Vergonha e pena de Durão Barroso

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É preciso ser ateu e descrente total na outra vida para poder aplaudir de pé a subida ao Olimpo do mais poderoso português em muitos séculos da nossa existência. Alguém, que acredite em Deus, estará por esta altura a rezar por Durão Barroso para que a sua alma se salve. Um agnóstico, como eu, não se incomodará nada com o que lhe possa acontecer nos próximos séculos, porque verdadeiramente nada sabe sobre a possibilidade de existir vida para lá da morte.

Sendo jornalista, e comentador de política, poderia obrigar-me a um dever de reserva. Politicamente correcto, poderia dizer, apenas, que não me parece bem que um ex-presidente da Comissão Europeia, que geriu como geriu a crise das dívidas soberanas, que esteve à frente do maior declínio civilizacional da União Europeia, vá agora ser o chairman do Goldman Sachs. A guerra que lançou nos Açores, prometendo a Jorge Sampaio que procurava a paz, habilitam-no para o lugar que vai ocupar. Sobre isso que ninguém tenha dúvidas.

Há momentos em que é preciso medir, de facto, o poder das palavras. Não para as tornar levezinhas, mas para lhes dar o peso que elas têm. Durão há muito que vendeu a alma ao Diabo. Não sinto orgulho nenhum, rigorosamente nenhum, em ver Durão Barroso chegar onde chegou. Dele não tenho inveja nenhuma, só vergonha e pena. Vergonha, porque vai haver muito quem lembre que ele é português, como ele próprio sempre fez. Pena, porque ele teve oportunidades para ajudar a mudar o mundo e preferiu mudar a vida dele.

Quero lá saber se ele é de esquerda ou de direita. Não quero eu e não quer o Goldman Sachs, que recruta em Bruxelas e envia altos quadros para as diferentes instituições europeias à mesma velocidade com que alimenta polémicas por causa das relações privilegiadas que mantém com muitos governos. Ele ainda tem o número de telefone de Obama, Merkel e companhia, pois que lhe façam bom proveito. Aos portugueses é que nunca os contactos de Durão serviram para coisa boa. Fomos com Bush para a guerra e com Merkel para o castigo. Isso, é verdade, ficámos a dever a Barroso. Que Deus o perdoe!

A fama de Barroso não se constrói porque se tem má imprensa. A cimeira das Lajes, a saída do governo para a Comissão Europeia, a gestão que fez dos seus mandatos, não são histórias inventadas por quem não gosta dele. São histórias verdadeiras que fizeram crescer o número de portugueses que, a Durão Barroso, nem um par de chinelos compravam. Há vida para lá dos egos e do dinheiro. A vida dos portugueses continuará difícil, apesar do sucesso de Durão.

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