"Transparência": Ferro tenta travar populismo à esquerda
Por iniciativa da esquerda, os deputados estão a iniciar um processo legislativo que aperta o cerco das incompatibilidades sobre os políticos, mas o presidente da Assembleia da República lança desde já o alerta, numa declaração ao DN: "Sim à transparência e à exigência republicana e cívica; não ao populismo antiparlamentar."
O que preocupa Eduardo Ferro Rodrigues é a possibilidade de os políticos - nomeadamente os deputados - serem cada vez mais forçados a exercer em exclusividade mas sem que isso implique, por exemplo, melhores condições de remuneração.
No final de março, numa entrevista à Antena 1, o presidente do Parlamento foi suficientemente explícito: "É necessário aumentar incompatibilidades e, em paralelo, dar condições mais positivas para o exercício de funções de exclusividade." Mas este, acrescentou o ex--deputado e ministro, "é um problema que não se resolve de um dia para o outro carregando num botão e fazendo aumentos". Resolve--se "programando a médio prazo para que para a Assembleia da República vão os melhores e não os medianos, como costuma acontecer". "Responsabilidades e direitos devem estar a par e temos de recusar, porque são antidemocráticas, as atitudes contra o Parlamento, os partidos, base da democracia representativa", acrescentou ontem, na declaração ao DN.
Por unanimidade, o Parlamento aprovou ontem a criação de uma comissão eventual, proposta pelo PS, para o Reforço da Transparência no Exercício das Funções Públicas. Sem votação, desceram à comissão vários diplomas do PS, Bloco e PCP sobre incompatibilidade e impedimentos e controlo da riqueza dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos.
Na discussão antes da votação, a deputada do PSD (e ex-ministra das Finanças) Maria Luís Albuquerque foi o alvo que o BE e o PCP nomearam na apresentação dos seus projetos de lei. O social-democrata Marques Guedes saiu em sua defesa e atacou as propostas dizendo que "não é sério" iniciar um "frenesim legislativo baseado numa vendeta ad hominem".
CDS com votação nas mãos
Entretanto, vai-se discutindo no Parlamento, embora sem acesso a documentos finais, o Programa de Estabilidade (PE) e o Programa Nacional de Reformas (PNR), que o governo terá de enviar para Bruxelas no final do mês no âmbito dos compromissos do chamado "semestre europeu" (compatibilização entre as orientações orçamentais da UE e as orientações orçamentais dos Estados membros).
O que falta saber, além dos conteúdos finais dos documentos, é se no dia 27 irão a votos ou não (em março de 2011 a oposição levou o PEC4 a votos, chumbando-o, o que levou o primeiro-ministro José Sócrates a demitir-se). À esquerda ninguém o quer fazer, para evitar que o BE, o PCP e o PEV tenham de pronunciar-se vinculativamente sobre documentos que resultam dos compromissos europeus do governo, de que os três partidos são críticos. O PSD, através de Passos Coelho, também já afirmou que não tenciona fazê--lo, dizendo que o que importa serão os documentos posteriores que concretizarão substantivamente o PNR e o PE (o próximo OE).
Sobra o CDS. Os centristas esperam para ver e não descartam nenhuma opção. Já desafiaram as esquerdas a levarem os documentos a votos - mas sem resposta. E especulam sobre se o PE não estará a dividir a "geringonça" - mais uma razão para o levar a votos. "Não se percebe por que razão não se ouve, à esquerda, qualquer pedido para conhecer o PE a tempo e horas de discutir o PNR: estão todos de acordo no silêncio ou há desacordo no Programa?", perguntava-se ontem, falando ao DN, Adolfo Mesquita Nunes, vice-presidente do partido.