Uns donos do melhor
Quem já viu um caniche cor-de-rosa a passear na rua, de unhas pintadas e maquilhagem feita à imagem da dona não pode ter deixado de ficar surpreendido. A moda já nos habituou a praticamente todas as extravagâncias, mas nada nos prepara para os minúsculos ténis de lona e sapatilhas de silicone que não deixam o canídeo sujar as patas, os tratamentos de chocolate para o pêlo, as coleiras incrustadas de brilhantes, os fatos completos, os hotéis de cinco estrelas... Loucura? Não é o que acham os donos que dedicam estes luxos aos seus animais, sem se pouparem. E se é verdade que os animais podem ser os mais fiéis dos amigos, não deixa também de ser um pouco obsceno, pelo menos aos olhos alheios, o que se gasta com eles. Sobretudo em tempos de crise generalizada. Mas a verdade é que este é um mercado em expansão, que não conhece limites. Nem de extravagância nem de custos. As clínicas veterinárias proliferam, as casas de animais e os serviços especializados também.
«Ter um animal é uma responsabilidade enorme que deve obrigar as pessoas a pensarem muito bem antes de tê-los, porque deixá-los em casa sozinhos depois é uma violência.» Quem diz isto com ar dramático é João Chaves, reputado cabeleireiro do jet set lisboeta e dono extremoso de Oliver, Thomas e Johnny, três pugs que tem com ele, respectivamente, há dez, oito e três anos. Costuma aparecer com eles em eventos sociais e dedica-lhes a atenção de companheiros dedicados. A dedicação é evidente na forma como fala deles. Diz que os «ama» e que mimá-los é a sua forma de lhes mostrar o que sente, desde que foi buscá-los aos dois meses, roliços e irresistíveis, de ninhadas de um primeiro casal de pugs que uma amiga trouxe de Verona, em Itália.
A escolha desta raça não foi um acaso. «São grandes companheiros e não suportam estar sozinhos, caem na ansiedade e no vazio.» Dizem os livros que os pugs também são gulosos, apaixonados pelo dono, pachorrentos e óptimos cães de guarda. O cabeleireiro faz questão de lhes dar comida orgânica e biológica - nada de chocolates, queijo ou açúcar. «Sempre que viajo e posso levá-los comigo, levo. Se não, entrego-os a pessoas de confiança que tenham espaço e disponibilidade, só assim vou descansado.»
Tal como no atendimento personalizado que dedica aos famosos que o procuram, também nos cuidados prestados aos seus animais João liberta o instinto para os pormenores: tem um cuidado especial com o pêlo (que lava com champô orgânico John Masters, também disponível na versão para humanos), cada um tem a sua toalha individual e é seco com o secador, todos têm direito a passeios diários, duas limpezas com toalhitas de bebé, escovagem, festas, cama comunitária (comprada na secção de animais dos armazéns londrinos Harrods) e até gabardinas da Burberry para a chuva, que os faz parecerem o Sherlock Holmes quando saem à rua e foi o último grande mimo que ganharam os três em simultâneo. «Dei uma atenção especial ao Oliver: comprei-lhe roupa, a coleirinha da Hermès, o saquinho de viagem da Louis Vuitton, tudo e mais alguma coisa.» Como se fosse o primeiro filho. Com Thomas agiu como se fosse o segundo, refreou-se um pouco. «Compreendi que não era necessário esse excesso e o Johnny, então, foi menos mimado ainda do que os outros dois.»
Antigamente, era do senso comum que os animais serviam para pouco mais do que guardar a casa ou distraírem as crianças. Deviam dormir no quintal ou na casota. Nunca numa cama. Contentavam-se com comida e água para serem felizes e até podiam ter pulgas e carraças porque era da natureza que tal acontecesse. Agora, os animais de estimação conquistaram pelo menos o direito a um lugar dentro de casa e no coração dos donos, que os adoptam como companhia, numa época em que sobra menos disponibilidade e mais enfado para as relações pessoais duradouras.
