Uma homenagem de Fonseca e Costa à sua Lisboa
Margarida Marinho, Pedro Lacerda, Paula Guedes, Rui Morrison, Cecília Guimarães, Luís Mascarenhas, Elisa Lisboa, Tónan Quito. Um elenco de atores experientes que foram convocados para entrar em Axilas, o filme que José Fonseca e Costa estava rodar quando há duas semanas a saúde lhe pregou uma partida. Produzido pela Leopardo Filmes, de Paulo Branco, o filme será concluído e estreia no próximo ano.
"É uma homenagem à Lisboa que ele conhecia e que está a desaparecer", diz Pedro Madeira, assistente de realização do cineasta nesta produção. A rodagem começou em setembro e passou por um palacete no Prior Velho, pela rua de S. José e pelo cemitério dos Prazeres. Um tributo a uma cidade que adotou aos 12 anos, quando veio de Huambo (então Nova Lisboa) para Portugal. "Conhecia Lisboa como ninguém", afirma Pedro Madeira sobre o cineasta, desaparecido no domingo, aos 82 anos, vítima de uma pneumonia, na sequência de uma pré-leucemia.
A história é uma "adaptação muito livre" do cineasta e do argumentista e humorista Mário Botequilha, a partir do conto "Axilas" de Rubem Fonseca, segundo Pedro Madeira.
No original do escritor brasileiro, editado em 2011 ( no livro "Axilas e Outras Histórias Indecorosas"), um homem apaixona-se por uma violinista apenas pelas suas axilas. Tenta aproximar-se dela, pede-lhe um autógrafo e convida-a para jantar. Mas ela recusa, e mantém uma certa frieza. Um dia ele consegue dar-lhe boleia para casa, e tenta dar-lhe um beijo no braço, perto da axila - ela sai a correr. Depois liga-lhe para casa e diz que tem uma prenda para ela, um quadro, e se o pode ir entregar. A atitude dela muda logo, e aceita. Quando chega, e dá-lhe uma pancada na cabeça, deixa-a desmaiada e fica a observar-lhe as axilas e depois beija-as. No final, atira-a pela janela e deixa uma carta de suicídio em cima da mesa. No funeral, conhece a irmã gémea dela e só deseja ver-lhe as axilas.
"É mais uma inspiração para uma parte do enredo", diz o assistente de realização. Uma comédia "em tons sombrios", resume ao DN o braço-direito de Fonseca e Costa na realização do filme. Como será concluído é assunto que fica nas mãos do produtor, Paulo Branco.
Mantém alguns traços característicos da obra do realizador, garante Luís Mascarenhas. "Éanti-clerical", diz sobre o filme. "Nota-se bem que está lá a mão do Zé", afirma. Motorista da avó (Elisa Lisboa) na ficção, amigo de Fonseca e Costa na realidade, o ator lembra um homem "corrosivo e muito divertido". "Determinado e resoluto, muito firme das suas convicções". É assim que Pedro Madeira se lembra de Fonseca e Costa atrás da câmara. Este foi o primeiro filme em assistiu o cineasta, autor de duas dezenas de obras, entre elas, outras "Kilas, o Mau da Fita" (1980), "A Balada da Praia dos Cães" (1987), "A Mulher do Próximo" (1988) ou "Cinco Dias, Cinco Noites" (1996).
O funeral do realizador realiza-se hoje às 15.00 no Cemitério dos Prazeres, em Lisboa.