Traficantes vendem louro prensado por haxixe na Baixa de Lisboa

PSP e junta de freguesia fizeram alertas, principalmente para os turistas não se deixarem enganar. Mas negócio continua
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Encostados na esquina na Rua Augusta com a Rua da Assunção, em Lisboa, três homens vestidos de preto observam atentamente quem passeia pela baixa lisboeta. Após um primeiro contacto visual, um apercebe-se de um potencial cliente. Aproxima-se e diz: "Haxe?". "Sim, quanto?". "50 euros", respondeu. "É muito, só tenho dez euros, mas é bom?". "Claro", enfatizou. Num instante, os dentes do indivíduo cerraram o produto, fazendo, em seguida, a troca pela nota de dez euros. Uns passos mais à frente, uma breve análise olfativa confirmava a enorme presença de louro no preparado enrolado em plástico acabado de vender. O negócio continua, apesar das campanhas da polícia de alerta para esta falsificação.

Foi no início de abril, que a Junta de Freguesia de Santa Maria Maior e a PSP lançaram uma campanha de alerta dirigida, sobretudo, aos turistas para a falsa venda de droga na baixa lisboeta. Ao DN, Miguel Coelho, presidente da junta de freguesia, disse ter a "perceção que essa atividade, fruto de uma maior pressão, tem vindo a diminuir". Mas uma breve passeata entre a Rua Augusta e a Praça do Comércio revelam uma outra realidade: dezenas de abordagens a turistas. Umas são feitas abertamente, outras começam com uma primeira tentativa de venda de óculos de sol. Perante a recusa, passa-se para o "haxe". Na Praça do Comércio, o mesmo cenário: encostados aos candeeiros ou, simplesmente, deambulando pelo espaço, os vendedores abordam cirurgicamente os turistas. Um casal de ingleses, depois de abordado e de ter recusado a compra, disse ao DN desconhecer que os vendedores estão a "traficar" louro prensado.

Problema arrasta-se desde 2015

Para a PSP, isto tem sido uma situação de difícil combate. Apesar de um pedido oficial, a polícia não indicou nenhum responsável para falar com o DN. Ainda assim, fonte policial explicou que os agentes debatem-se com um problema prático: identificado o vendedor, na maioria das vezes a sua detenção é ilegal, uma vez que não está a vender droga, mas sim louro prensado. Ironizando, a mesma fonte da PSP declarou: "Talvez seja uma situação de venda ambulante ilegal, logo a competência será da ASAE."

É quem compra, caso posteriormente confirme que o que tem na mão terá mais utilidade na cozinha do que numa mortalha, não se vai queixar à polícia, nem à Junta - Miguel Coelho disse ter recebido, isso sim, queixas dos moradores sobre a venda desenfreada de droga na Baixa.

O poder político local já, por mais do que uma vez, procurou resolver o problema, sobretudo devido à má imagem que o negócio pode provocar junto dos milhares de turistas que visitam a capital. Há dois anos, por exemplo, o vereador com o pelouro da segurança da Câmara Municipal de Lisboa, Carlos Manuel Castro, anunciou que a autarquia ia sensibilizar o Ministério da Administração Interna para "haver enquadramento legal" que criminalizasse o falso tráfico de droga. Em declarações à Lusa, o vereador afirmou que este suposto tráfico de droga "não é crime, mas sim uma contraordenação", pelo que "é necessário que haja uma alteração" na lei.

A reação do autarca, que pretendia criminalizar a tradicional "banhada" associada ao tráfico de droga, surgiu depois de a Assembleia Municipal de Lisboa ter sido confrontada, em 2015, com uma petição assinada por mais de 700 pessoas, apelando ao fim da "presença de pretensos traficantes de droga" no centro histórico de Lisboa. A principal preocupação dos peticionantes era a má imagem que a atividade estava a potenciar da capital. Por isso, reclamaram, era necessário "contornar os vazios legais". Ou seja, punir o falso tráfico de droga.

Como a solução poderia não passar por aí, a Junta de Freguesia e a PSP juntaram-se e, no início do mês de abril, lançaram a campanha "Basta de louro prensado", alertando os turistas para a venda de bay leaf e não o propagado "haxe". O superintendente Paulo Flor, comandante da esquadra da 1.ª divisão da PSP, explicou nessa altura aos jornalistas que "80 por cento da venda ambulante na Baixa de Lisboa é venda de louro prensado e chá de malvas". Uma mistura que tratando-se de uma venda ilegal "não está tipificada nos editais da câmara"

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