Ainda assim, por cada caniche branquíssimo, aperaltado e perfumado com água-de-colónia francesa que tem a sorte de viver bem, existem centenas de cães que não levam sequer as vacinas básicas. Por cada cão massajado por uma especialista tailandesa numa clínica estrangeira, inúmeros viram os caixotes na rua à procura de algo que possam comer. Por cada gato persa de características apuradas ao limite, milhares de animais morrem abandonados, atropelados, abatidos nos canis e vítimas de doenças. Sem querer, o universo dos animais de estimação replica as profundas desigualdades de distribuição da riqueza no mundo real.
Se luz, provavelmente é ouro
A crise económica mundial é transversal a quase todos os países e torna as despesas do dia-a-dia insustentáveis para muita gente, mas tudo indica que o segmento dos produtos de luxo não sofreu grande abalo. Aliás, todos os dias nascem novos negócios. Os novos hotéis para cães disponibilizam serviços de vários pet sitters amáveis e eficientes, que os acolhem em divisões tão amplas como suites, com actividades programadas, ginásio com sessões de treino personalizado, caminhadas, água mineral e pausas para descanso, lambidelas e gelados. A comida, confeccionada praticamente a pedido, é tão saborosa que podia ser dividida com os donos, sem receio de azias. O segmento da hotelaria para animais está a crescer e a diversificar os seus serviços de tal maneira que são já muitos os que organizam festas de aniversário e sessões de spa, com aromaterapia, hidroterapia, florais de Bach e massagens incluídas.
Na Best Friends Pet Care, com mais de quarenta pontos em vários estados norte-americanos, todos eles com muita clientela, funcionárias lêem aos animais a história de Clifford, o Grande Cão Vermelho antes de os deitar, após dias de intensa actividade para o corpo e o espírito. O estilista italiano Roberto Cavalli tem há muito uma linha de vestuário canino moderna à base de sedas, coletes de couro, acessórios de brilhantes e estampas de leopardo, e as peças são tão requisitadas por donos abastados que outras marcas de topo como Gucci, Phillip Lim ou Ralph Lauren se juntaram à oferta.
«As pessoas com mais poder económico a nível mundial sentem necessidade de marcar o seu ponto pela diferença. Qualquer artigo que seja desenvolvido para este tipo de mercado, desde que com a respectiva qualidade e grau de necessidade, terá sucesso certo», explica Almeida da Silva, representante da marca de luxo Mumadona Collection, criada por 25 joalheiros de Guimarães. É uma linha de acessórios de luxo para animais que vai engrossando com peças de ouro e prata para o pêlo, capas para a chuva de pele de cobra, coleiras de pele de crocodilo e correntes de ouro, escovas com lacagem chinesa e malas de transporte para animais de pequeno porte - em 2009 venderam por cinquenta mil euros uma de pele de pitão, com incrustações de ouro e diamantes, considerada o melhor produto presente na Feira do Luxo de Vicenza, em Itália.
«As pessoas querem dar ao seu amigo o que podem com amor e excentricidade», justifica Almeida da Silva, revelando que a maioria dos clientes da Mumadona são cães tratados como se fossem da realeza. As criações do grupo, cada vez mais sofisticadas, incluem quartos completos com camas feitas à medida, carpetas persas ou do Turquemenistão feitas à mão, que seguem depois para as casas mais exclusivas de França, Itália, América, Japão, Rússia e China. Aqui não se sente a crise. «Temos coleiras de pele de crocodilo criado em África, acabadas, cortadas e enriquecidas com diamantes e esmeraldas que podem custar até trezentos mil euros», conta. Há ainda uma série de jóias exclusivas para a noite - quando os animais se vestem a rigor para um jantar, festa ou recepção com a família - e a nova colecção Raio d'Lua terá uma água especial para os animais, «importada de Itália de uma fonte com mais de dois mil anos e apresentada com embalagem Luxury Edition e Wedding Edition, para as festas de aniversário e casamento dos animais».
