TAP - Do capricho ideológico à propaganda 

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Numa operação de refinada propaganda, o ministro das Infraestruturas disse que "os resultados da TAP, que reportou lucros recorde de 203,5 milhões de euros até setembro, são "francamente animadores e dão boas perspetivas para a privatização". Muitas vezes, a primeira vítima da propaganda é a verdade.

O que João Galamba omite, é que a TAP SA (a reprivatizar) é para efeitos de mercado, o que o "banco bom" foi no BES. Por seu lado, a TAP SGPS (que procura esconder), é no quadro de uma cosmética que custa milhares de milhões de euros aos contribuintes, o equivalente do banco mau. Não é atirando o imenso "buraco" da companhia aérea para "debaixo do tapete", que o ministro altera a realidade, para desgraça de quem paga impostos.

Quando o plano financeiro e de reestruturação da TAP foi aprovado em 2021, a TAP SA foi expurgada da maior parte dos problemas, num expediente que lhe garantiu a capitalização e assegurou liquidez. E mal seria que, nestas condições, não houvesse expectativa de lucro. O problema é que, por esta via, a TAP SGPS perdeu o principal ativo - precisamente a TAP SA -, que passou a ser detida na totalidade pela Direção-Geral do Tesouro e das Finanças.

Acontece que, apesar de ter recebido uma parte do pacote público de ajuda ao grupo, a TAP SGPS está numa situação contabilística de falência técnica, com capitais negativos de perto de 1.3 mil milhões de euros.

Para que se perceba melhor, no universo da TAP SGPS ficaram a Portugália, a Careringpo, a Spdh (Groundforce) e os Cuidados Integrados de Saúde, que são ativos a alienar, para além da Manutenção e Engenharia (M&E) Brasil, que se encontra em processo de liquidação e trará garantidamente muitos mais prejuízos à empresa-mãe. Acrescem responsabilidades sobre o passivo financeiro remunerado, dívida e juros, da emissão obrigacionista de 120 milhões de euros subscrita em 2016 pela Azul (companhia brasileira de David Neeleman) e pela Parpública.

Significa que quando a privatização da TAP SA acontecer, os compradores ficarão com o filet mignon, provavelmente a preço de saldo, guardando-se os prejuízos para os contribuintes portugueses, por via do presente envenenado da TAP SGPS. Um ministro que tivesse uma relação mínima de verdade e boa-fé com os portugueses, nunca se permitiria deixar de considerar o quadro geral. O Governo, como se vê e ao contrário, prefere iludir e enganar com premeditação, por via da omissão.

O primeiro-ministro António Costa renacionalizou a TAP dizendo que era "fundamental para o país, como foram as caravelas", para decidir depois de novo a reprivatização, desbaratando pelo caminho milhares de milhões de euros dos contribuintes, naquele que foi o capricho ideológico mais caro da democracia portuguesa. Garantiu que "desde o início" ficou claro que "o Estado não ia permanecer ad æterenum com 100% do capital", para ser desmentido de seguida pelo ex-ministro Pedro Nuno Santos, acabando a dizer sem rebuço que se expressou mal.

Valha-nos que o Presidente da República tenha vetado o decreto do Governo relativo à reprivatização, pedindo a clarificação da capacidade de acompanhamento e intervenção do Estado numa empresa estratégica como a TAP, da questão da alienação ou aquisição de ativos e da transparência de toda a operação. Fez muitíssimo bem. Num contexto assim levianamente opaco, é o mínimo.

Líder do CDS-PP

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