Um duo inspirado pelas ninfas
Antes de mais, a explicação para o tão inusitado nome do seu duo: "Dryads refere-se às dríades, ninfas gregas das florestas", começa por explicar Carla Santos - "quando concorremos ao Jovens Músicos, era necessário apresentar um nome e, na altura, estávamos a tocar os 'Mitos', de Szymanowski, em que uma peça se chama... 'Dríades'" E ficou...
Esta "coisa" de tocarem juntos, explica Saul, "começou na Metropolitana, onde integrávamos um quarteto com piano e às vezes também tocávamos só os dois". O final dos estudos ditou a dispersão do grupo, mas como Carla e Saul foram ambos parar a Londres, "e como ainda nos dava gosto tocar juntos, retomámos o duo!"
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A escolha do repertório, que é enorme, "vai mais pelo meu gosto pessoal", diz Carla - "ou então vem por influência do meu professor em Londres, sobretudo as obras mais modernas". No CD, tocam a Sonata de Janácek, a 'Sonata Póstuma' de Ravel e a 'Sonata n.º 3' de Enescu; no CCB, repetiram o Ravel e juntaram-lhe a 'Sonata, op. 23', de Beethoven; a 'Sonata, op. 110' de Respighi e o 'Tema e Variações', de Messiaen. A opção por obras mais laterais ao repertório nuclear para violino e piano tem três razões: por um lado, "sinto-me bem a tocá-las"; por outro, "é bom mostrar e dar a conhecer obras menos divulgadas"; por último, "as pessoas vão ouvir sem juízos prévios ou ideias pré-definidas", esclarece Carla.
Duas obras, em particular, merecem observação adicional: "a Sonata de Ravel é uma obra de juventude, que ninguém toca, e o engraçado é que foi estreada pelo George Enescu, que tinha 16 anos, com Ravel ao piano!" E da ilustre desconhecida Sonata de Respighi, "já a conhecia de um CD da Anne-Sophie Mutter e, há tempos, em conversa com o professor, ocorreu-me e ele achou boa ideia!". Não sem o assentimento de Saul, pois "a minha aprovação prévia é indispensável...", diz, meio a brincar.
Obras a incluir num 2.º CD: "o Respighi, sem dúvida! Tencionamos gravá-lo" - corrigem: "queríamos muito gravá-lo!" De autores nacionais "clássicos", referem-nos "a 2.ª Sonata de Freitas Branco e, se fosse para gravar, juntaríamos a 1.ª..."
E portugueses? Os Dryads já são dedicatários de 'On a Quiet Place' (com electrónica), de Igor C. Silva, que estrearam em Setembro de 2012, na sua estreia na Casa da Música; neste momento, outro jovem compositor, o portuense João Ferreira, está a escrever uma obra para eles: "não fazemos ideia do que nos espera! Temos trocado ideias, mas ainda não sabemos quando faremos a estreia".
Carla e Saul estão ambos no ano inicial do curso de doutoramento, na Univ. Aveiro, mas ambos arranjaram forma de não perder o "elo" londrino: "estou a fazer o ano de seminários cá, mas o meu orientador será Radu Blidar, o meu professor na Royal College", explica Carla, enquanto que no caso de Saul, "terei a orientação de Pedro Burmester, mas a bolsa da Gulbenkian permite-me continuar a ir a Londres ter aulas com o meu professor da Guildhall School, Peter Bithell". Pelos vistos, o "bichinho" de Londres ficou... - "é uma capital da música, tem uma oferta cultural fantástica. Eu até costumo dizer que se aprende mais na rua em Londres que nas universidades em Portugal!" Mas a qualidade das instituições também pesou: concorreram ambos a várias: Carla optou pelo Royal College - "gostei do ambiente, mais familiar". Para Saul, foi outro o factor decisivo: "a Guildhall foi a única que me ofereceu uma bolsa" e aponta outra razão para a ida. "era importante, para enfrentarmos um ambiente onde ser muito bom e óptimo é normal. Isso ajuda-nos a crescer como músicos, faz-nos perceber o que nos falta e o que temos de fazer para alcançar fasquias sempre muito altas. E abre-nos horizontes, claro!"
Quando for ocasião de indicar tema para a dissertação final, já há ideias: Saul falará "do pianista em música de câmara, da importância que tem, de como se processa a sua interacção e, ao mesmo tempo, de como se reflecte essa faceta da sua carreira no seu trabalho a solo"; quanto a Carla, recuperará a sua 2.ª vocação artística: "sempre tive paixão por artes plásticas e irei pedir a um grupo de jovens compositores portugueses que componham cada um uma peça baseada numa pintura minha, tratando eu depois da influência do quadro nas escolhas e opções dos compositores, assinalando semelhanças e diferenças".
Mas isso é só a médio prazo. No imediato... concertos: "vamos tocar no Auditório do ISEG em Abril, num concerto Antena 2". Para Agosto, espera-os Londres: "faremos um recital na igreja de St. Martin in the Fields". Isoladamente, Saul prepara igualmente "um concerto para a Antena 2, em Maio". Também pretendem concorrer ao próximo Concurso de Música de Câmara de Alcobaça (cuja realização está por assegurar) e a um outro concurso, na Suécia, em Agosto.
Ambos notam a retracção do mercado devido à crise: "sabemos que em Portugal há um excesso de oferta [de artistas] para a procura [promotores de concertos], mas a razão que repetidamente é invocada é a crise financeira...", queixam-se.
Face a isto, que perspectivas profissionais? "Gostava de continuar a desenvolver o trabalho a solo e em música de câmara em conjunto. Porque os dois são um todo, para mim. Claro que é preciso organizar-me muito bem, porque é complicado conjugar as duas, mas tenho uma paixão muito grande pela música de câmara e, mesmo que singre só nesta, também será bom", diz Saul.
Quanto a Carla, acha que acabará por "vir a integrar uma orquestra", embora o queira "atrasar tanto quanto possível, para poder explorar ao máximo a música de câmara e o Dryads". Se entrar numa orquestra "qualquer sítio [geográfico] é possível!"
A ouvir vamos!