Mais exemplos que mostram como esta loucura é um fenómeno mundial. O hotel inglês The Luxury Cat, puro luxo para gatos que tenham de enfrentar a ausência dos donos, em Welwyn Garden, no condado de Hertfordshire, instala cada animal num chalé climatizado com música ambiente, decoração temática escolhida a gosto, zona de exercício, árvores no exterior carregadas de aves (com que os bichanos sonham por detrás dos vidros), serviço de massagem, comida em bandeja de prata, menus variados que vão do atum fresco aos lombos de pescada e um segurança encarregado de fazer rondas permanentes ao perímetro, não vá algum lembrar-se de fugir atrás dos pássaros. A equipa do Loews Hotel oferece aos cães (pela módica quantia de 1200 euros) um passeio de limusina que termina num estúdio de gravação onde os animais podem latir e uivar para o microfone, acompanhados à guitarra por um músico humano. Em Filadélfia, um hotel canino serve bifes de 340 gramas ao jantar, grelhados no ponto, fatiados e servidos em tigela de ouro, que custam qualquer coisa como noventa euros a refeição.
Em cheio no turbilhão da crise, a PetAirways começou a voar nos EUA a 14 de Julho de 2009, tornando-se assim a primeira companhia aérea do mundo destinada exclusivamente a animais domésticos, por preços idênticos aos da classe turística de outras companhias (as tarifas de ida e volta oscilam entre 210 e 350 euros, dependendo dos percursos). Longe de serem fechados no porão, como acontece nas linhas aéreas regulares, os animais circulam entre várias cidades norte-americanas em aviões Beech 1900, comodamente instalados em cabinas adaptadas e supervisionados por hospedeiras e comissários de bordo treinados para cuidar deles, vigiando-os a cada quarto de hora e levando-os regularmente aos sanitários. Antes do embarque e após o voo, durante o tempo que os donos estão ausentes, estes passageiros insuspeitos são acompanhados, mimados e acalmados, e os aviões têm estado tão cheios desde que a companhia se estreou nos serviços que os empresários Alysa Binder e Dan Wiesel, os mentores da ideia, consideram estender a sua presença a 25 cidades dos EUA, alargar-se aos voos internacionais e criar condições para transportar répteis, pássaros e porcos, além de cães e gatos.
Ainda em matéria de inovação, alguns dos avanços mais significativos surgem na área da alimentação animal, um mercado muito rendível e com um tremendo potencial de crescimento, já que quase toda a evolução em alimentos humanos pode ter a sua versão análoga para os animais de estimação, cada vez mais tidos na conta de um membro da família. A Total Alimentos, por exemplo, dispondo de um centro de investigação único na América Latina associado à Universidade de Illinois, lançou recentemente uma linha de alimentos caninos cem por cento natural, isenta de conservantes artificiais, e aposta em ingredientes que potenciam a beleza da pele e da pelagem, a saúde de animais mais velhos, castrados e com sensibilidade acima da média, a saúde oral, a eliminação de bolas de pêlo e a diminuição do odor das fezes (longe vão os tempos em que cães e gatos comiam os restos da família adoptiva).
Também os produtos concebidos a pensar na terceira idade dos cães têm vindo a crescer exponencialmente desde 2005, ano em que Darlene Frudakis, presidente da PetAg (uma fabricante de componentes nutricionais para cães), lançou a sua primeira linha nesta vertente. Os asilos para animais necessitados de maiores cuidados veterinários, à semelhança dos lares de idosos, são outra aposta segura: diz quem sabe que os donos, de um modo geral, são pessoas abertas a experimentar novidades que garantam o conforto e o bem-estar dos seus animais até ao fim, numa espécie de retribuição pelos anos de afecto partilhado.
