Ilha de Sark. SÉCULOS À ORDEM DE UM SENHOR.Não se chegou ao ponto de cortar a cabeça ao rei, mas os acontecimentos desta semana na pequena ilha de Sark não ficaram atrás de uma revolução. O último bastião do feudalismo na Europa, que durante os últimos quatro séculos andou às ordens de um Senhor coberto de direitos feudais e seguiu a justiça ditada por um velho Senescal, foi a votos. Democráticos, bem entendidos..Os cerca de 500 eleitores que vivem neste exótico rochedo no Canal da Mancha, a pouco mais de 30 quilómetros da costa da Normandia, França, elegeram pela primeira vez os 28 membros do novo Parlamento..O acontecimento marcou um começar de novo na ilha organizada como uma sociedade medieval, desde que, em 1565, a Rainha Isabel I a concedeu como feudo ao nobre Helleir de Carteret, para ele a povoar com 40 famílias e proteger dos piratas. .Durante centenas de anos, o Senhor, representante da coroa britânica, presidiu à assembleia, controlada pelos proprietários das terras. Com o tempo houve alterações e alguns Chief Pleas passaram a ser eleitos. Mas o sistema manteve o seu carácter medieval que choca com a legislação europeia sobre direitos humanos. E isso abriu o caminho à mudança. E à polémica. Apesar de a maioria dos habitantes de Sark, incluindo o Senhor, o septuagenário John Michael Beaumont, serem partidários da democratização, o povo dividiu-se..A campanha eleitoral foi tanto ou mais amarga do que em qualquer democracia sofisticada e habituada a estas andanças. Numa comunidade de vizinhos que atrai turistas à procura de abrigo do mundo moderno, os insultos trocados envenenaram as relações das pacatas gentes da ilha. Steve Cole, um dos habitantes de Sark, disse ao The Times qu,e se os proprietários mantivessem os mosquetes prontos a disparar como manda a lei e a tradição, "haveria uma guerra civil"..De um lado estavam os irmãos Barclay, que vivem num castelo privado no rochedo de Brecqhou, ainda mais pequeno que Sark e a poucos metros desta. Os gémeos multi-milionários, David e Frederik, donos da cadeia de hotéis de luxo Ritz e do jornal The Telegraph, chegaram a Sark no início dos anos 90, compraram hotéis e fizeram investimentos. Os seus partidários queriam trazer a modernidade à ilha onde os carros são proibidos e não existe iluminação nas ruas. Do outro lado, estavam os apoiantes do Senhor, que se opunham aos planos dos Bar- clay e seus partidários, porque querem manter a tradição de Sark, o seu modo de vida e o seu isolamento..Apesar dos receios, não foram disparados tiros nem rolaram cabeças..Na eleição, venceram os defensores da tradição. Os derrotados irmãos Barclay - apenas foram eleitos cinco deputados reformistas - anunciaram que abandonarão os seus negócios e planos para Sark e ficarão refugiados no seu castelo vizinho..É caso para dizer: foi preciso que algo mudasse para que tudo ficasse na mesma.