Uma procissão negra conduzida pela chuva
\t\tComo qualquer aluno aplicado que faz um resumo da matéria depois de a ter estudado, a última noite de Paredes de Coura poderia ser um mosaico do restante festival . Chuva, concertos brilhantes e um ambiente familiar que apenas é possível num acontecimento que tem crescido à medida da sua idade.
Bauhaus e Cramps foram legítimos catalisadores de dois movimentos que se confundiram, apesar de distintos. Góticos e rockabillies viveram momentos inesquecíveis, como se toda a existência fosse conduzida para os respectivos concertos. Não querendo defraudar quaisquer expectativas, tanto Bauhaus como Cramps justificaram plenamente que os episódios actuais de vida não são apenas o prolongar de um culto começado há mais de 25 anos. Os primeiros fecharam com toda a legitimidade o palco principal e bastaria o encore composto por All We Ever Wanted Was Everything , Transmission (dos Joy Division) e Bela Lugosi's Dead para saírem com nota positiva. Mas o conjunto da banda está num momento de forma que, não sendo equiparável à primeira fase da carreira, arruma a um canto colectivos com menos duas décadas. Neste caso, a chuva foi mais um adereço que resultou num cenário onde todas as imagens projectadas foram emitidas a preto e branco.
Quanto aos Cramps, nem necessitaram de recorrer a canções mais conhecidas para mostrarem uma Poison Ivy que não envelhece e um Lux Interior que não se cansa de beber vinho e de subir às colunas como um louco. Mais uma vez, o bilhete de identidade não foi obstáculo a um concerto memorável.
O melhor que se pode dizer dos !!! é que deveriam ascender a banda cativa de Paredes de Coura , com livre acesso anual, à imagem da chuva. Não se sabe se, tal como no passado, pediram à organização para re gres sar, mas, a julgar pela prestação apre sentada, vontade não lhes falta. A pulsão rítmica introduzida foi sufi ciente para superar a falta de novos ar gumentos face ao último concerto.
No caso dos Maduros, e apesar da experiência de parte dos músicos, este era um dia importante. Não que o colectivo formado por históricos do rock português assuma algum compromisso que não o de se divertir, mas o convite para actuar era afinal a razão da sua existência. "Goza bem a tua juventude/não te preocupes com o futuro" são dois dos versos cantados por Zé Pedro, que exprimem os seus ideais. Enquanto assim for, continuarão a ser cinco amigos que se juntam e que nem a voz do guitarrista dos Xutos & Pontapés pode comprometer.
Cat People e Shout Out Louds abriram a tarde, para deleite do público espanhol no primeiro caso e com resultados fastidiosos no segundo.
Balanço final
PONTOS ALTOS
Cartaz. É difícil dizer se 2005 foi melhor que 2006 ou vice-versa. Certo é que o festival se tornou um dos melhores da Europa. Apenas duas bandas estiveram num plano inferior: We Are Scientists e Shout Out Louds.
Ambiente Começou por ser um festival regional e hoje conta com algumas das principais bandas alternativas, mas nem por isso Paredes de Coura se esquece das suas raízes. A música tem papel primordial e a atenção prestada pelo público repercute-se na prestação das bandas e na vontade de regressar.
PONTO BAIXO
Chuva. No que toca a factores humanos, Paredes de Coura foi exemplar. A resposta à chuva foi eficaz e rápida, até por já ser um factor esperado. Mas bem que o santo padroeiro local podia ter esperado uns dias para apagar os fogos que lavraram na zona. Durante três dias, o Verão vestiu sobretudo e calçou galochas.