Uma vida... de cão
Todas as pessoas que trabalham no sector dos pets, como é chamado, sabem que as vendas ao público são uma experiência animada. As avós entram frequentemente ao engano nas lojas a achar que aqueles fatinhos, casaquinhos e botinhas cairiam na perfeição aos netos pequenos. As crianças acham normal vestir os animais e querem à força que os pais levem dois pares de sapatos, umas calças de ganga e uma camisola canelada de gola alta para o cachorro, que normalmente começa por estranhar a vestimenta se nunca usou nada antes, mas depois sente-se tão aconchegado e confortável que já não quer que o dispam.
Nuno Martins, dono da Animal Minimal, explica que quando abriu a primeira loja dedicada a roupas de animais, em Novembro de 2007, o objectivo era, na linguagem do marketing, «tornar tangível este género de artigos». «Fazer que as pessoas pudessem entrar num espaço, ver as peças, experimentá-las nos seus animais, e perceber que funcionam sem que os cães ou os gatos percam a sua forma natural de estar. Se uma capa para a chuva é necessária? Sem dúvida: pêlos compridos dão muito trabalho a secar e a pentear, mais vale resguardá-los à partida quando se vai passear com os animais. Se uma malha é necessária? Completamente: os cães pequenos tremem de frio no Inverno, precisam de um agasalho mais quente. Reconheço que alguns adereços são mera extravagância, como aliás sucede com muitos dos adereços humanos. Mas outros fazem falta ao bem-estar dos animais», diz Nuno, pioneiro nacional nestas matérias.
Após ter regressado de uma primeira viagem a Nova Iorque, onde se deixou influenciar pelo design arrojado das peças, e de outra viagem à Coreia do Sul e à Tailândia, em que ficou ciente do facto de haver países incrivelmente desenvolvidos neste mercado específico, Nuno veio decidido a impor um conceito e um posicionamento. Foi então que abriu a loja no Chiado, uma boutique de moda para animais de estimação que vendia kispos, gabardinas, casacos, sobretudos, vestidos de cerimónia, saias de ganga, jardineiras, fatos desportivos e camisolas de malha, mas também chapinhas de identificação, coleiras de brilhantes, corpetes, camas, escovas e pastas de dentes, champôs e amaciadores, sabonetes de glicerina para peles sensíveis e uma infinidade de produtos que só não incluem a alimentação propriamente dita, porque até as tigelas vendem. Os preços das roupas variam dos vinte euros das peças mais básicas aos 150 euros que pode custar um vestido Designers Collection dos mais caros, dependendo do tamanho e dos arranjos necessários.
Uns meses depois de ter aberto a loja do Chiado seguiu-se uma segunda em Cascais, a funcionar em simultâneo durante cerca de dois anos, segundo o mesmo princípio. Isto antes de Nuno Martins ter condensado as duas lojas físicas numa boutique virtual que o mantém em contacto com os clientes via internet. Entretanto, nesse par de anos, aproveitou para estabelecer algumas parcerias com lojas que revendem os produtos da Animal Minimal, para descobrir outros produtos originais com que mimava o yorkshire terrier e a cadela boxer que tinha na altura, e para desenvolver uma linha própria - a Designers Collection - com a dupla de estilistas Manuel Alves e José Manuel Gonçalves, pensando na possibilidade de poder vir a abordar os mercados internacionais no futuro com peças exclusivas, já que em termos de oferta há outros muito mais desenvolvidos que dificultam as exportações nacionais.
De acordo com o site Web Luxo, os EUA têm o maior mercado de animais de estimação do mundo, seguido pelo do Brasil, com uma população de 33 milhões de cães, 15 milhões de gatos, cerca de trinta mil pet shops, um volume de produção de alimentos de 1,8 milhões de toneladas e uma facturação de mais de quatro mil milhões de euros por ano em comidas, tosquias, banhos, passeios e adestramento. Em Portugal, segundo dados da Associação Portuguesa de Comerciantes de Produtos para Animais de Companhia (APCPAC), estima-se que existam mais de duas mil empresas entre clínicas e lojas de animais, e que umas e outras facturem qualquer coisa como duzentos milhões de euros por ano em resultado das características da população: o estilo de vida solitário dos grandes centros urbanos e o número crescente de idosos com vida longa e de jovens que demoram a casar traduz-se em mais animais de estimação por companhia, além de serem muitos os pais que decidem dar um animal aos filhos para lhes incutir desde cedo o sentido da responsabilidade.
