Vendas de alimentos para fora não evitam catástrofe histórica nas exportações nacionais

Nos últimos 26 anos, as exportações só caíram três vezes nesta altura do ano. O pior momento aconteceu em 2009, em plena grande recessão global, quando retrocederam quase 23%. Neste ano, a queda já vai em 13%.
Publicado a
Atualizado a

As exportações portuguesas de mercadorias, que em 2019 valiam quase 70% das vendas totais do país ao estrangeiro (o resto eram serviços, sobretudo turismo), registaram, de janeiro a setembro deste ano, o segundo pior desempenho quando se compara com igual período do ano precedente.

Os cálculos são do DN/Dinheiro Vivo e têm por base os novos dados do comércio internacional, ontem divulgados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

Não fossem as vendas de produtos alimentares e a queda das exportações teria sido ainda mais pronunciada, sublinhou o INE.

A exportação de produtos alimentares e bebidas foi "a única grande categoria económica que registou, no período de janeiro a setembro de 2020, acréscimos face ao período homólogo, ao contrário da redução generalizada das exportações", observou o instituto.

Nos primeiros nove meses deste ano, os exportadores nacionais de mercadorias faturaram um total de 38,9 mil milhões de euros, menos 5,6 mil milhões de euros em relação há um ano. Esta redução representa uma quebra homóloga de 12,7%, a pior marca nesta altura do ano desde 2009.

No final de setembro desse ano, que foi amplamente marcado pela grande recessão global gerada pela crise bancária e financeira iniciada em 2007 e 2008 (queda do Lehman Brothers), as exportações de Portugal afundaram 22,8%, o valor mais negativo destes registos oficiais.

Agora, olhando para janeiro-setembro deste ano de pandemia, as exportações estão bastante mal: registam a segunda pior prestação das séries do INE, que remontam a 1994. Cerca de 26 anos, portanto.

Há já vários anos que as exportações foram eleitas como o motor "saudável" e desejável da economia nacional, de forma a compensar a dependência do exterior devido ao elevado consumo interno de bens importados.

Segundo o INE, "em 2020, entre janeiro e setembro, verificou-se um decréscimo significativo das exportações e importações face ao período homólogo, refletindo o contexto da pandemia covid-19". Os meses de "maior impacto" foram abril e maio, quando a esmagadora maioria dos países entrou em confinamento. "Depois verificou-se uma lenta recuperação."

Esses meses duros não são nem vão ser fáceis de apagar. O INE informa que, no primeiro trimestre, as vendas para fora começaram a cair cerca de 3%. No segundo trimestre, foi o colapso. As exportações afundaram quase 31% em relação ao mesmo período de 2019. Depois, com o desconfinamento em vários países, as exportações quase que pararam a sua sangria. Quase porque, mesmo assim, caíram 3,3%.

A situação não está de feição até final do ano. A segunda vaga da pandemia materializou-se e os números parecem ser muito piores do que na primeira. Resultados: os países entraram em confinamento outra vez (em Portugal está agora mais concentrado em 121 municípios problemáticos), o que isso terá certamente reflexos no comércio internacional até ao final do ano.

E quem está mal pode ficar pior, quem se aguentou até aqui pode ser que chegue a 2021 com poucos ferimentos.

De acordo com um levantamento feito pelo DN/Dinheiro Vivo, nos primeiros nove meses deste ano, os exportadores que mais sofreram o embate da pandemia foram os de "serviços de arquitetura e de engenharia; serviços de ensaios e de análise técnicas" - faturaram menos 65% em vendas ao exterior.

Mas quando se tem em conta o peso das exportações de cada produto, percebe-se que o ónus mais pesado recai sobre as vendas de produtos refinados (gasóleo e gasolina, basicamente), com uma quebra monumental de 31%.

As expedições de veículos automóveis, outra das grandes fileiras da exportação portuguesa, afundaram quase 23%.

As vendas de vestuário recuaram mais de 18% até setembro, a exportação de mobiliário também sofreu um revés desse calibre. O calçado e produtos de couro, idem.

Do outro lado da lista, houve quem ganhasse. A exportação de produtos alimentares avançou 2%, os produtos agrícolas e produção animal subiram 11%, os produtos farmacêuticos ganharam 13% nos mercados externos. As vendas de eletricidade e de gás aumentaram mais de 15%.

Luís Reis Ribeiro é jornalista do Dinheiro Vivo

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt