Tecnologia na Educação: uma ferramenta ao serviço de quem?

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A UNESCO lançou em julho o relatório Monitorização Global da Educação 2023 (GEM - Global Education Monitoring) que tem vindo a ser apresentado em vários países e, hoje, também o será em Portugal, num Simpósio Internacional a decorrer no Porto, organizado pela Escola Superior de Educação Paula Frassinetti e pela OEI, com ampla participação institucional.

O tema da tecnologia não é novo e já estava presente na Agenda 2030, mas a pandemia tornou o tema central e obrigou a acelerar processos. Contudo, como bem destaca Manos Antoninis, diretor do GEM, o uso da tecnologia muda, mas não transforma a Educação, e pode ser mais um fator de exclusão, visto que muitos estudantes não têm contacto regular com a tecnologia na escola. Se, por um lado, a tecnologia transforma e apoia as aprendizagens, contribuindo também, por exemplo, para uma melhor gestão dos sistemas escolares, este relatório não deixa de sublinhar aspetos críticos, como o seu uso desregrado.

Nesse sentido, apresentam-se três condições que os Sistemas Educativos (do Pré-escolar ao Superior) devem assegurar: garantir o acesso às tecnologias, regulamentar a sua utilização e preparar os professores. Acrescentaria a necessidade de prosseguir os estudos independentes, baseados em evidências, sobre os resultados da utilização da tecnologia nos diferentes níveis de ensino.

Se é verdade que a tecnologia oferece oportunidades de educação para milhões de crianças e jovem, sendo uma preciosa ferramenta em determinados contextos, como é o caso de estudantes com necessidades educativas especiais, atualmente quase um quarto dos países baniram o uso de telefones móveis na escola e apelam ao uso responsável da tecnologia. Além disso, importa refletir sobre o que se entende por tecnologia (as diferentes tecnologias) e como a usar de forma adequada aos contextos (na China, a gravação de aulas para 100 milhões de estudantes de zonas rurais melhoraram os resultados em 32%).

O secretário-geral da OEI, Mariano Jabonero, numa recente entrevista publicada na revista Política Exterior dedicada à América Latina, cujo número será lançado na próxima semana, responde ao tema da tecnologia insistindo na importância de que esteja ao serviço das pessoas, do seu bem-estar e de um melhor governo das causas públicas. Nesse sentido, apela à União Europeia para que avance com uma regulação que proteja as pessoas, fomentando acordos transnacionais que facilitem uma conectividade que chegue a todos.

Não temos de ver a tecnologia, e agora a Inteligência Artificial (IA), a preto e branco, mas antes aproveitar o melhor que nos pode trazer e evitar os seus malefícios. Mariano Jabonero dá o exemplo da utilização da IA para prevenir o abandono escolar, possibilitando um acompanhamento individualizado dos alunos, que apoie a ação dos professores no sentido de uma educação personalizada, que já foi uma utopia e hoje se considera o principal desafio numa educação para o século XXI.

Em 2020, António Guterres alertava para os efeitos da pandemia, que resumiu como "catástrofe geracional", e cujas consequências ainda desconhecemos. Sabemos, porém, que menos aprendizagens, mais abandono escolar significam um aumento da pobreza e um fosso ainda maior entre ricos e pobres.

Também aprendemos que há três competências essenciais que a escola deve desenvolver: as competências socioemocionais, comunicativas e digitais. Todas as outras se somam a estas, que nos preparam para as transformações aceleradas que vivemos e se anunciam.

Na apresentação do GEM2023, Manos Antoninis insiste também em três objetivos que devem orientar as políticas educativas: colocar os interesses dos alunos no centro de um sistema baseado nos Direitos Humanos; focar nos resultados da aprendizagem em vez de nos conteúdos digitais; e, por fim, ter bem presente que o digital não substitui, e apenas complementa, a interação humana. Só essa pode ser a resposta ao desafio do GEM. A tecnologia ao serviço das pessoas.

Diretora em Portugal da Organização de Estados Ibero-Americanos (OEI)

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