Os dados oficiais demonstram que foram construídas perto de 169 mil habitações entre 2011 e 2021, das quais mais de 32 mil foram inscritas como secundárias. Na prática, por cada cinco casas edificadas nesta última década censitária, uma tem como utilização principal fins de semana e férias..O país conta atualmente com 1,1 milhões de segundas residências, num parque constituído por 5,9 milhões de alojamentos familiares. Ou seja, as casas de férias têm já um peso de 18,5% no total de moradas, sendo que nestes últimos dez anos verificou-se uma maior apetência dos investidores por construir estas habitações. Foi uma resposta à dinâmica da procura, que se evidencia pela análise das duas metades da década. Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), foram construídas 14.735 residências secundárias entre 2011-2015 e 17.550 entre 2016-2021. Foi um crescimento de 19,1%, mas a oferta continua a ser insuficiente face à demanda.."É um número que fica muito aquém da expectativa e, relativamente a esse tema, a resposta tem sido bastante demorada", aponta Margarita Oltra, diretora da Engel & Völkers Portugal. Também João Cília, CEO da Porta da Frente Christie"s, concorda que "este número de 32 mil habitações não foi suficiente para toda a procura que tivemos neste período". Como diz Ricardo Costa, CEO da Luximos Christie´s, "nos últimos anos, a segunda casa revelou ser uma tendência em Portugal e, efetivamente, o volume de vendas de segundas habitações tem crescido bastante". Há vários fatores que explicam esta procura. Como aponta este responsável, é "uma boa forma de rentabilizar as poupanças", "permite ter refúgio de férias permanente, enriquece o património e, colocada no mercado de arrendamento temporário, é também uma fonte de rendimento"..São os portugueses que fazem este mercado, mas nos últimos anos a procura internacional tem sido crescente. A pandemia também veio acelerar esta tendência, "visto que a procura recorre sobre localizações fora dos centros urbanos e de casas com características muito específicas como espaços exteriores, piscinas, terraços e outro tipo de amenities [comodidades] de lazer", afirma Patrícia Barão, responsável do departamento residencial da JLL. Nesta consultora, o mercado doméstico é dominante, o que também sucede na Porta da Frente. Segundo João Cília, "em 2022, e numa tendência que se tem replicado este ano, os portugueses ocupam mais de 50% das transações imobiliárias, tanto para primeiras habitações como para segundas habitações, seguindo-se mais de 35 diferentes nacionalidades"..Os dados disponibilizados pelo INE apresentam um aspeto curioso e até surpreendente. Na época em análise, foi no Norte que mais se construiu segundas residências. Entre 2011 e 2021, nasceram 11.769 novas casas de férias nesta região, um terço do total edificado neste segmento. No Centro, registam-se 8397, seguindo-se o Algarve com 4820, a Área Metropolitana de Lisboa com 3699 e o Alentejo com 2157. Nas regiões autónomas, a Madeira totaliza 829 e os Açores 614 segundas habitações. "A relação preço/qualidade oferecida no interior do país não encontra rival em nenhum outro local do território nacional e próximo do mar, os clientes já não se dirigem apenas ao Algarve, procuram casas de praia em toda a zona costeira, desde Viana do Castelo", justifica Ricardo Costa. Também Patrícia Barão reconhece que "o Norte tem uma maior escala no que diz respeito à oferta, com localizações e terrenos interessantes, e os valores também são mais baixos"..João Cília sublinha que existe uma "ausência de distinção entre segunda residência e residência para rentabilização", o que pode explicar estes índices. Como adianta, "a região Norte sofreu uma forte transformação e reabilitação imobiliária nos últimos anos, o que resultou num aumento exponencial da procura de imóveis. Vendeu bastante a estrangeiros e portugueses que quiseram aplicar as suas poupanças tanto para habitação própria permanente como para rentabilização no mercado de arrendamento". Na Porta da Frente, "tivemos os nossos melhores anos de vendas consecutivos em 2021 e 2022", diz João Cília. Em 2022, as transações desta imobiliária especializada em produtos de luxo foram protagonizadas por portugueses, seguindo-se com destaque os brasileiros, norte-americanos, russos (devido à guerra), franceses e britânicos..Já na rede Engel & Volkers os compradores são sobretudo internacionais. A procura por segunda residência tem estado muito centrada no Algarve, Comporta, Estoril, Cascais, Oeiras e Lisboa, e mais recentemente verifica-se um crescente interesse pela zona Oeste e norte do país, diz Margarita Oltra. Por sua vez, no último ano, a Luximos fechou negócios com mais de 25 nacionalidades no Porto, Norte de Portugal e Algarve, o que representou mais de 50% da faturação. Para além dos portugueses, a imobiliária fez negócios com franceses, ingleses, norte-americanos, suecos e brasileiros. Ricardo Costa adianta que "o cenário atual de guerra na Europa trouxe também clientes de países mais próximos do conflito, como finlandeses, ucranianos e até russos, que não são a favor do atual regime". Há ainda a contar o "forte interesse em segunda habitação por parte de clientes internacionais que procuram regimes fiscais especiais para estrangeiros", conclui..sonia.s.pereira@dinheirovivo.pt