"Um Natal inclusivo"
Tenho uma amiga húngara cujo namorado, tendo nascido em Espanha, é de família indiana e, naturalmente, hindu. Vieram a Portugal fazer-nos uma visita e convidei-os para almoçarem em nossa casa. Como sabia que, sendo hindu, era vegetariano por religião, servi um prato a condizer: caril de legumes variados, com arroz basmati de passas. Ao sentarmo-nos à mesa apercebi-me de que ele ficou particularmente emocionado. Era dia 3 de novembro e na religião Hindu festeja-se o Diwali, a festa das luzes. Segundo as suas palavras emocionadas e com lágrimas nos olhos eu estava a servir-lhe a refeição mais típica desse dia e que ele, desde a infância, se habituara a comer nessa ocasião com os seus pais e restante família.
No dia 20 de dezembro celebrámos o Natal na escola em que dou aulas, como se faz em praticamente todas as empresas. Como se trata de uma escola com princípios e fundamentos cristãos, o tradicional almoço de Natal foi precedido da celebração da missa evocativa do mesmo. Todos os professores e funcionários estavam presentes incluindo um que é um ilustre membro da comunidade muçulmana portuguesa. Participou na missa e no almoço.
Há alguns anos uma grande empresa portuguesa montou uma Árvore de Natal gigante e na base alguém sugeriu colocar um Presépio. Depois de muita discussão a ideia avançou, apesar de alguns administradores da mesma considerarem que o Presépio era "ofensivo" para os não-cristãos e poderia trazer algum repúdio face à empresa. Mesmo assim, em várias lojas dessa empresa em que foi colocada uma réplica em cartão dessa árvore o Presépio foi retirado.
Vêm estas pequenas histórias, todas elas vividas na primeira pessoa, a propósito do que é afinal ser inclusivo. O respeito pelas tradições, pela religião, pela raça e pelas diferenças revela-se pela inclusão e não pelo apagamento ou pela negação. Será que temos de deixar de festejar o Dia de Portugal ou o 1º de Dezembro? Afinal estamos a comemorar o termo-nos libertado do jugo espanhol, os mesmos a que carinhosamente chamamos de nuestros hermanos. Não estamos aqui a ser claramente ofensivos? E o que dizer dos anúncios nos media à tradicional charcutaria portuguesa com carne de porco ou dos programas de culinária em que a mesma é transformada em deliciosos petiscos? Não estamos a ser ostensivamente ofensivos para a comunidade muçulmana, judaica e hindu? E porque é que, quando vamos para um país árabe, aceitamos respeitar as suas regras mesmo quando as mesmas violam claramente a nossa consciência? Será que as mulheres em Portugal deveriam passar a andar de burka para não ofender os árabes?
Desculpem se pareço ridículo nas minhas comparações, mas quando vejo empresas que proíbem a referência ao Natal obrigando a que se deseje unicamente Boas Festas e fazem cartões com neve, presentes e outras irrelevâncias pergunto-me que lógica tem. Porque será que um menino nascido nas palhinhas do Presépio, entre animais e visitado por pobres pastores incomoda tanta gente? Provavelmente porque é o contrário do luxo, do prazer, do império do ter e nos chama a atenção para a crua realidade do ser humano pobre, indefeso, frágil e sofredor que representa a larguíssima maioria do nosso mundo. Aquilo que se celebra no Natal é o nascimento do Menino Jesus, como aquilo que se celebra no Dia de Portugal é a existência de um país independente, como aquilo que se celebra no Diwali, no Ramadão e na Páscoa Judaica são merecedores do nosso respeito. Celebrar cada um destes momentos e dias é respeitar o outro e ser verdadeiramente inclusivo. Como dizia Einstein "Duas coisas são infinitas: o Universo e a estupidez humana. Mas, em relação ao Universo, ainda não tenho a certeza absoluta". Um Santo Natal para todos.
Professor Universitário de Política de Empresa
Autor dos livros: Um mundo à nossa espera - Manual de globalização e Manual de Como Construir o Futuro nas Empresas Familiares.