Um milhão de pessoas vive em união de facto e um terço tem 2 filhos
Mais do que confirmarem a diminuição e o envelhecimento da população, os dados definitivos dos Censos 2021 divulgados esta quarta-feira pelo INE, revelam uma alteração sociológica da estrutura familiar. Há mais casais em união de facto, sobretudo no Algarve e na Área Metropolitana de Lisboa. Também há mais famílias reconstruídas, mais divorciados e mais mães sós com filhos.
Em 2021, 1 008 604 pessoas viviam em união de facto, mais 38,2 % que em 2011. A maior percentagem destes casais vive no Sul, com o Algarve (15,5 %) e a Área Metropolitana de Lisboa (AML, 14 %) a liderarem. O Norte segue um caminho mais lento, ainda que tenha aumentado o número de uniões de facto (5,5 % para 8,8 %). Mas é no Centro e nos Açores que se registam as maiores subidas , na ordem dos 6 % para 10 %. O grupo dos 30 aos 39 anos é o mais representado neste tipo de conjugalidade.
Se compararmos aquelas famílias com as que têm uma certidão de casamento, verifica-se que o núcleo familiar é idêntico. A maioria tem apenas um filho e um terço, dois. Subiu o número de agregados com duas crianças, mas o país tem cada vez menos descendência. As regiões autónomas e o Norte têm em média mais crianças.
Os casais com pelo menos um filho não comum - as famílias reconstruídas - são, agora, 124 717 (8,8 % da população), mais 2,3 pontos percentuais do que em 2011. Mais uma vez, são a AML e o Algarve a apresentar os números mais expressivos. No entanto, o Norte registou o maior aumento (29,4 %). A grande maioria (75,6 %) tem apenas um filho não comum.
Foram recenseados 579 971 famílias monoparentais, o que representa 18,5 % dos residentes (mais 3,6 pontos percentuais), na grande maioria as mães e os seus filhos. Todas as regiões registaram aumentos, mais na AML e no Algarve.
Diminui a percentagem da população casada (41% do total), aumentando todos os outros estados civis: solteiros (43,5% dos residentes), divorciados (8%) e viúvos (7,5 %). Mas nos últimos dez anos houve uma troca de posições entre divorciados e viúvos. São mais as mulheres separadas (8,9 %) do que os homens (7%).
"As alterações dos padrões das famílias revelam as maiores surpresas. O envelhecimento e a diminuição da população portuguesa [o que acontece pela primeira vez desde 1864] eram esperados. As mudanças na estrutura familiar são significativas, nomeadamente no que diz respeito aos casais em união de facto e às famílias reconstruídas", destacou Francisco Silva, presidente do Conselho Diretivo do Instituto Nacional de Estatística (INE). Coube-lhe apresentar os dados, na presença da ministra do Estado e da Presidência, Mariana Vieira da Silva.
Sublinharam as dificuldades da realização dos Censos em tempos de pandemia devido às limitações de circulação e os cuidados necessários de higiene, chegando a ser ponderado a sua suspensão. "A decisão de realizar os Censos foi a certa", defendeu Vieira da Silva, concluindo: "No momento em que o país está numa fase de recuperação, poder fazê-lo com base nestes dados é completamente diferente que se não os tivéssemos."
A dimensão média das famílias reduziu ligeiramente, situando-se nas 2,5 pessoas por agregado. E quase um quarto dos habitantes (24,8%) vive sozinho, constituindo um peso mais significativo do que em 2011. O concelho com mais pessoas sós é Paços de Ferreira, bem superior à média na região Norte, a que tem maior percentagem destes agregados (26,8%).
Está a aumentar o número dos que vivem numa casa arrendada (mais 16%), embora a maioria continue a habitar casa própria (70 %). O valor médio mensal das rendas subiu de 235 para 334 euros. O maior aumento verificou-se na AML , de 229 para 403 euros em média. É no Alentejo que a habitação é mais barata, rendas na ordem dos 261 euros mensais.
Os estrangeiros somavam à data do momento censitário (19 de abril de 2021) 524 314, representando 5,3% da população, superior aos 3,7 % de 2011. O Serviço de Estrangeiros e Fronteiras indica que são 698 887 os imigrantes com autorização de residência em 2021.
Também nos Censos destaca-se a comunidade brasileira, com 199 810 indivíduos (36,8 % ), continuando os dois lugares seguintes ocupados pelos originários dos países de língua portuguesa: Angola (31 556) e Cabo Verde (27 144). Mas estes perderam importância relativa, enquanto o Brasil, o Reino Unido e a China seguem a tendência inversa. Os britânicos estão em quarto lugar (24 609).
Mas o mais significativo é o aumento exponencial dos cidadãos da Ásia, sobretudo nepaleses, 12,8 vezes mais do que em 2011, totalizando 13 224. E os do Bangladesh passaram de 853 para 9150, 9,7 vezes mais. A AML tem 46,9 % dos estrangeiros recenseados, os Açores estão no extremo oposto, 0,6 % do total.
