Umas eleições cruciais
A agência de rating Moody"s baixou num escalão a classificação da dívida soberana de França devido à "continuada debilidade" das perspetivas de crescimento a médio prazo. A explicação que dá é eloquente: "A quota de mercado francesa está em queda quando comparada com os seus parceiros europeus... A França vai ter de enfrentar uma pressão muito maior por parte de outros Estados do que no passado, como consequência das reformas que estão a melhorar a competitividade em países como Espanha e Portugal. A França enfrenta desafios económicos como um alto índice de desemprego estrutural, margens de lucro empresarial relativamente diminutas e a perda da quota mundial nas exportações por causa da rigidez do seu mercado laboral e de produtos."
França é, à partida, uma economia imensamente grande e rica em comparação com Espanha e, escusado será dizer, com Portugal. Tem também um rendimento per capita mais elevado e desfruta de uns custos de financiamento mais favoráveis. Mas o extraordinário das explicações da Moody"s é que valoriza a melhoria da competitividade registada por Espanha e Portugal, fruto das reformas dos últimos anos. Os dois países levaram vidas mais ou menos paralelas. Portugal sofreu a intervenção da troika. Espanha teve de pedir assistência financeira à União Europeia para sanear o seu setor bancário. A contrapartida foi a exigência de um ajustamento muito doloroso que deu resultados evidentes. Entre os mais notórios, o meu país é o que mais vai crescer na Europa em 2015 e 2016. Portugal também registará neste ano uma taxa de crescimento de cerca de 1,5% e, se não acontecer um incidente grave pelo caminho, conseguirá reduzir o défice público até aos 3% do PIB.
Em Portugal realizar-se-ão eleições depois de amanhã, no meu país, com toda a probabilidade, a 20 de dezembro próximo. Parece-me que em ambos os casos se trata das eleições mais transcendentais dos últimos tempos. Do seu resultado depende que a máquina oleada e posta em marcha pela direita possa continuar a dar frutos em termos de criação de riqueza e de emprego ou que voltemos ao ponto de partida, aquele que provocou a fuga de capitais, esteve a ponto de colapsar ambas as economias e requereu a ajuda internacional. O economista hispano-alemão Jürgen B. Donges costuma dizer que a incerteza é como um imposto sobre a atividade económica. Para tudo até se perceber o que se passa. E foi isso o que aconteceu em Portugal desde que foram convocadas as eleições e o que está a acontecer no meu país até que sejam conhecidos os resultados das nossas.
Sei que é uma ousadia que um estrangeiro trate de indicar o voto num país que não conhece profundamente ainda que ame. Mas, como não tenho preconceitos, fá-lo--ei. Gostaria que Passos Coelho tivesse a oportunidade de continuar a dirigir a nação portuguesa sem as restrições que sofreu no começo do seu mandato. Quando chegou, o défice era superior a 7%. Durante o seu governo foi necessário intervir no principal banco privado português (BES), ainda pendente de venda. O antigo primeiro-ministro Sócrates foi preso acusado de corrupção. Os cidadãos portugueses foram submetidos a um tratamento de choque, suportaram uma desvalorização dramática de salários e sofreram cortes nas despesas sociais. Também aguentaram uma enorme subida de impostos, que no próximo ano poderá ser revertida - da mesma maneira que em Espanha - porque a cobrança vai de vento em popa, a atividade aumenta e o défice diminui.
O resultado de todas estas ações é que, como reconhece o próprio candidato socialista a primeiro-ministro, António Costa, o país está bastante melhor do que há quatro anos, embora na sua opinião necessite de uma volta estratégica que ponha fim à austeridade. A minha modesta opinião é que esta nova orientação seria um erro. Em Espanha o debate é semelhante. Os socialistas que disputam o governo a Rajoy também opinam que a consolidação orçamental deve passar para segundo plano e que é preciso incrementar as políticas redistributivas. Mas este é um caminho que destruiria o que foi feito até à data e que encareceria o custo do financiamento das empresas e do Estado português. Costa é um socialista moderado, mas não deixa de ser um socialista. Esgrime o argumento estúpido de que o país é dirigido por um grupo de conservadores e ultraliberais radicais que demoliram o património comum. Mas, tal como no meu país, o que a história ensina é que são os socialistas quem destrói o património comum, que se baseia em duas questões cruciais: o emprego e o equilíbrio das contas públicas. Jamais me pareceria uma boa alternativa que aqueles que puseram em causa a viabilidade da nação cheguem de novo ao governo sem que os mandatários atuais desfrutem de uma segunda oportunidade.
Os portugueses que vão às urnas no domingo só têm duas opções: eleger os que têm os pés no chão ou os que prometem o paraíso na terra trabalhando o menos possível. Trata-se de decidir entre os que apostam pela economia de mercado e a sociedade aberta ou os que preferem uma sociedade dependente das subvenções e dos apoios públicos. Os que postulam um Estado pequeno e eficaz ou os que pedem uma maior presença do setor público em detrimento dos agentes criadores de riqueza, que são os indivíduos livres dos constrangimentos das leis e regulações ominosas.
As sondagens apontam para uma governabilidade difícil nos próximos quatro anos em Espanha e em Portugal. Rajoy lidera as sondagens, mas não é provável que alcance a maioria absoluta e é muito possível que a união dos restantes partidos consiga o seu objetivo primeiro que é desalojar a direita do poder. Seria uma tragédia, como aponta o facto de que o nosso prémio de risco, devido à incerteza sobre o futuro, seja nestes dias maior do que o de Itália, cujo desempenho económico é bastante pior. A minha opinião é que os acontecimentos que vivemos na Grécia não deveriam deixar lugar a erros. Estando endividados até ao pescoço com o exterior, a margem de manobra para promover políticas diferentes da ortodoxia fiscal e financeira é mínima. Mas a capacidade que um governo errado tem para desestabilizar uma economia durante um período é máxima. Espero que os portugueses estejam persuadidos da fase de instabilidade que viverão se a esquerda voltar a instalar-se em Lisboa.