Marcelo veta lei que permite engenheiros civis assinarem projetos de arquitetura

Presidente diz que não se justifica voltar "ao regime jurídico anterior ao 25 de abril"
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O Chefe do Estado alega, na mensagem colocada no "site" da Presidência da República, que a lei deturpa o "largo consenso" criado por uma lei de 2009, que admitia um período de transição de cinco anos para que esses técnicos assinassem projetos, tornando o "regime transitório" em definitivo, "sem que se conheça facto novo que o justifique".

No texto colocado no "site", o Presidente lembra que a lei aprovada pela Assembleia revoga "legislação nomeadamente de 1973 e estabelecendo um regime de transitório de cinco anos para certos técnicos", até 2015, altura em que esse prazo foi estendido mais três anos, até 2018.

Marcelo Rebelo de Sousa justifica o seu veto escrevendo que, "sem que se conheça facto novo que o justifique", a lei aprovada em março "vem transformar em definitivo o referido regime transitório", assim "deturpando o largo consenso então obtido [em 2009 e 2015] e constituindo um retrocesso em relação àquela negociação".

Para o Presidente, não se justifica alterar "uma transição no tempo para uma permanência da exceção, voltando de alguma forma ao regime jurídico anterior ao 25 de abril".

Como foi a votação

Na dia da votação, na Assembleia da República, registou-se uma divisão no PS e a lei só passou por que o PSD votou em bloco ao lado do PCP, PEV e PAN.

Entre os socialistas, 42 deputados votaram contra, incluindo o presidente do parlamento, Ferro Ropdrigues, superando as cerca de três dezenas de parlamentares que optaram pela abstenção, entre os quais o líder da bancada do PS, Carlos César.

Helena Roseta, deputada independente eleita pelo PS e ex-bastonária da Ordem dos Arquitetos, votou contra a lei.

No CDS-PP, a líder centrista Assunção Cristas e mais seis deputados votaram contra, tendo-se registado nove abstenções na bancada dos democratas-cristãos.

Os engenheiros a quem é dada a possibilidade de assinar projetos são aqueles que se matricularam até 1988 nos cursos do Instituto Superior Técnico da Universidade de Lisboa, da Faculdade de Engenharia da Universidade do Porto, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra, e da Universidade do Minho.

A Ordem dos Arquitetos estima que estejam 5.000 engenheiros nestas condições.

A explicação do Presidente

1. O Decreto da Assembleia da República n.º 196/XIII, de 3 de abril de 2018, vem alterar a Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que aprovou um regime jurídico estabelecendo a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, pela fiscalização de obra e pela direção de obra, revogando legislação nomeadamente de 1973 e estabelecendo um regime transitório de 5 anos para certos técnicos.

2. Pela Lei n.º 40/2015, de 1 de junho, foi permitido aos referidos técnicos prosseguirem a sua atividade transitoriamente por mais 3 anos.

3. O diploma ora aprovado pela AR, sem que se conheça facto novo que o justifique, vem transformar em definitivo o referido regime transitório, aprovado em 2009 depois de uma negociação entre todas as partes envolvidas, e estendido em 2015, assim deturpando o largo consenso então obtido e constituindo um retrocesso em relação àquela negociação, alterando fundamentalmente uma transição no tempo para uma permanência da exceção, voltando de alguma forma ao regime jurídico anterior ao 25 de abril.

4. Nestes termos, decidi devolver à Assembleia da República, sem promulgação, nos termos do Artigo 136º, n.º 1 da Constituição, o Decreto n.º 196/XIII, de 3 de abril de 2018, que procede à segunda alteração da Lei n.º 31/2009, de 3 de julho, que aprova o regime jurídico que estabelece a qualificação profissional exigível aos técnicos responsáveis pela elaboração e subscrição de projetos, pela fiscalização de obra e pela direção de obra, que não esteja sujeita a legislação especial, e os deveres que lhes são aplicáveis, e à primeira alteração à Lei n.º 41/2015, de 3 de junho, que estabelece o regime jurídico aplicável ao exercício da atividade da construção.

Os sete vetos políticos de Marcelo

O Presidente da República usou hoje o veto pela sétima vez, desde que é Presidente da República, em 2016, para "chumbar" a lei que repõe a possibilidade de civis poderem assinar projetos de arquitetura.

Antes, em janeiro, o Chefe do Estado usara o veto - poder de devolver sem promulgação - pela sexta vez para "chumbar" as alterações à lei do financiamento dos partidos políticos, aprovadas em dezembro de 2017 pelo PS, PSD, PCP, BE, mas com o voto contra do CDS-PP e PAN.

Marcelo Rebelo de Sousa justificou a decisão "com base na ausência de fundamentação publicamente escrutinável quanto à mudança introduzida no modo de financiamento dos partidos políticos".

Marcelo usou o veto pela primeira vez em junho de 2016, ao fim de quase três meses de mandato, devolvendo à Assembleia da Republica o diploma sobre gestação de substituição para que a lei fosse "melhorada" e incluísse as "condições importantes" defendidas pelo Conselho de Ética.

Na altura, justificou a decisão com o argumento de que faltava na lei "afirmar de forma mais clara o interesse superior da criança ou a necessidade de informação cabal a todos os interessados ou permitir, a quem vai ter a responsabilidade de funcionar como maternidade de substituição, que possa repensar até ao momento do parto quanto ao seu consentimento".

Mais de um ano depois, em 26 de julho, e após a introdução de alterações ao diploma inicial, o Presidente da República promulgou a nova lei sobre a gestação de substituição.

Em 25 de julho de 2016, Marcelo Rebelo de Sousa voltou a devolver um diploma à Assembleia da República, desta vez o decreto que alterava os estatutos da Sociedade de Transportes Públicos do Porto (STCP) e da Metro do Porto, por "vedar, taxativamente, qualquer participação de entidades privadas".

Dois meses depois, em 30 de setembro de 2016, o Presidente usou pela terceira vez o poder de veto, 'chumbando' pela primeira vez um decreto do Governo: o diploma que obrigava os bancos a informar a Autoridade Tributária sobre as contas bancárias de residentes em território nacional com saldo superior a 50 mil euros.

Marcelo Rebelo de Sousa justificou o veto ao decreto do Governo sobre acesso da Autoridade Tributária a informação bancária com a consideração de que era de uma "inoportunidade política" evidente, num momento de "sensível consolidação" do sistema bancário.

O quarto veto do Presidente da República aconteceu já este ano, em 14 de março, e novamente a um decreto do executivo socialista liderado por António Costa.

O chefe de Estado vetou o novo Estatuto dos Militares da Guarda Nacional Republicana (GNR), considerando que a possibilidade de promoção ao posto de brigadeiro-general podia "criar problemas graves" à GNR e às Forças Armadas.

Marcelo Rebelo de Sousa utilizou em 09 de agosto pela quinta vez a ferramenta constitucional do veto, devolvendo à Assembleia da República o diploma que introduzia alterações ao decreto sobre a transferência da Carris para a Câmara de Lisboa, considerando abusivo que se proíba qualquer concessão futura da empresa.

De acordo com a Constituição, no caso de vetos a diplomas do parlamento, se a Assembleia da República decidir não alterar um diploma que tenha sido devolvido e confirmar o voto por maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções (116 parlamentares), o Presidente da República deverá promulgá-lo no prazo de oito dias a contar da sua receção.

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