Trump? É bem feito!

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Sim, a 8 de novembro, a América vai eleger um novo presidente, mas não esquecer que escolherá igualmente uma nova Câmara dos Representantes, um terço do Senado e ainda 12 dos 50 governadores estaduais. É também por isso que Trump é uma tremenda dor de cabeça para o establishment do Partido Republicano, vítima da deriva populista das bases. E sem dúvida que nos bastidores muita boa gente está a fazer contas se é melhor estratégia tentar ainda travar o magnata, cada vez mais certo como candidato presidencial republicano, ou evitar criticá-lo daqui para a frente em nome da unidade partidária.
Está o Partido Republicano em crise? Bem, perdeu as últimas duas presidenciais e arrisca-se a somar neste ano a terceira derrota consecutiva, o que não lhe acontece desde a era Roosevelt/ /Truman, na primeira metade do século XX. Mas nas intercalares de 2014, o partido até reforçou a maioria na Câmara, reconquistou o controlo do Senado e aumentou para 31 o número de governadores.
Portanto, pergunte-se a Obama se os republicanos contam e a resposta do presidente democrata só poderá ser um convite para se ver os entraves que o Congresso pôs às suas políticas, desde a reforma do sistema de saúde até ao acordo sobre o nuclear do Irão. A questão que se coloca mesmo é se vão deixar de contar após 8 de novembro, com congressistas e governadores a serem arrastados pelo efeito Donald Trump.
Quase todas as sondagens preveem uma derrota de Trump seja frente a Hillary, a favorita democrata, seja se o rival for Sanders. Assim, mesmo com as desistências de Cruz e Kasich das primárias persiste a tentação nos republicanos de forçar uma alternativa ao magnata desbocado, imprevisível e de percurso ideológico tão oscilante que até já foi democrata. Mas um terceiro candidato poucas hipóteses tem. A história mostra que quando há uma divisão séria num dos campos, esse campo perde. Aconteceu aos republicanos em 1912, mas também em 1992, quando o independente Ross Perot obteve 19% dos votos e na prática tirou a Casa Branca a Bush pai para a oferecer a Clinton, o marido de Hillary.
Mas mesmo sem um candidato conservador rival de Trump, é evidente que muitos republicanos vão evitar o apoio declarado ao magnata. Que se saiba, até agora só dois senadores e três governadores estão ao seu lado, e tanto Bush pai como Bush filho, os dois antigos presidentes republicanos vivos, recusam o habitual apadrinhamento. Também contra está Paul Ryan, speaker da Câmara e ex-candidato a vice-presidente.
Imaginemos então que muitos republicanos ficam em casa furiosos com Trump, que para alguns é demasiado liberal mas para outros sobretudo pouco fiável. E que ao mesmo tempo o eleitorado democrata se mobiliza para votar Hillary, até mesmo aqueles que agora estão com Sanders. O impacto será devastador na corrida à Casa Branca, notório na Câmara, mas atenuado no Senado e sobretudo entre os governadores, pois só quatro estados agora republicanos vão a votos.
Derrotado, humilhado, dividido, mas não destruído. É esse o cenário previsível para o Partido Republicano na manhã de 9 de novembro, quando se conhecerem os resultados. A Casa Branca, com a sucessão democrata assegurada, manterá os Estados Unidos numa linha progressista, até porque surgirão vagas no Supremo Tribunal. E um Congresso amigável ajudará. Mas, depois de digerir a derrota, os republicanos deverão reinventar-se como partido, mesmo que condenado à oposição por uns tempos. E se perceber como evitar novos Trumps é vital, também convém rejeitar o reacionarismo que diabolizou Obama e afasta as minorias étnicas e que a médio prazo terá ainda piores consequências para o partido que foi o de Lincoln. Pobre Partido Republicano, pobre América que precisa dele. Mas Trump é bem feito!

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