O retrato controverso de Reagan

"Killing Reagan", baseado na controversa obra homónima de Bill O"Reilly, retrata a tentativa de assassínio do 40.º presidente dos Estados Unidos, em 1981
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Na quarta temporada do drama político da Netflix House of Cards, quando Frank Underwood está internado no hospital a recuperar dos ferimentos de uma tentativa de assassínio, conspira-se na Casa Branca. Quem irá suceder ao presidente em caso de morte? Terá capacidades físicas para governar caso recupere? A ficção, tantas vezes inspirada na realidade, dificilmente a supera. E o que House of Cards retrata em 2016 poderia bem ter sido o que se passou nos corredores do poder norte-americano a 31 de março de 1981, um dia depois de Ronald Reagan, presidente em exercício, ter sido vítima de um atentado em Washington. São precisamente esses acontecimentos os retratados em Killing Reagan, telefilme do National Geographic que se estreou neste domingo nos EUA.

A duas semanas das eleições norte-americanas, a ficção televisiva tenta capitalizar o clima de transformação e incerteza política, recordando o passado enquanto não chega o dia de decidir se o futuro será Clinton ou Trump. Com Tim Matheson (que interpretou o vice-presidente John Hoynes na série Os Homens do Presidente) como Ronald Reagan e Cynthia Nixon (a Miranda de O Sexo e a Cidade) como a primeira-dama, Nancy, Killing Reagan retrata a caminhada do ator tornado político em direção à Casa Branca, a campanha eleitoral de 1980, a batalha contra o democrata Jimmy Carter, o início do seu primeiro mandato. O telefilme mostra também a história de John Hinckley Jr. (Kyle S. More), o autor da tentativa de assassínio de Reagan, recentemente libertado.

Mais interessante do que o filme propriamente dito, que os críticos do The Hollywood Reporter e da Variety consideram apenas mediano, é o franchise que dá origem a este formato televisivo. Killing Reagan é o quinto volume da saga literária da autoria de Bill O"Reilly, controverso comentador político norte-americano que é anfitrião de um dos formatos mais populares do canal Fox News, The O"Reilly Factor. Conservador (ou não estivesse ele num canal de notícias assumidamente pró-Republicano), O"Reilly tem, paradoxalmente, colecionado êxitos, audiências e confrontos. As informações que inclui nas suas obras já foram diversas vezes contestadas (no ano passado, o site de notícias Mother Jones publicou uma reportagem que desmentia a presença de O"Reilly na Argentina durante a guerra das Falklands, em 1982).

Killing Reagan, que em outubro de 2015 ocupou o lugar cimeiro da lista de best-sellers de não-ficção do The New York Times, não é exceção. Pouco depois da chegada do livro às bancas, os biógrafos oficiais de Ronald Reagan publicava um editorial no Washington Post a questionar a veracidade dos alegados novos dados apresentados no livro de Bill O"Reilly, descrevendo a obra como como "inexata" e "sensacionalista". Craig Shirley, Kiron K. Skinner, Paul Kengor e Steven F. Hayward argumentavam que "infelizmente, Killing Reagan mostra que a informação errada (se não a desinformação) ainda se mantém entre nós, como um demónio que não pode ser exorcizado. Regurgita e ressuscita material que pensávamos (e esperávamos) estar morto e acabado".

Os autores das várias biografias oficiais de Ronald Reagan (que morreu em 2004, na sequência de complicações da doença de Alzheimer), enumeram uma série de informações falsas do best-seller, como a alegada tentativa de depor Reagan em 1981, quando o então presidente se encontrava a recuperar dos ferimentos do atentado. Algo que pouco deverá importar a Bill O"Reilly, que fatura milhões e milhões com a saga Killing (os assassínios de Abraham Lincoln, Jonh F. Kennedy, a morte de Jesus Cristo e do general norte-americano George S. Patton são temas dos outros quatro livros). Killing Reagan tem data de estreia prevista em Portugal, no canal National Geographic, em janeiro de 2017.

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