Urdangarin evasivo em tribunal nega ter recebido comissões
"Suponho, não sei, não me lembro." Estas foram as palavras mais ouvidas na primeira audiência a Iñaki Urdangarin, o marido da infanta Cristina, arguido no processo Nóos. O ex-duque de Palma de Maiorca é acusado de fraude, desvio de fundos e branqueamento de capitais, arriscando uma pena de 19 anos de prisão. Em tribunal, ao longo de duas horas, Urdangarin negou ter recebido comissões - "Nunca fui comissionista de nada" - mas admitiu a existência de funcionários fictícios na Aizoon (empresa que detinha a meias com a mulher) para ter benefícios fiscais.
O procurador Pedro Horrach foi o primeiro a poder interrogar o cunhado do rei Felipe VI, questionando-o precisamente sobre a empresa que mantém também a infanta Cristina no banco dos réus. Sobre a Aizoon, que faturou mais de três milhões de euros ao Nóos e através da qual o casal teria pago várias despesas pessoais, Urdangarin admitiu haver funcionários que não conhecia e não sabia quem eram. "Eram pagos para não trabalhar?", perguntou Horrach. "Pois, efetivamente, não sei muito bem o que faziam, se trabalhavam ou não", respondeu Urdangarin.
Essas contratações fictícias teriam sido uma decisão do assessor fiscal do instituto Nóos, Miguel Tejeiro. O cunhado de Diego Torres, sócio do ex-duque de Palma no Instituto Nóos, já não é arguido do processo, depois de o sindicato Mãos Limpas desistir da queixa popular. Será contudo testemunha no processo.
Urdangarin foi evasivo em muitas respostas, limitando-se a dizer "não sei", chegando a dizer a determinada altura que saiu do Instituto Nóos sem papéis. "Não me recordo de toda a minha vida profissional", disse. E negou ser sua a assinatura em pelo menos dois documentos referentes aos orçamentos da equipa de ciclismo Banesto, cujo patrocínio do governo das ilhas Baleares ajudou a conseguir.
Um dos negócios em causa é um gabinete de acompanhamento do projeto dessa equipa de ciclismo, criado pelo Instituto Nóos para "controlar que as coisas iam bem", explicou, não para que pudesse cobrar como "intermediário". O ex-presidente do governo das ilhas Baleares, Jaume Matas (também arguido), disse que o projeto servia para pagar o que chamou de "portagem" a Urdangarin, referindo-se a uma comissão. Este negou-o: "Nunca fui comissionista de nada."
O procurador questionou Urdangarin sobre se afinal o Instituto Nóos, que a acusação diz ter sido usada para desviar 6,2 milhões de euros, gerava ou não lucros. "No seu ADN estava previsto assim", afirmou o marido da infanta Cristina, indicando que o dinheiro era reinvestido noutros projetos. "Trabalhámos sempre com muito bom senso", disse. A acusação acredita que o instituto era usado para desviar fundos públicos, que acabavam nos bolsos de Urdangarin e do sócio.
Questionado sobre quem era o responsável por passar as faturas do instituto Nóos, Urdangarin disse que não era ele - "não sou o administrador da Nóos, não entendo" - mas a equipa de assessores e o contabilista Marco Antonio Tejeiro: "Era a pessoa que se encarregava dos temas da administração." O cunhado de Torres já depôs em tribunal, reconhecendo que eram usadas faturas falsas para retirar dinheiro do Instituto Nóos e que entregava o numerário diretamente nas mãos de Urdangarin e Torres. E confirmou que este criou várias empresas no estrangeiro para facilitar o esquema.
A última a falar
A audiência ao marido da infanta Cristina vai continuar na próxima quarta, não havendo data prevista para a irmã do rei Felipe VI responder em tribunal. Depende do tempo que demorar a ouvir Urdangarin - o seu sócio, Diego Torres, foi ouvido durante 25 horas. A infanta é acusada de cumplicidade com os crimes fiscais do marido apena pelo sindicato Mãos Limpas, que pede oito anos de prisão e o pagamento de uma multa.