Vanuatu. O país sempre à beira do desastre, mas feliz, porque: "Kava é vida"

Mala de viagem (189). Um retrato muito pessoal de Vanuatu.
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No encontro da Nova Zelândia, os peritos em turismo ouviram os vanuatenses, mas essencialmente provaram no final a bebida mais popular do seu país, considerada a bebida nacional de Vanuatu. Kava é feita da raiz de uma das plantas locais e bebe-se ritualmente em vez de cerveja. Com 80 das 118 espécies de kava crescendo em Vanuatu, o seu uso é um modo de vida em cerimónias e uma cultura comercial que traz renda para os agricultores. As raízes da planta são usadas para produzir uma bebida com propriedades sedativas, anestésicas e euforizantes e é tomada com uma concha em bares de kava ou "Nakamals", como são chamados em Vanuatu. No nosso encontro, os vanuatenses ali presentes mostraram como se faz esta bebida há mais de dois mil anos. O arquipélago foi descoberto pelo navegador português Pedro Fernandes de Queiroz, em 1606, ao serviço de Espanha, achando que tinha encontrado um continente, por isso batizou a primeira ilha que encontrou de Espírito Santo. Em 1774, o navegador e cartógrafo inglês James Cook nomeou as ilhas de Novas Hébridas. Em 1838, quando missionários da Europa chegaram a Vanuatu a caminho de Fiji e do Taiti, levaram o cristianismo e o desejo de converter os povos nativos. Só que eles descobriram que muitas pessoas já se haviam convertido e outras continuaram a praticar crenças tradicionais mesmo após a conversão. Isso incluía o uso de kava para fins de cura, bem como para celebrações como casamentos ou funerais. Presentemente, em Vanuatu, a cultura kava está incorporada em todos os aspetos da vida. Portanto, há um ditado local que diz assim: "Kava é vida". O quotidiano dos vanuatenses é tranquilo. Um conjunto de mais de oitenta ilhas forma um dos países menos conhecidos do mundo. Em 1980, receberam a atual designação. Estas ilhas vulcânicas são cobertas de florestas luxuriantes e povoadas de aves tropicais. A economia está baseada principalmente na agricultura de subsistência ou de pequena escala. Desde a sua independência do domínio anglo-francês, todas as terras pertencem ao povo nativo do arquipélago e não podem ser vendidas a estrangeiros. A pesca, os serviços financeiros de bancos estrangeiros e o turismo são outras fontes de economia. Não há no país reservas de minerais, nem de petróleo. Um pequeno setor industrial abastece o mercado local. Os impostos vêm principalmente das importações de produtos. Esta realidade foi exposta pelos representantes do país naquele encontro internacional, onde também relevaram a vulnerabilidade aos desastres naturais e às longas distâncias entre os principais mercados e as ilhas, o que torna complicado planear o futuro. Porém, este povo mostra uma resiliência notável. Vanuatu significa "nossa terra para sempre" em muitas das 139 línguas nativas faladas pelo povo local. "É por isso que nós somos felizes, não porque temos uma casa bonita, mas porque temos uma compreensão clara dos ciclos de plantio, da história dos nossos ancestrais e da importância da flora e da fauna locais." E, digo eu, sobre o modo como enfrentam os desastres no país - "Seguimos em frente, continuamos vivendo, é assim que nós somos. Kava é vida!"

Jorge Mangorrinha, professor universitário e pós-doutorado em turismo, faz um ensaio de memória através de fragmentos de viagem realizadas por ar, mar e terra e por olhares, leituras e conversas, entre o sonho que se fez realidade e a realidade que se fez sonho. Viagens fascinantes que são descritas pelo único português que até à data colocou em palavras imaginativas o que sente por todos os países do mundo. Uma série para ler aqui, na edição digital do DN.

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