Um palco para a poesia de Al Berto

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Teatro. 'A Noite' no Teatro Nacional D. Maria II

João Brites lembra-se dele como "um puto" que lhe apareceu em Bruxelas em 1967 com o sonho de ser artista. Al Berto não era ainda o poeta. Tinha 18 anos.

"Era um menino, inocente, caladinho e muito franzino. Ficou em minha casa e acabámos a fazer campismo. Tenho fotografias dele com uma flor atrás da orelha. Guardo esta imagem dele", conta, mais de 40 anos depois, o encenador de O Bando. "É sempre com supresa e emoção que leio as palavras que ele escreveu."

A ideia de fazer um espectáculo a partir dos poemas de Al Berto (1948-1997) tem vindo a ser amadurecida há já alguns anos. O mais difícil foi encontrar uma solução dramatúrgica porque, como explica, "os textos do Al Berto são profundamente literários, não têm nada de quotidiano, não há um esqueleto narrativo".

As leituras permitiram-lhe descobrir tensões - entre a vida e a morte, entre o masculino e feminino, entre o desejo e a razão - e foi assim que, partindo de A Noite e juntando-lhe excertos de outros textos, como À Procura do Vento num Jardim d'Agosto, Lunário, Três Cartas da Memória das Índias, Dispersos e O Medo, foi construindo o espectáculo.

"Ainda que seja um espectáculo sobre a despedida, gostava que fosse também um espectáculo sobre a vida", diz João Brites.

Ana Lúcia Palminha e Pedro Gil são os dois actores que dão corpo às palavras de Al Berto - em certos momentos, pressentimos, dão corpo ao próprio poeta. "Aqui, não há uma história em termos normais; portanto, foi preciso inventar tudo: os actores tiveram de criar subtextos muito exigentes e muito seguros, porque à mínima distracção de subtexto, é um recital de poesia, um a dizer poesia para um lado, e o outro a dizer para o outro", explica Teresa Lima, que trabalhou com os actores toda a oralidade. E um recital de poesia era algo que o grupo não queria fazer.

A Noite é uma coprodução de O Bando e do Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa. Um espectáculo marcado pelo simbolismo e pela abstracção, mas que João Brites considera acessível mesmo para quem não costuma ler poesia: "O Al Berto tem uma permanência em mais gente do que se pensa, sobretudo entre os mais jovens que se revêem nestas inquietações."|

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