Tempo de justiça
A decisão instrutória da Operação Marquês gerou uma enorme comoção pública, com muita gente a sentir-se revoltada, indignada.
É inteiramente compreensível: depois de ter sido preso um ex-primeiro-ministro, facto inédito no nosso país, de ter sido apresentada uma volumosa acusação e conhecidos pormenores processuais altamente comprometedores, ninguém esperava que José Sócrates escapasse de ir a julgamento responder pelos crimes mais graves que lhe foram imputados, ou seja, corrupção.
Sendo eu advogado, não posso perder de vista que há regras de um Estado de direito e garantias processuais que devem ser asseguradas a todos os arguidos, pois, e em síntese, como se ensina nos primeiros anos de faculdade, mais vale um criminoso solto do que um inocente preso...
Mas este processo, como outros que lhe são coevos (caso do universo BES), são de tal sorte relevantes para a nossa vida em sociedade que não podem deixar de nos levar a pensar que há muito a mudar no sistema judicial.
Não se trata, hic et nunc, de discutir a forma de tornar a justiça mais célere, pondo cobro a um dos nossos piores custos de contexto. Trata-se antes de refletir se não será imperioso, premente e, porventura, relativamente simples, proceder a alterações da nossa normação penal e processual penal, a fim de evitar que casos com suspeitas de corrupção praticados por titulares de cargos públicos e políticos demorem anos a ser esclarecidos.
Definitivamente, poder-se-ia extinguir a fase de instrução no processo penal, levando o arguido, após acusação, diretamente a julgamento e assegurando-lhe, aí, todas as suas garantias de defesa. Tal como se poderia legislar no sentido de que a tramitação deste tipo de processos passasse a ser urgente. Da mesma maneira, as penas destes tipos de ilícitos criminais poderiam ser agravadas, estando em causa titulares daqueles cargos; o mesmo devendo suceder com os prazos de prescrição que, sem dificuldade de maior, poderiam, rectius, deveriam ser ampliados.
Diz-se, frequentemente, que não se deve legislar em cima dos acontecimentos, por conduzir a precipitações, próprias de julgamentos populares e, como tal, profundamente iníquos.
Penso o contrário: há anos de mais que o nosso sistema judicial reclama por este tipo de alterações!
Se não o fizermos agora, quando o faremos?... É tempo de justiça.
Advogado. Vice-Presidente do CDS/PP