Uma eleição europeia
Há dias, um dos institutos com força para moldar a política externa dos dois grandes partidos realizou a sua grande conferência anual, dedicando painéis a mais de trinta tópicos da atualidade. Apenas dois diziam respeito à Europa: brexit e Putin. Estarão a ver a fotografia toda ou só a parte que interessa? E que tem isto que ver com as eleições? Já sabemos que a Europa não é um tópico atraente às análises políticas em Washington, compulsivamente à procura da next big thing, como mais uma vez pude comprovar pelo seminário que ontem liderei no McCain Institute. E quando olhamos para o financiamento europeu nos principais think tanks, a Alemanha aparece sem rival. Faltam visões alternativas se os europeus quiserem moldar a política externa americana, seja em função dos interesses nacionais ou da UE. O que não podem é ficar restritos à negociação do brexit e ao futuro da Rússia de Putin. Claro que o Kremlin se tornou central na campanha, o que obrigará uma possível "administração Hillary" a endurecer posição face à Rússia e a envolver-se com outra dinâmica nos assuntos europeus (financeiros, por exemplo), mas é essencial articular uma política europeia digna desse nome. As instituições europeias estão fragilizadas e as três grandes potências da UE estão dessincronizadas como nunca se viu no pós-Guerra Fria: a Alemanha demasiado sozinha, a França demasiado em baixo, o Reino Unido demasiado fora. O problema é que os russos estão demasiado dentro e os EUA relutantemente comprometidos. É preciso fazer ver que dramas europeus são potenciais riscos americanos (e vice-versa) e que poucos foram os momentos na história recente tão demonstrativos como este em que tantos pontos se ligam numa espiral transatlântica tão negra: populismo, radicalismo, nacionalismo, protecionismo, estagnação económica. Por isso esta é também uma eleição europeia.