A final four da Taça da Liga abriu uma frente de polémica no futebol português por causa das decisões dos árbitros, sobretudo do videoárbitro (VAR). A contestação de vários quadrantes superou aquilo que foi a qualidade dos espetáculos no Estádio Municipal de Braga. Portugal foi um dos países europeus pioneiros na adoção desta tecnologia de auxílio do trabalho dos árbitros, que começou a ser aplicada no início da época passada (2017-2018), foi elogiada por uns e olhada com desconfiança por outros..Em outubro de 2017, pouco mais de dois meses desde a implementação do VAR, os presidentes da Federação Portuguesa de Futebol e da Liga, respetivamente, Fernando Gomes e Pedro Proença, alcançaram um entendimento para que o projeto fosse prolongado para 2018-2019, com a FPF a assumir os custos inerentes à utilização das imagens visionadas na Cidade do Futebol, em Oeiras..Na altura, Fernando Gomes fazia um balanço positivo dos primeiros tempos desta tecnologia: "Os resultados são evidentes. Neste momento há 16 decisões revertidas. Seriam más decisões, que foram transformadas em boas. Nem que fosse só uma ou duas já deveríamos estar satisfeitos com o processo." Já Proença enalteceu o "sucesso da implementação" do projeto..Em janeiro de 2018, o Conselho de Arbitragem reuniu-se, em Fátima, com os clubes da I Liga para uma sessão de explicação técnica sobre o VAR, durante a qual foi apresentado o protocolo a que o sistema tem de obedecer e anunciou que até à 17.ª jornada tinham sido analisadas 991 situações de jogo, revistas 41 decisões dos árbitros, das quais 28 foram revertidas..Apesar desta ação, à medida que a época foi decorrendo, dirigentes e treinadores não deixaram de se queixar de algumas decisões, algo que se prolongou já esta época, levando a que o Conselho de Arbitragem, no dia 10 de dezembro de 2018, admitisse na conta de Twitter sobre o projeto do VAR que tinham existido nove avaliações erradas nos 99 jogos da I Liga disputados até então, durante os quais tinham sido analisados 639 lances, dos quais 33 decisões do árbitro foram revistas, das quais 23 foram revertidas..Pouco mais de um mês depois dessa comunicação do Conselho de Arbitragem, a final four da Taça da Liga abriu até ao momento a maior crise relacionada com o VAR em Portugal, que levou mesmo o árbitro Fábio Veríssimo a pedir licença por tempo indeterminado na sequência da sua atuação na meia-final entre Benfica e FC Porto..14 clubes já protestaram em Espanha.Só que a polémica não é exclusiva de Portugal. Na Liga espanhola, que está na primeira época de utilização da tecnologia, a contestação é recorrente e começou mesmo antes da sua implementação, pois eram várias as vozes discordantes. E a verdade é que as coisas não melhoraram com o início do campeonato, pois após a 5.ª jornada o jornal Marca fez um trabalho em que detetou onze erros do VAR nos jogos disputados até então..As críticas foram-se sucedendo, mas no início deste ano subiram de tom quando os árbitros de serviço às imagens aparentemente festejaram um golo do Eibar ao Real Madrid, algo que provocou uma enorme onda de contestação por parte dos merengues, até porque, num jogo anterior, um desses videoárbitros, Munuera Montero, não tinha analisado um lance de penálti a favor dos madridistas frente à Real Sociedad. O Real Madrid apresentou mesmo uma queixa à Real Federação Espanhola..Na semana passada, Carlos Velasco Carballo, chefe do Comité de Árbitros de Espanha, veio defender o uso do VAR apresentando resultados "positivos" nos primeiros meses de utilização, defendendo que a margem de erro das decisões dos árbitros foi reduzida para 4,79%. De acordo com os dados da Liga espanhola, 19 dos 26 erros dos árbitros de campo foram corrigidos pelo VAR..Até ao momento, 14 dos 20 clubes da Liga espanhola já se queixaram da atuação do videoárbitro. Nesta semana, ao mesmo tempo que a polémica em Portugal estava lançada na Taça da Liga, o Leganés enviou um e-mail para a RFEF - Real Federação Espanhola de Futebol e para o Comité Técnico dos Árbitros a pedir explicações por ter sido validado o golo de Luis Suárez, que deu vantagem ao Barcelona por 2-1, queixando-se de uma "clara falta" sobre o seu guarda-redes..Esse lance motivou uma onda de protestos, incluindo do Real Madrid, uma vez que na terça-feira o treinador Santiago Solari veio lançar algumas