«No estrangeiro, o mercado de roupa para animais domésticos já está muito consolidado e é um hábito as pessoas vestirem-nos para irem à rua ou a eventos sociais. Sobretudo os cães, que os gatos tendem a ficar enredados nas malhas e gostam pouco disso», confirma Nuno Martins, referindo que a maioria dos seus clientes são mulheres independentes na casa dos 30 ou então já de mais idade, e homens e mulheres solteiros ou que vivem sozinhos, viajados, com poder de compra e um estilo de vida urbano, muito ligados às tendências da moda e a este mercado particular em expansão. «Há uns quatro anos era raro ver um animal com uma capa. Neste momento não só é um cenário recorrente em várias classes sociais, como já vi portugueses muito tradicionais a vestirem o cão com roupas que a mulher fez com o seu crochet», observa o empresário, optimista diante desta generalização que aos poucos se vai afirmando no país.
Amigos de quatro patas e muito pêlo
Numa boa área nas proximidades de sua casa, um desses lugares apetrechados de utensílios e produtos tão diferentes que fazem lembrar uma combinação de clínica veterinária com cabeleireiro de senhoras, Rosário Gomez fundou a Nanny Care em Junho de 2006, um sonho tornado realidade. Durante oito anos trabalhou numa loja de vestidos de noiva que acabou por falir, mas a tornou versada em lacinhos, adereços e noções de beleza que agora lhe servem na perfeição para embonecar os seus pequenos clientes. Longe de perder a garra de mulher do Porto, voluntária convicta em associações de animais há mais tempo do que se recorda, interpretou a situação como um sinal favorável e abriu o seu centro de estética canina e felina no concelho de Palmela, disponibilizando serviços de escovagem, banhos, tosquias, corte de raças, limpeza dentária e de ouvidos, coloração de pêlo, tatuagens, pet sitting (hospedagem no domicílio, transporte de animais de estimação, passeios e exercício diário), alojamento de exóticos (porquinhos-da-índia, pássaros, hamsters, furões, coelhos e chinchilas), primeiros socorros, diagnósticos básicos, administração de medicamentos, assistência a partos, amamentação de bebés órfãos e aconselhamento aos donos, que a procuram à confiança quando se sentem aflitos.
«Em cinco anos nota-se bastante diferença no modo como as pessoas tratam os seus animais, e muito se deve ao facto de todas estas empresas de banhos, tosquias, pet sitting e outras ajudarem a divulgar a actividade e ensinarem os cuidados a ter com os vários tipos de pêlo, os planos alimentares, as melhores coleiras, a desparasitação ou os mosquitos que atacam na Primavera», constata Rosário Mendez, realizada aos 35 anos por ver que se está no bom caminho para o bem-estar animal no país. Ela própria faz parte disso, depois de anos de voluntariado dedicado, das cabras anãs e dos quatro gatos que tem em casa (mesmo com o marido alérgico a tossir por amor aos bichos) e de ter tirado os cursos de auxiliar veterinária, de primeiros socorros e de cabeleireira e estética canina que a habilitam a tudo o que tiver pela frente.
