda assim, estará mais próxima da Europa do que de qualquer outra paragem conhecida.
7. Do mesmo modo, há uma clara incerteza histórica, apesar de George R.R. Martin, o autor dos livros que desaguaram na série, ter citado o medieval Ivanhoe, de Walter Scott, como fonte de inspiração.
8. Essas incógnitas parecem deixar os guionistas muito mais à vontade para a espécie de congresso, de assembleia magna das famílias disfuncionais que, como se sabe dos manuais, são uma ótima base para uma boa intriga.
9. Assim, incestos e nascimentos deles resultantes, violações, prostituição explícita ou velada, batalhas, assassínios, traições, um clima constante de conspiração, um sistema de alianças que é, no mínimo, volúvel, tudo serve de combustível a um enredo que não dá descanso.
10. A presença, nem sempre em primeiro plano, de uma guerra religiosa funciona como a cereja no topo do bolo.
11. Será sempre um trunfo a possibilidade de ressuscitar um herói, tal como acontece com o bastardo dos Stark, Jon Snow (Kit Harrington). A dar voz às más-línguas, esta circunstância extraordinária concedida a Snow poderá ter-se ficado a dever à ameaça da atriz Amanda Peet, que não participa do elenco mas é casada com o argumentista David Benioff - se o marido matasse o rapaz, ela pedia o divórcio. Seja como for, a ressurreição é uma estratégia comprovadamente eficaz desde os tempos de Cristo.
12. Outro ás: uma rainha loura, "mãe" de dragões, capaz de falar línguas estranhas, de comandar os animaizinhos pirómanos, de escolher a cada passo os seus homens e os seus aliados, nem sempre coincidentes. Esta deverá ser a temporada de maior destaque para Daenerys Targaryen (Emilia Clarke), uma das personagens que mais interfere com a vida real: em 2014, o nome Khaleesi (que quer dizer "rainha" numa das línguas da série) serviu para registar nada menos de 755 criancinhas.
13. Há anões e gigantes, dragões e uma espécie de mamutes. E há uns mutantes que podem ser zombies, vampiros ou apenas fantasmas maldispostos à escolha. É muito jogo...
14. O genérico da série é, na sua viagem ao longo de um mapa do fantástico, um sinal poderoso, apontando desde logo à enumeração das praças-fortes onde se desenrola grande parte da intriga e deixando bem à vista a imensidão territorial que deve ser percorrida para manter aceso o fogo da guerra.
15. A banda sonora confirma a tendência épica e impressiva do compositor alemão Ramin Djawadi, que também se notabilizou em filmes como Homem de Ferro ou Batalha do Pacífico, ou noutras séries como Prison Break. A música-base de A Guerra dos Tronos é fácil de decorar e consegue, num curto de espaço de tempo, ajudar a definir o perfil da série. Djawadi já a usou como parâmetro - basta ouvir a banda sonora do filme A Grande Muralha e descobrir as proximidades...
16. No elenco, o segredo está no equilíbrio: sólidas revelações, como Kit Harrington, Emilia Clarke, Sophia Turner, Maisie Williams ou Isaac Hempstead Wright, juntam-se a gente com carreiras sem nódoa, como Peter Dinklage, Lena Headey, Iain Glen, Liam Cunningham, Natalie Dormer, ou como os veteranos Charles Dance e Diana Rigg (lembram-se de uma série chamada Os Vingadores?). Com todo este mundo, acaba por ser uma série relativamente barata no que toca aos salários dos atores.
17. O realismo que envolve a série, denunciado por Charles Dance, que esfolou um veado.
18. A ligação à vida real: a atriz Sophie Turner, que veste a pele de Sansa Stark, ficou mesmo com a cadela Zumi, que, com o nome Lady, lhe fez companhia em cena na primeira temporada.
19. Um autor - George R.R. Martin - que sabe dar lugar aos especialistas, quando é caso disso, mas que não abdica de algumas convicções, como aquelas que valeram papéis aos atores Peter Dinklage e Sean Bean.
20. O facto de A Guerra dos Tronos ser uma síntese fantástica (e fantasista, até certo ponto) de outras referências fundamentais do nosso passado videográfico: além dos pontos de contacto óbvio com O Senhor dos Anéis, estão lá as famílias rivais de Os Sopranos, conspirações, traições e aproximações dignas de Os Homens do Presidente e bizarrias ao nível de Walking Dead. O que é que se pode querer mais?