Syntesia. A IA que cria pessoas digitais já vale mais de mil milhões

Empresa cujos avatares realistas já foram usados em vídeos de propaganda do regime da Venezuela para passar informação falsa é o mais recente unicórnio da Inteligência Artificial.
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A tecnológica britânica Syntesia tornou-se esta semana a mais recente empresa na área da Inteligência Artificial (IA) a atingir o estatuto de unicórnio, ao ultrapassar os mil milhões de dólares de capital, após uma ronda de investimento que conseguiu levantar mais 90 milhões de dólares. Os dois grandes interessados? A firma de capital de risco Accel e o gigante do vídeo digital NVIDIA.

O interesse de um nome como a NVIDIA revela bem o potencial que o mercado encontra nesta startup. A Syntesia cria "pessoas digitais" ultrarrealistas, que dizem em vídeo aquilo que o utilizador escrever para elas dizerem. E por um preço módico.

No pacote básico, individual, por 26 euros por mês, qualquer pessoa pode escolher entre mais de 90 avatares, criados de forma a parecerem pessoas de diversas origens, extratos, etnias, etc., e em poucos minutos, criar um vídeo de qualidade profissional.

Para ajudar, existem 65 templates, que vão desde explicadores a demonstrações de produto, passando por clips pensados especialmente para redes sociais.

O avatar escolhido dirá o texto que se escrever para ele, em qualquer das 120 línguas suportadas.

O software inclui ainda uma plataforma de edição para fazer todos os cortes e ajustes necessários e, por fim, exportar o vídeo em alta definição (em .mp4) para ser utilizado em qualquer plataforma, do YouTube ao Facebook ou até na televisão.

Existe ainda uma subscrição para empresas, corporativa, que permite um nível de personalização muito superior, desde a criação de cenários até à geração de um clone digital de uma ou mais pessoas, consoante se esteja na disposição de pagar.

Mas mesmo no pacote básico, e no estado de desenvolvimento que o software se encontra - literalmente a dar os primeiros passos - as criações da Syntesia são já capazes de enganar (pelo menos à primeira vista). Aumentam assim os receios de que surjam cada vez mais casos de vídeos falsos, com pessoas que não existem em situações inexistentes ou, numa forma mais avançada, com a utilização da imagem de alguém real de forma abusiva - os chamados deep fakes.

O mais recente caso conhecido de utilização abusiva da tecnologia da Syntesia ocorreu com o regime venezuelano liderado por Nicolás Maduro.

Foram detetados num canal do YouTube (intitulado House of News) vídeos em que "jornalistas", que na realidade eram avatares digitais, reportavam histórias (falsas) sobre a crise económica do país - dizendo não ser tão grave quanto na realidade é - ou acusando opositores do regime de estar envolvido num escândalo financeiro superior a 150 milhões de euros.

Após a descoberta, em fevereiro, a Syntesia afirma ter cancelado as contas utilizadas para criar os vídeos, tendo um porta-voz afirmado ao Financial Times: "Temos regras muito rígidas quanto ao tipo de conteúdo que pode ser criado na nossa plataforma. Aplicamos os nossos termos de serviço e banimos todos os que os violem".

O problema, muitas vezes, é que, até à deteção, o mal já está feito. Semanas antes deste caso com a Venezuela foram também descoberto vídeos semelhantes a defender o regime da ditadura militar do Burkina Faso, bem como alguns vídeos de "notícias"pró-china que correram nas redes sociais foram criados naquela plataforma.

Na utilização regular, as potencialidades desta ferramenta são enormes - ainda que possa tirar alguns empregos a atores ou mesmo jornalistas de TV. Mais uma artéria do debate da IA que não irá terminar tão cedo.

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