«Há donos que trazem os seus animais apenas para o banho e a tosquia - gostam deles de uma forma prática, quase como se os tivessem ao seu serviço -, e depois há os que gostam do pet como um membro da família e cuidam dele como se fosse um filho: vêm semanalmente, vestem-no, põem-lhe perfume e acessórios», aponta a especialista. São quase sempre estes últimos que se aventuram a colorir o pêlo dos cachorros de roxo, azul, rosa ou amarelo (as tintas vêm do Brasil e não fazem mal à pele), a hidratá-los com cremes próprios e a tatuá-los com um spray inócuo que sai com uma toalhita, deixando os donos todos contentes e os animais vaidosos com a atenção que recebem (no dia em que a nm visitou a Nanny Care, Idália Rosa delirava com o pêlo amaciado e os lacinhos laranja da sua Tonicha, apesar de ter outras seis cadelinhas em casa e estar habituada à graça das coisas minúsculas). Os preços variam consoante o tamanho do animal e o serviço solicitado: um cão pequeno que só faça a tosquia normal sai a 25 euros, mas se levar o arranjo comercial típico da raça pode ficar em 35 - normalmente, quando vêm para o banho e a tosquia ela oferece o corte de unhas e a limpeza de ouvidos. O banho de um galgo afegão chega aos trinta euros e o corte aos sessenta; a coloração de um gato de pêlo curto é de 25 euros e de pêlo longo 35; um cão de médio porte que os donos queiram tingir fica em trinta euros se tiver pêlo curto, 35 pêlo médio e quarenta para pêlo longo. O hotel de exóticos varia entre três e seis euros por dia (o mínimo para hamsters, quatro euros os pássaros e cinco as chinchilas, os furões e as cobaias), sendo que o preço é por gaiola, independentemente do número de animais, e ela aceita fazer orçamentos individuais a quem o solicitar.
«As coisas têm vindo a mudar gradualmente, mas comparando com a Inglaterra, os EUA, o Brasil ou o Japão, ainda não temos nada, estamos a dar os primeiros passos», comenta Rosário, referindo-se ainda a produtos de bem-estar essenciais como cremes, champôs e tinturas, e não a extravagâncias como jóias, bolos, banhos relaxantes com cristais ou idas a pet shops que terminam com os cães a serem mascarados de índios e anjos, ou a receberem de presente uma bolsinha em forma de cenoura cheia de ração. «Os donos têm diferentes maneiras de demonstrar afecto, cada um faz o melhor que pode e sabe», conclui a cuidadora. Quando se gosta dos animais é mesmo assim.
Número
200 milhões de euros por ano
É quanto vale o mercado de pets em Portugal
Moradas e endereços
Animal Minimal
A primeira loja de moda para cães em Portugal está disponível e contactável no site http://www.animalminimal.pt.
Mumadona
Uma vasta gama de artigos de luxo para animais de estimação e donos que primam pela diferença. Descubra as peças em http://www.animalminimal.pt. Tel.: 253088440; e-mail: mumadona@mumadona.com.
Nanny Care
Profissionais em pet sitting, estética canina, tratamento e transporte de animais. Mais informação em http://www.nannycare.com.pt. Tel.: 913862021; e-mail: nannycare@sapo.pt.
Animais obesos
A sabedoria popular parece aceitar sem dificuldade que a convivência torna os animais mais parecidos com os seus donos e, em se tratando de questões de alimentação e de balança, é quase certo que animais gordinhos têm donos acima do peso. Agora, um alerta da Associação para a Prevenção da Obesidade nos Animais vem chamar a atenção para o facto de os animais domésticos estarem a ficar obesos, espelhando a tendência dos donos e a realidade nacional, muito por culpa do sedentarismo e do tipo de alimentação que lhes é dada.
«As pessoas que comem de mais e se exercitam pouco repetem nos animais os seus (maus) comportamentos», justifica a associação, estimando que cerca de quarenta por cento dos cães e trinta por cento dos gatos observados por veterinários apresentam excesso de peso ou são obesos, havendo tendência para o problema aumentar com a idade e nos animais esterilizados. E porque a obesidade nos animais é tão perigosa como a humana, a solução para ambas passa por aumentar a mobilidade e ter mais cuidado com a alimentação. «Cada animal tem necessidades alimentares específicas, que devem ser saciadas através de opções nutricionais mais saudáveis e que se adequam ao perfil, raça e idade em causa», adianta ainda, sublinhando que «a comida caseira é nutricionalmente desequilibrada», razão por que se deve evitar dar-lhes frango com arroz ou leite de vaca, pouco tolerado por cães e gatos.
