Timor encerra campanha com "estrela" Xanana e queixas sobre debate
A multidão de apoiantes da Fretilin foi tal no comício de encerramento da campanha para as presidenciais de sábado em Timor-Leste que o secretário-geral do partido, Mari Alkatiri sugeriu ontem que o nome do local onde decorreu - Tasi Tolu, ou "três lagoas" em tetum - devia passar a ser Tasi Haat, ou "quatro lagoas". E explicou: "Três ali e uma aqui. Só que esta é vermelha [a cor do partido]". No palco nem a chuva impediu a festa com Alkatiri a juntar-se ao candidato da Fretilin, Lú-Olo, que espera vencer um segundo mandato de cinco anos.
Na véspera, o seu principal adversário, José Ramos-Horta, escolhera o mesmo local para a sua última ação de campanha. O Nobel da Paz, que procura regressar à presidência, que ocupou entre 2007 e 2012. Ao lado do candidato do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), a "estrela" foi Xanana Gusmão, o líder histórica da resistência à ocupação indonésia e primeiro presidente após a independência em 2002.
Um dia depois de Ramos-Horta e Xanana, que chegaram ao comício de jeep, ambos de óculos de sol e envergando as cores do CNRT, as "três lagoas"pintaram-se ontem de vermelho para ouvir Lú-Olo, nome de guerra de Francisco Guterres, e Alkatiri. O líder da Fretilin e antigo primeiro-ministro a pedir votos em consciência e "vigilância total" durante o dia da votação e na contagem, vincando que os comícios da campanha mostraram que "o povo conhece Lú-Olo e que quer que continue a trabalhar pelo povo".
Depois de muita dança e ao som das guitarras, que o próprio Lú-Olo toca, o comício encerrou com um apelo: "No sábado votem no número seis. Só precisam de furar o número seis. Não precisam de escrever I Love you na bandeira da Fretilin. Isso estraga o voto. Escrevam antes isso num SMS aos namorados".
A campanha terminou oficialmente ontem, seguindo-se dois dias de reflexão. Os timorenses vão às urnas no sábado para escolher entre os candidatos às presidenciais: aos favoritos Ramos-Horta e Lú-Olo, juntam-se ainda 14 outros nomes.
Ontem também, vários candidatos presidenciais criticaram o formato e problemas técnicos do longo debate organizado pela Comissão Nacional de Eleições (CNE) e transmitido na véspera por uma televisão privada timorense.
O debate prolongou-se durante seis horas e meia, com um longo protocolo de arranque, poucas questões colocadas e a eliminação, "por falta de tempo", como explicou o moderador, de perguntas em português, que estavam previstas. Um corte a meio da transmissão e problemas com os microfones de vários candidatos suscitaram amplas críticas nas redes sociais e da parte de vários candidatos, que apontaram o dedo à CNE e à GMN TV, a televisão escolhida para o debate.
O debate foi divido em várias partes, com uma primeira introdução de cada candidato e uma pergunta diferente, sorteada, para cada um. Seguiram-se três perguntas colocadas por três membros de um painel escolhido pela CNE - que os vários candidatos poderiam comentar - e, finalmente, uma ronda com a mensagem final.
Grande parte do tempo foi passado com uma sucessão de monólogos em que a maioria das questões foram colocadas apenas a um candidato, sem oportunidade de contraditório.
Já antes do debate, vários candidatos contestaram a opção da CNE de atribuir os direitos dos debates à televisão privada, em vez da pública RTTL, com o organismo de supervisão a explicar que tomou a decisão olhando para critérios técnicos e financeiros.
Lú-Olo foi um dos que contestou a decisão formalmente junto da CNE. O presidente em exercício, disse à Lusa que sempre defendeu que "deveria ser a RTTL a fazer cobertura para transmitir até as aldeias e sucos [divisão administrativa], onde todos têm acesso". "O formato também levanta dúvidas porque eram muitos candidatos e apesar de tantas horas de debate cada candidato teve cerca de 15 minutos. Não deu para responder às questões devidamente", vincou.
Já José Ramos-Horta recordou à Lusa que a decisão da CNE de atribuir o debate foi feita com base num concurso público, com a GMN "a oferecer melhores condições em termos de preço", notando que os problemas técnicos que surgiram demoraram imenso a ser resolvidos. "Quando se chegou à parte das perguntas reservadas para português, já eram uma e tal da manhã e o pessoal estava cansado, o público tinha abandonado, e havia muitos protestos online sobre a demora, sobre qualidade do som e falhanços técnicos", disse o ex-presidente.
Apesar de notar o esforço da CNE e da GMN, Ramos-Horta insistiu que deveria ter sido seguido outro modelo, com os 16 candidatos divididos, por sorteio, em vários debates, para permitir aprofundar os temas. "Ontem não foi debate nenhum, foi cada um dizer umas tantas coisas que tiveram zero impacto na perceção do eleitorado", afirmou o Prémio Nobel da Paz em 1996.