Timor-Leste elege presidente na expectativa de superar impasse político

Há um recorde de 16 candidatos, que incluem o atual presidente, Francisco Lú-Olo Guterres, e o ex-chefe de Estado e Nobel da Paz, José Ramos-Horta.
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Cerca de 860 mil eleitores são chamados este sábado às urnas para eleger o presidente de Timor-Leste, numa corrida que tem um recorde de 16 candidatos, entre os quais quatro mulheres. O atual chefe de Estado, Francisco Lú-Olo Guterres, procura a reeleição, mas tem pela frente nas sondagens o também veterano ex-presidente e Nobel da Paz José Ramos-Horta, que conta com o apoio de vários pesos pesados da política timorense, entre eles o primeiro presidente Xanana Gusmão. No boletim de voto há ainda outros adversários inexperientes - só dois já tinham sido candidatos.

Ramos-Horta, de 72 anos, anunciou a sua candidatura em janeiro e diz querer restabelecer a estabilidade política no país que este ano assinala o 20.º aniversário da independência. "O que aconteceu nos últimos anos é que o presidente excedeu os seus poderes", disse o candidato citado pela Reuters, referindo-se à tensão política no país.

Em 2018, Lú-Olo, ex-líder da guerrilha de 68 anos e atual presidente da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), recusou a posse de sete ministros do Congresso Nacional para a Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), de Xanana Gusmão - que apoiou a sua candidatura há cinco anos. O presidente alegou que as suas ações se justificavam devido aos processos judiciais abertos por suposta má-conduta dos nomeados, mas o seu gesto intensificou as divisões partidárias e levou a um impasse político.

As tensões dos últimos anos entre os dois principais partidos políticos - que em 2018 chegaram a incluir confrontos entre os apoiantes causando dezenas de feridos - levaram à demissão do primeiro-ministro Taur Matan Ruak em fevereiro de 2020, depois de não conseguir passar o orçamento apesar de várias tentativas. Ruak concordou contudo ficar até ser formado um novo governo, tendo ficado responsável pelo combate à pandemia de covid-19, operando sem um orçamento anual e estando dependente das injeções mensais das poupanças do fundo soberano.

"Temos que pôr de novo a máquina a andar depois da paralisia que gerou uma crise económica por causa da incapacidade de votar um orçamento" durante vários anos, disse à AFP Christine Cabasset, especialista em Timor-Leste e vice-diretora do Instituto de Pesquisa sobre o Sudeste Asiático Contemporâneo. Depois da pandemia de covid-19, a economia de Timor-Leste sofreu novo golpe no ano passado, quando o ciclone Seroja atingiu o país, matando pelo menos 40 pessoas.

Só duas das cinco presidenciais foram decididas à primeira volta: as de 2002, em que Xanana Gusmão venceu com 82,69% contra apenas um adversário (Francisco Xavier do Amaral), e há cinco anos, quando Lú-Olo, na sua terceira corrida e com o apoio de Xanana Gusmão, venceu com 57,08%, frente a sete adversários. Desta vez, há um recorde de 16 candidatos. A eventual segunda volta está marcada para 19 de abril. O vencedor toma posse a 20 de maio, quando Timor-Leste celebra o 20.º aniversário da independência da Indonésia, que ocupou a antiga colónia portuguesa durante 24 anos.

A poucos meses da comemoração e ainda antes do início da campanha, Lú-Olo defendeu um balanço sobre o que tem sido feito desde aí. "Apesar das limitações, dos erros e das falhas que certamente cometemos, estou convencido de que valeu a pena. Certamente o compromisso para com o futuro, para com as gerações mais novas tem de ser mais forte e tem que as envolver neste processo sem fim de afirmação de Timor-Leste como pátria livre, soberana e independente", considerou.

Esta não é a primeira vez que Lú-Olo e Ramos Horta se enfrentam. Em 2007, o atual presidente ficou à frente na primeira volta, obtendo 27,89% contra os 21,61% de Ramos-Horta (eram sete candidatos no total). Mas este ganhou a segunda volta, com 69,18%. Nas eleições de 2012, as mais renhidas com 12 candidatos (incluindo Ângela Freitas e Rogério Lobato, que voltam a estar agora no boletim de voto), Lú-Olo voltou a vencer à primeira volta, com 28,76%, deixando Taur Matan Ruak (que acabaria por ganhar na segunda volta) em segundo com 25,71%. Ramos-Horta foi então terceiro, com 17,48%.

O primeiro-ministro apelou esta semana à participação massiva dos eleitores, considerando que uma abstenção baixa reforça a democracia. A abstenção tem crescido a cada cinco anos, dos 15,17% nas primeiras eleições de 2002 para os 28,85% há cinco anos.

"Deixo um apelo a todos os timorenses para que aumentem a taxa de participação. Isso ajuda a refletir a avaliação do desempenho democrático do país", afirmou Taur Matan Ruak. "Uma participação elevada é um privilégio nacional e apelo a que a taxa de participação aumente e que todos os cidadãos façam um esforço para votar e ajudar a escolher o Presidente da República para o período 2022-2027", acrescentou.

susana.f.salvador@dn.pt

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