Os Censos 2021 revelam que 1,6 milhões de portugueses já residiram no estrangeiro, maioritariamente em França (23,2%). Segue-se uma lista de cinco países: Angola (14% do total), Suíça (8,1%) Brasil (7,2 %), Moçambique (6,5 %) e Alemanha (6,,3 %).
Menos 2,1 % de habitantes
A 19 de abril de 2021 (momento censitário) residiam 10 343 066 pessoas em Portugal, menos 2,1% do que em 2011. E 5 422 846 eram mulheres. É a segunda quebra populacional desde 1864, ano do I Recenseamento Geral da População. O Algarve (3,6 %) e a Área Metropolitana de Lisboa (AML, 1,7 %) registaram as maiores subidas, ao contrário do Alentejo (-0,7 %) e a Madeira (-6,4%). A distribuição mantém-se desequilibrada, reforçando-se a litoralização do país e a concentração junto da capital.
Envelhecimento
Existem em Portugal 182 idosos por cada 100 jovens. O índice de envelhecimento em 2011 era de 128 para 100. Há uma dicotomia entre o litoral e o interior do país, com o interior do Centro e do Norte a concentrarem os concelhos mais envelhecidos. Segundo os Censos 2021, a percentagem da população idosa (65 e mais anos) é de 23,4% e a de jovens (0-14) é de praticamente metade (12,9 %). A média de idades era 45,4 anos, mais 3,1 anos que em 2011.
Escolaridade
Houve um reforço da população com o ensino superior (19,8 % dos que têm 15 ou mais anos) e com o ensino secundário e pós-secundário (24,7 %). As mulheres estão mais representadas no ensino superior (22,4%) que os homens (16,8 %). Eles estão em maior número no ensino básico (52,8 %). A taxa de analfabetismo desceu de 5,2 % em 2011 para 3,1 % em 2021. As áreas preferidas no ensino superior são "Ciências empresariais, administração e direito" (21,8 %) e "Saúde e proteção social" (15,2 %, ao contrário de "Agricultura, pescas e ciências veterinárias" (2 %).
Emprego
Os ativos constituíam 46,6 % dos residentes, ligeiramente inferior ao verificado em 2011 (47,6 %). A AML tem a taxa mais elevada (48 %), seguida dos Açores (47,9 %), ao contrário do Alentejo (44,6 %) e do Centro (44,7 %). A população não ativa representava 40,5 %, com os reformados a constituírem 56,8 % (2 383 397). Quase 400 mil indivíduos disseram estar desempregados, uma taxa de desemprego de 8,1 %. As mulheres têm taxas de desemprego superiores aos homens em todas as idades, sendo os jovens (até aos 25) os que registam valores mais elevados. Nas profissões, os "Trabalhadores dos serviços pessoais, de proteção e segurança e vendedores" (18,4 %) e os "Especialistas das atividades intelectuais e científicas" (18,2 %) reforçaram a representação.
Habitação
Houve um crescimento no número de edifícios e de alojamentos destinados à habitação, mas com menor ritmo que em décadas anteriores. São 69,4 % os que se destinam à primeira habitação, com uma subida de 1,3 pontos percentuais. As residências secundárias perderam 0,8 pontos e as casas vagas 0,4. A propriedade privada passou de 73 % para 70 %, um decréscimo que ocorreu em todas as regiões mas com mais expressão nos Açores. A maioria dos proprietários não tem encargos financeiros relacionados com a aquisição da habitação. Há mais 16 % de arrendamentos, com a AML (29,2 %) e o Algarve (23 %) a terem as maiores subidas.
Religião
A resposta sobre religião é facultativa e 97 % responderam. A população continua a ser na grande maioria católica, mas diminuiu o seu peso de 88 % em 2011 para 80 % em 2021. A nível das outras religiões, não há grandes alterações, à exceção dos protestantes/envagélicos que subiram de 0,8 % para 2,1 %.
Deslocações
As pessoas que se deslocam diariamente para o trabalho ou para a escola demoram em média 19,9 minutos, valor praticamente igual ao de 2011 (20 m). É na AML que gastam mais tempo (25,1 minutos), destacando-se o Barreiro, com 32,4 minutos. Os residentes neste concelho demoram mais tempo do que em qualquer outro. O automóvel ligeiro é o transporte preferencial, com 47,9 % a deslocarem-se como condutor e 18,1 % como passageiro, acima do verificado em 2011 (43,7 % e 17,9 %, respetivamente).
Última operação censitária
O presidente do Conselho Diretivo do INE, Francisco Silva, anunciou que os Censos 2021 poderão ser os últimos neste modelo, em que as pessoas preenchem um inquérito, mesmo que 99 % tenha respondido via Internet. Estudam a forma de obter a informação através das bases de dados administrativas, tal como já acontece nos países nórdicos.
ceuneves@dn.pt