Rei de quatro patas
Maltês coroado com herança de família
O cão não se apercebeu do valor que carregava na cabeça, muito menos podia supor que o dono, o designer de jóias tailandês Riwin Jirapolsek, tinha utilizado as pedras preciosas herdadas da mãe, avaliadas em cerca de quatro milhões de euros, para conceber aquela coroa generosamente ofertada ao amigo de quatro patas, um maltês de 15 anos de nome Kanune. Riwin, que expôs a peça em Banguecoque explicando que a mesma surgiu porque há muito que ele queria dar algo especial a Kanune, levou dois meses a ficar pronta e resultou numa coroa de titânio com 250 esmeraldas e diamantes incrustados que o artista não tenciona vender a ninguém. O próximo presente, informou, será um gancho de cabelo que promete transformar-se em nova atracção, por sinal bastante cara. «Vou fazer o gancho porque o meu cão precisa de prender a franja todos os dias para não ficar com a vista tapada. E devo decorá-lo com jóias», avisa desde logo, não vão os curiosos pensar que ele é homem para deixar os seus créditos de dono excêntrico por mãos alheias.
Três perguntas a... Ceres Faraco
Médica veterinária, doutora em Psicologia e especialista em comportamento animal.
_Como se explica a necessidade de os donos mimarem os seus animais com artigos muitas vezes considerados ofensivos por quem passa dificuldades económicas?
Para os humanos, além das necessidades básicas, contam os desejos e as vontades. E há no consumo do luxo um carácter simbólico, com significado social e psicológico presente nas diferentes culturas ao longo da trajectória da humanidade. Hoje observa-se nas relações entre pessoas e animais de companhia o que alguns consideram excesso. É o que agrada aos sentidos, uma representação dos valores existentes em certos segmentos da sociedade, e o facto de os animais estarem intimamente incluídos nas nossas vidas propicia a que sejam vistos como consumidores no mercado do luxo. O desconforto perante segmentos humanos que vivem com extrema dificuldade sempre existiu e é legítimo. O foco central da questão é se é aceitável o luxo sob o ponto de vista ético e moral. O consumo direccionado para os animais é apenas reflexo das necessidades humanas egocêntricas de experiências de consumo privilegiadas.
_Por que razão se vê também cada vez mais pessoas a tratarem os seus animais como gente?
As pessoas percebem os animais como humanos, ou quase, por diferentes motivos. Um é o antropomorfismo: há uma humanização que considera o animal com atributos humanos, as pessoas acreditam que eles pensam e têm comportamentos semelhantes aos seus, e tratam-nos como tal. Trata-se de uma distorção e pode provocar prejuízos ao bem-estar dos animais. Noutras situações os donos fecham-se por não crerem no relacionamento com outras pessoas e essa percepção torna a vida social de alguns indivíduos muito limitada. Quando as relações entre humanos são pobres, os animais podem exercer papéis substitutos e sofrerem com isso, já que têm necessidades específicas que devem ser atendidas para que possam expressar os seus comportamentos naturais e ter saúde física, mental e social.
_Quais são os limites «saudáveis» para um bom relacionamento entre ambos?
A convivência entre pessoas e animais é benéfica desde que as diferenças sejam compreendidas. Os animais têm um vínculo estreito com os humanos na promoção da saúde, no desenvolvimento de capacidades sociais e afectivas como a generosidade e a compaixão, na redução do stress. Respeitar as necessidades fisiológicas, mentais e sociais de ambos no dia-a-dia é a condição básica de uma partilha saudável, pelo que deve procurar-se informações adequadas para uma vida enriquecida e o convívio, constituindo uma nova configuração da família.