Uma semana depois, PJ ainda procura suspeitos de atear fogo ao bar de Vilamoura

Têm sido vários os registos de incêndios em bares e discotecas. Só o ano passado, foram quatro, todos em áreas de praia, e cabe à PJ investigar estas situações. A destruição do The Funky Dogo pelas chamas, ateadas por três pessoas, é um caso isolado, segundo as autoridades policiais do Algarve.
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Três homens encapuçados entraram pelo The Funky Dogo, em Vilamoura, ao final da tarde do último domingo. Pediram a quem estava que saísse e regaram o estabelecimento com gasolina. Ouviu-se um estrondo e, de repente, as chamas alastraram por todo o lado. As autoridades investigam, tudo indicando que foi um ato isolado. Suspeita-se que terão sido clientes que provocaram desacatos e foram expulsos nessa semana. Ou seja, terá sido um "ajuste de contas".

O bar fica no rés-do-chão do aparthotel Luna Olympus, na segunda linha da Marina de Vilamoura. Eram 18h45 de domingo quando os bombeiros foram chamados para combater as chamas num bar. Primeiro seguiu a corporação de Loulé, depois as de Albufeira e de Faro. Com eles, a GNR, a Cruz Vermelha e, por fim, a PJ.

A GNR percebeu que não era um acidente e é a Judiciária que investiga estas situações. Diz a legislação que é da sua competência "a investigação de crimes de incêndio em que o facto seja imputável a título de dolo, de acordo com a alínea f) do n.º 3 do artigo 7.º da Lei n.º 49/2008, de 27 de agosto, sem prejuízo do artigo 8.º". Ou seja, "em todas as ocorrências de incêndio, explosão, libertação de gases tóxicos ou asfixiantes ou substâncias radioativas, desde que, em qualquer caso, o facto seja imputável a título de dolo".

A PJ não respondeu às perguntas do DN nem indicou se fogo posto no bar de Vilamoura é uma situação isolada. "Há discussões e rixas em bares e discotecas, mas não incêndios deste género, em que alguém o terá provocado devido a problemas anteriores. Este é um incêndio com intenção de dolo", explica o major Abel Adriano, do Comando Territorial da GNR de Faro.
João Fonseca, o porta-voz do Comando Nacional da GNR, esclarece: "No dia 13 de fevereiro ocorreu um incêndio num estabelecimento de restauração e bebidas em Vilamoura. No decorrer das diligências policiais, foi possível apurar que o incêndio teve origem dolosa, em que três indivíduos regaram o interior do bar com gasolina e atearam fogo, colocando-se em fuga num veículo de cor escura." Acrescenta que "não há conhecimento de outras situações idênticas na zona de ação do Comando Territorial de Faro nos últimos cinco anos". Os factos foram comunicados ao Tribunal Judicial de Loulé.

O alerta para os bombeiros foi às 18h45 e o incêndio foi declarado extinto às 20h00. Envolveu 55 operacionais e 22 viaturas; os profissionais de saúde registaram dois feridos ligeiros, que reencaminharam para o hospital, e assistiram a 15 pessoas no local, essencialmente por inalação de fumo. É o registo do Comando Regional de Urgência e Proteção Civil do Algarve.

"Ouvi um estrondo, desci pelas escadas do prédio e, quando cheguei à porta, estava tudo a arder, foi tudo muito rápido. Havia um fumo horrível, eu e a minha mulher só quisemos sair o mais rápido possível", conta Custódio Fernandes, um emigrante de Braga que ali tem casa de férias. Mora no segundo andar, a cuja habitação regressou eram 23h00 de domingo.

Só o 1.º andar ficou inabitável, as paredes do rés-do-chão (onde funcionava o The Funky Dogo e outros estabelecimentos comerciais) e o terraço, no 1.º piso, estão completamente pretos, até parece que essa era a sua cor de origem. "Está tudo destruído, canalizações, parte elétrica, tudo. Também é preciso ver se não tem consequências para o prédio. A sorte foram as paredes de vidro, que rebentaram, e as chamas propagaram-se para o lado, pelo rés-do-chão, em vez de subirem para os andares", conta António Cruz, outro morador. A zona está isolada com "fita balizadora", incluindo a parte onde estão localizados um outro bar e um café.