questões para cima da mesa. "O VAR um sistema que nos confunde relativamente à arbitrariedade na aplicação das decisões. Desejamos clareza. Como espectador não entendo o funcionamento", sublinhou..Florentino Pérez critico e debaixo de fogo.Já nesta quinta-feira, Jaume Roures, empresário que forneceu a tecnologia do VAR para Espanha, Portugal e México, teceu duras críticas a Florentino Pérez, presidente do Real Madrid, que telefonou a Luis Rubiales, presidente da RFEF, para se queixar das atuações dos videoárbitros. "Florentino Pérez foi um dos melhores presidentes do Real Madrid, mas agora acho que está demasiado fanático, devia ter a cabeça mais fria", começou por dizer aos microfones da Rádio Marca, acusando-o depois de fomentar uma campanha contra o VAR: "Até ao penálti de Vinícius [não assinalado no jogo com a Real Sociedad] não havia problema nenhum com o VAR. E foi aí que começou uma campanha dos simpatizantes de Florentino. Só mentes febris podem pensar que há imagens escondidas. Dizem-se enormes disparates.".E nem Ernesto Valverde, treinador do Barcelona, foi poupado por Roures, que também o apelidou de "fanático" por ter dito que não foi falta de Luis Suárez sobre o guarda-redes do Leganés. "Fornecemos repetições suficientes para que se decida. O VAR funciona, mas é preciso que os árbitros decidam", disse em defesa da tecnologia que fornece..Pochettino faz aviso em Inglaterra.Em Inglaterra, o VAR só entra em vigor na próxima época, mas nesta semana ouviu-se uma voz de alerta. Mauricio Pocchetino, treinador do Tottenham, pediu para que os responsáveis máximos da Premier Legue adiem por um ano a sua implementação.."Ninguém na Europa está satisfeito com o VAR e o que me preocupa é que possa começar a aborrecer os adeptos. Se pararmos o jogo por cinco minutos não sei como eles vão reagir", começou por dizer o técnico argentino, defendendo que "é boa ideia adiar o uso do VAR porque nós não temos toda a informação, não sabemos como funciona ou como este sistema pode ser desenvolvido"..Mudanças fazem efeito na Alemanha.É bom lembrar que na Alemanha o uso do videoárbitro esteve tremido nos primeiros meses da sua aplicação na época 2017-2018 e vários clubes solicitaram mesmo a sua suspensão na pausa de inverno do campeonato. Só que, apesar de todas as críticas, a direção da Bundesliga decidiu não só manter o VAR como voltou a utilizá-lo nesta época. No início desta época, em conferência de imprensa, Lutz Michael Fröhlich, chefe dos árbitros da federação alemã, admitiu que "houve algumas dificuldades iniciais porque nem tudo estava otimizado"..E nesse contexto adotaram algumas medidas para melhorar o auxílio aos árbitros, procederam a três mudanças que se revelaram importantes: nos ecrãs dos estádios, após a análise do VAR, passaram a ser explicadas as decisões tomadas; na transmissão televisiva, os telespetadores passaram a ter acesso às imagens da repetição do lance, do árbitro e das imagens do VAR; e a informação passou a chegar o mais rápido possível aos comentadores da transmissão das partidas. O certo é que a contestação ao sistema videoárbitro acalmou..Menos problemas em Itália.Cristiano Ronaldo já apanhou a tecnologia do VAR no segundo ano de aplicação na Série A italiana, mas após meia época na Juventus afirmou gostar do sistema. "Assim há menos erros. Há situações muito difíceis de ajuizar. Temos de deixar os árbitros fazerem o seu trabalho", disse no final de dezembro..A verdade é que Itália tem sido o país onde a experiência tem corrido melhor, talvez porque tenha havido uma minuciosa preparação antes da sua implementação. Ainda assim, em março de 2018, os adeptos da Lazio insurgiram-se contra os erros dos árbitros e da tecnologia numa manifestação antes de uma partida com o Bolonha, chegando mesmo a pedir que a equipa abandonasse o campeonato italiano..O balanço de vários analistas italianos é positivo, embora reconheçam que ainda é preciso melhorar algumas questões. Contudo, os focos de polémica não foram abolidos e ainda recentemente os responsáveis do Torino contestaram o árbitro Paolo Valeri por não ter ido ver as imagens de um lance em que Emre Can, médio da Juventus, terá tocado a bola com a mão dentro da sua área. É um claro exemplo que no futebol a controvérsia existirá sempre, mesmo nos campeonatos onde o VAR tem melhor aceitação.