Um ano de Carris Metropolitana no distrito de Lisboa por entre queixas e aplausos

O serviço funciona em quase toda a Área Metropolitana de Lisboa e entrou em vigor em janeiro do ano passado. Muitos utilizadores consideram que os problemas não ficaram resolvidos e há quem critique os horários.
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Os autocarros aguardam com os quatro piscas numa via de rodagem da Rua Guerra Junqueiro, em Santo António dos Cavaleiros, antes de avançarem para a paragem na Cidade Nova, onde António Antunes, 77 anos, espera transporte para Lisboa.

"Não notei grande melhoria", afirma à Lusa o reformado, num balanço do serviço da Carris Metropolitana, desde que em janeiro deste ano a Transportes Metropolitanos de Lisboa assumiu a gestão do transporte coletivo rodoviário de passageiros na Área Metropolitana de Lisboa (AML) na margem norte do Tejo. O morador no populoso bairro de Loures admite que os autocarros "são mais recentes, pelo menos em aspeto, em limpeza", quando os anteriores "tinham um bocado de idade" e "estavam um bocado já deteriorados".

Passa pouco das 8.30 quando, sob um céu cinzento e ar gélido, o septuagenário admite que "de manhã há bastantes horários", pelo que "não se pode queixar muito". Está bem servido - pode apanhar um autocarro à hora que der mais jeito.

"Mudou para melhor, acho eu, sim, em termos de condições, de horários [...]. Os autocarros são mais recentes, só têm às vezes a situação de serem mais pequenos, os outros eram maiores, levavam mais pessoas. Isto é uma área com muita gente", comenta Rosa Marques, 53 anos. A técnica de turismo sai de casa cedo para Lisboa e regressa ao fim do dia. Reconhece que, embora sem queixas de incumprimentos, durante o dia que não há tantos horários, "mas de manhã e à noite há sempre".

Desejos para o novo ano? "Provavelmente autocarros maiores, porque são pequenos, os outros também eram muito grandes. Eram diferentes, pronto, estes já são mais modernos, têm menos lugares, às vezes há pessoas que ficam nas paragens, porque não consegue entrar toda a gente", reitera.

No Largo Marcos Romão Reis Júnior, em Loures, Mário Simões, 56 anos, eletricista e canalizador, atesta que o serviço está, "sem dúvida, muito melhor do que anteriormente", e que "é muito superior, está sempre a rodar".

A renovação da frota agradou-lhe, com autocarros "novíssimos - têm todas as condições que antigamente não existiam". "No início, havia certas confusões, porque o pessoal não os entendia também, e eles não sabiam bem os trajetos, para onde... Mas agora está a ficar tudo mais ou menos definido", explica o morador em Ponte de Lousa, que na deslocação para Sete Rios prefere usar transportes públicos: "É o melhor, é mais rápido até."

Para Ricardo Carvalho, 43 anos, desempregado, o serviço melhorou, mas por vezes há dias em que espera uma hora e não passa qualquer autocarro. O morador em Guerreiros concede que "há mais transportes, mas tem dias". "Às vezes nas horas de ponta falham, e às vezes temos de estar uma hora, mais de uma hora à espera, e depois vem tudo cheio, tudo a abarrotar, e a gente não consegue andar lá dentro", queixa-se. À noite e ao fim de semana, diz, ainda é pior, com mais espera.

A empresa, acrescenta, deveria aumentar a capacidade dos autocarros, que às vezes parecem transportar "sardinhas enlatadas", e os horários da Gare do Oriente para Loures também seriam de rever. A última carreira é às 22.20, enquanto para outros destinos arranca após a meia-noite.

A brasileira Naiara, 29 anos, em Portugal desde fevereiro, é utilizadora diária, mas não está muito satisfeita, porque em Ribas de Baixo só passa uma carreira e o último horário é às 20.45. "Muitas vezes tenho de ir de Uber para o trabalho ou do trabalho para casa porque não tem mais como ir", lamenta.

Os sindicatos fazem um balanço mais ou menos positivo da Carris Metropolitana no distrito de Lisboa, mas, dizem, a falta de motoristas pode condicionar a resposta ao aumento de passageiros e há quem queira trocar operadores privados por um público. "O balanço não é muito positivo. Consideramos também que não é muito negativo porque achamos que [...] é um modelo a aprofundar", afirmou José Manuel Oliveira, coordenador da Federação Sindical dos Transportes e Comunicações (Fectrans).

O dirigente falava à Lusa no âmbito do primeiro ano sobre o arranque, em janeiro passado, da operação da Carris Metropolitana na margem norte do Tejo, reunindo os transportes coletivos de passageiros rodoviários nos 18 municípios da Área Metropolitana de Lisboa (AML), embora Barreiro, Cascais e Lisboa também tenham serviços próprios. "Tem que se concentrar numa entidade, pelo menos ao nível de uma grande região, a articulação dos diversos modos de transporte e sabemos que, de facto, do ponto de vista deste modelo, se deveria aprofundar e alargar não só o transporte rodoviário, mas ter [uma] coordenação mais aprofundada com os outros modos de transporte", advogou.

Para José Manuel Oliveira, a Carris Metropolitana apresenta um conjunto de problemas que resultam de "ter que recorrer a empresas privadas, algumas das quais já estavam no mercado, já operavam na região, mas que operavam num modelo assente em baixos salários" e "com menos trabalhadores do que eram necessários". Estes privados, prosseguiu, recorriam "muito ao trabalho extraordinário para compensar o salário que era reduzido" e, "quando se viram confrontados com a necessidade de terem que fazer mais carreiras", verificou-se uma incapacidade de responder.

*Jornalista da agência Lusa

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