"Um contributo para a diferenciação da cidade de Lisboa"
Esta capital da cultura é mais do que um festival. Qual a sua importância?
Esta capital tem uma componente de produção de conhecimento e de crítica e reflexão sobre o mundo de uma forma geral. Lisboa pode contribuir com algumas propostas para compreender o que está a acontecer hoje em dia - esta espécie de segunda guerra fria, esta bipolarização do mundo, o problema dos refugiados, das alterações súbitas de regime na América Latina e em África; e do ponto de vista das artes há hoje também alterações que têm que ver com o fenómeno da globalização financeira e tecnológica. Esta evolução tecnológica põe muito em evidência a necessidade dos arquivos, como exige que haja novas formas de olhar para a documentação e para a forma como organizamos aquilo que produzimos, algo fundamental hoje, em que há uma espécie de amnésia em produção permanente em relação às artes e a tudo. E isto obriga-nos a olhar para o passado e para a forma como foi produzido um conhecimento e que é necessário revisitar.
Vai-se falar de temas incómodos, como a colonização, a questão indígena, o racismo...
A primeira globalização e a primeira modernidade têm como protagonistas Portugal e Espanha. Começou em 1492 quando Colombo chegou às chamadas Índias Ocidentais. Com todas as consequências positivas e negativas que daí decorrem, há um conjunto de clichés e de narrativas que foram construídas ao longo dos anos, fruto da noção de proclamação dos impérios e das colónias, que convinha aos europeus. Mas há uma história que é preciso desocultar, na medida em que há outras narrativas que surgem.
Depois das 150 iniciativas, o que vai ficar no final de 2017?
Gostava que isto não fosse um episódio apenas, mas que deixasse a vontade de continuar a olhar para estes universos. Gostava que as pessoas tivessem enorme gozo em viver estas atividades que nós lhes propomos e que isto fosse também um contributo para a diferenciação da cidade enquanto uma capital europeia que pode diferenciar-se das outras capitais com programações substancialmente diferentes. Face a uma certa homogeneização dos circuitos artísticos, se houver uma programação que se diferencia pelo facto de olhar para outras realidades e para outra criação, acho que é fascinante ir a uma cidade e ver coisas que não vejo em mais lado nenhum.