Emma Watson foi a primeira a afirmá-lo em entrevistas: este A Bela e o Monstro é "descaradamente romântico". E se, de facto, isso já era qualquer coisa inerente ao clássico de animação, não há como contrariar o peso de tal atributo numa versão com atores reais, de brilho no olhar e rodeados de um tremendo aparato cénico. No que toca aos resultados de bilheteira, também se espera que não sejam tímidos....A estreia mais aguardada por estes dias, que só nos Estados Unidos se prevê ultrapassar os 120 milhões de dólares no primeiro fim de semana, pode vir novamente a bater recordes em relação aos anteriores relançamentos da Disney. Afinal estamos a falar do regresso de uma das mais amadas produções do estúdio, que nos Óscares de 1992 se tornou a primeira longa-metragem de animação a ser nomeada na categoria de melhor filme. Além disso, vale a pena lembrar, ganhou duas estatuetas: melhor canção (homónima do filme) e banda sonora original, de Alan Menken, com letras de Howard Ashman..[youtube:yzHuQPgO3Gs].Em A Bela e o Monstro de Bill Condon, a música continua a ser, pois claro, o grande motor da fantasia e uma marca específica do universo Disney. Com as canções originais, a que se somaram algumas novas (também de Menken, mas com letras de Tim Rice), o realizador de Dreamgirls mostra como se dá vida e cor a um castelo moribundo..Por exemplo, na famosa cena do jantar de Bela, em que a louça e as iguarias transformam a solenidade do aposento numa festa garrida, ao som da canção Be Our Guest, não há limites para a criatividade. Inspirado nas coreografias de Busby Berkeley, este é um daqueles momentos que se conservam sobretudo na memória da retina..Já na memória afetiva, permanece a história baseada no conto de Jeanne-Marie Leprince Beaumont, sobre uma jovem destemida e curiosa (sempre agarrada aos livros), que se fez prisioneira de um monstro para salvar o pai. O feitiço da rosa também continua o mesmo, votando aquele que outrora fora um príncipe, à eternidade na pele de um monstro, caso ninguém encontre nele o amor para além da rude aparência. Esse, sabemos, é o destino de Bela, e Emma Watson agarra-o com a simultânea força e graciosidade da personagem que há mais de 25 anos encanta o imaginário da Disney..Por seu lado, o Monstro (Dan Stevens) procura dizer tudo o que guarda na alma através dos intensos olhos azuis, tal como Jean Marais em A Bela e o Monstro (1946) de Jean Cocteau. Só através deles é possível transpor a fisionomia animalesca e alcançar as emoções..O alegre LeFou de Josh Gad.Apesar de serem estes os protagonistas, muita tinta tem corrido antes sobre a catalogada personagem gay do filme: LeFou, o criado do arrogante pretendente de Bela, Gaston. Ora, contra o supérfluo falatório que se gerou, e no eco do filme de animação, é importante sublinhar que LeFou, interpretado por Josh Gad, não é mais do que uma justa réplica da personagem tresloucada da Disney, aqui apenas com maneirismos que alimentam a comicidade das situações e permitem novas leituras... Se daí é necessário fazer um caso, isso depende naturalmente das perceções de cada um..Entretanto, não podemos esquecer o virtuosismo do elenco escondido nos objetos falantes do castelo, como o charmant candelabro Lumière (Ewan McGregor), o relógio Cogsworth (Ian Mckellen), ou o bule Mrs. Potts (Emma Thompson), sempre acompanhado da amorosa chávena-criança Chip (o estreante Nathan Mack). Estas personagens são daqueles magníficos apontamentos narrativos que só existem nas produções da Disney - não estavam no conto de Leprince Beaumont - e recordar isso é compreender a dimensão inovadora do estúdio. É possível imaginar tanta vitalidade neste romance melancólico sem a presença de tais figurinhas?.Seguindo essencialmente as linhas mestras da animação de Gary Trousdale e Kirk Wise, o grande investimento do filme de Condon é nas possibilidades do digital. E se poderíamos ter receio de que isso roubasse o coração à história, a verdade é que lhe serve muito bem a expressividade e o ímpeto de encenação barroca. Depois deste, esperemos que o já anunciado live action de O Rei Leão não desiluda.