O comércio em geral está fechado no domingo à tarde e, à hora do incêndio, era fraco o movimento nos bares. A Sortami, agência imobiliária mesmo em frente do Luna Olympus, era dos poucos estabelecimentos abertos. "Ouvi um barulho da explosão e, logo de seguida, tudo a arder. Começou pequeno e, de repente, propagou-se, e foi tudo muito rápido. Entretanto, juntaram-se os bombeiros, ambulâncias, polícia", conta Rui Rua, o promotor imobiliário que estava na agência no momento do fogo.

O aparthotel pertence ao grupo Luna Hotéis, que não avança com informações sobre o pós-incêndio, apenas sublinha que o espaço estava alugado. E que será o seguro a avaliar os prejuízos, sem especificar a quem competem as obras de recuperação. Segundo os testemunhos dos vizinhos, o inquilino é inglês e ainda não esteve em Vilamoura depois do incêndio.

Avaliar as repercussões do fogo é a fase em que comerciantes e moradores se encontram. Tenta-se recuperar alguns géneros alimentícios e bebidas, limpa-se o que se pode, os outros comerciantes não sabem quando poderão abrir, até porque há áreas que não oferecem segurança. Há funcionários de uma empresa de construção civil a avaliar os estragos, tomam notas. António Cruz acompanha: "Sou da área e tenho interesse em que a situação se resolva." Calcula o valor dos prejuízos na ordem dos 700 mil euros, mas "para cima".

Está a fazer um ano que o The Funky Dogo foi inaugurado. Serão dois os sócios e terão gasto 250 mil euros na renovação do espaço. "O bar anterior era o Spot, este abriu o ano passado, já depois do confinamento. Era um bar muito tranquilo, com muito bom ambiente. Os donos era um senhor de mais idade e outro mais jovem, são pessoas muito amigáveis, muito simpáticas. Nunca me apercebi que tivessem problemas com os clientes", conta Célia Gonçalves, que explora a Tabacaria Ruby, ao lado do bar mas a uma distância suficiente para não ser atingido pelas chamas.

A história que ouviu contar do que se terá passado é a que todos contam. "Nessa semana, houve uns clientes que não se portaram bem, com ofensas verbais, acabou em tareia e foram postos na rua. Pensa-se que podem ter sido eles a atear o fogo", conta.

Têm sido vários os registos de incêndios em bares e discotecas. Só o ano passado, por exemplo, houve notícias de chamas que destruíram o Yamba Bar, na Costa da Caparica (23 de maio de 2021), funcionava no antigo Masstige, também reduzido a cinzas em 2015. O mesmo aconteceu ao Rock in River, em Vila Nova de Paiva (3 de maio de 2021), na Praia do Ouro, em Sesimbra (18 de outubro de 2021) e no Bar do Peixe, no Meco (12 de novembro de 2021). Recuando mais no tempo, os bombeiros foram chamados a combater as chamas no Old Beach, em São Pedro de Moel (10 de agosto de 2019), n"O Amarelo, em Santo Amaro de Oeiras (22 de maio de 2019), no Bar do Bruno, no Baleal (4 de setembro de 2018) e numa discoteca em Argoncilhe, em Santa Maria da Feira (10 de janeiro de 2015). Na maioria dos casos, ocorreram fora das horas de funcionamento e em muitos destes fogos foi chamada a PJ.

O DN questionou as autoridades policiais no sentido de perceber se tem havido mais incêndios movidos por um ajuste de contas, tendo em atenção, sobretudo, a forma como os suspeitos de Vilamoura atuaram e a rapidez com que o fizeram. Não houve detenções no local e as autoridades no Algarve não têm registos de situações idênticas.

"Discussões, rixas, acontecem com alguma frequência em bares e discotecas, mas não chegam a este tipo de situação", refere um elemento da Diretoria do Sul da PJ.

Tanto a GNR como a PSP remetem a explicação sobre aqueles casos para a PJ. "Sempre que as causas de um sinistro não são absolutamente claras e ou detetamos indícios de difícil contextualização/justificação e ou se verificam vítimas ou danos avultados, a PSP informa a PJ." Acrescenta esta polícia que, a partir daí, deixam de acompanhar o processo. O mesmo acontece com a GNR.

Não há informação disponível sobre quantos foram esses casos. E tanto a GNR como a PJ justificaram não ser possível obter essa informação em tempo útil. "Pela dificuldade de contextualização, não nos será possível apresentar a estatística solicitada (porquanto não dispomos dos sinistros classificados pelas categorias propostas)", justifica a PSP.
Os responsáveis pela PJ limitaram-se a não responder aos e-mails do DN.

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