Supernanny: SIC não identifica família do terceiro episódio
No final do segundo episódio do programa Supernanny, emitido a 21, foram mostradas imagens de uma família, com três filhos -- dois rapazes de uns oito e cinco anos e um bebé - apresentada como protagonista do episódio seguinte. Mas, ao contrário do que sucedeu anteriormente, no site do programa não existia, até às primeiras horas de hoje, qualquer teaser autónomo sobre o próximo episódio identificando essa família, mesmo se a SIC continua a promover o programa na emissão, anunciando-o para domingo (mas só com imagens de Teresa Paula Marques). O DN questionou o canal sobre esta alteração no modus operandi, mas este não respondeu às perguntas.
Entretanto, na terça-feira, os pais do segundo episódio foram convocados pela Comissão de Proteção de Crianças e Jovens de Sintra, a sua área de residência. Ao contrário do que sucedeu com os pais da menina de sete anos que apareceu no primeiro episódio, estes não quiseram associar-se à Proteção de Menores na solicitação da retirada das imagens das crianças, posição que aliás já haviam anunciado em entrevista à SIC, passada durante o debate que a estação organizou sobre o Supernanny.
A não identificação da terceira família pela SIC pode ser uma forma de tentar evitar a ação antecipada da Proteção de Menores, já que esta não conhece a identidade de todas as famílias que foram filmadas para os sete episódios desta temporada do Supernanny. Recorde-se que tanto no caso do primeiro episódio como no de outra família cujo episódio ainda não foi emitido, houve familiares das crianças que se dirigiram, preocupados, à Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens por as terem reconhecido nas 'promos' que a SIC pôs no ar e no site do programa, iniciando assim o processo de promoção e proteção dos menores em causa.
O que, precisamente, ainda se encontra no site do programa são as imagens da menina do primeiro episódio, tanto no programa completo como em teasers - cuja eliminação a CPCJ de Loures e os pais requereram à SIC. Esta, recorde-se, respondeu não reconhecer à Proteção de Menores legitimidade para efetuar o pedido. A recusa de retirar as imagens valeu à empresa um inquérito crime por desobediência, anunciado na quarta-feira pelo MP.
"Filhos não são coisas dos pais"
A SIC deverá tentar fazer valer, em sua defesa, os termos dos contratos assinados com os pais das crianças, os quais autorizam a utilização das imagens em várias plataformas. Ao que o DN conseguiu saber, os contratos não contêm qualquer cláusula prevendo a possibilidade de mudança de ideias dos pais. Mas há entendimentos jurídicos no sentido de estes contratos poderem ser considerados nulos, por neles os progenitores disporem de algo, o direito à privacidade e dignidade dos filhos, que não está na sua livre disponibilidade.
Algo que, num acórdão de Junho de 2015, o Tribunal da Relação de Évora deixa claro, afirmando ser "uma obrigação dos pais, tão natural quanto a de garantir o sustento, a saúde e a educação dos filhos", a do "respeito pelos demais direitos, designadamente o direito à imagem e à reserva da vida privada".
E prossegue: "Na verdade, os filhos não são coisas ou objetos pertencentes aos pais e de que estes podem dispor a seu belo prazer. São pessoas e consequentemente titulares de direitos. Se por um lado os pais devem proteger os filhos, por outro têm o dever de garantir e respeitar os seus direitos. É isso que constituiu o núcleo dos poderes/deveres inerentes às responsabilidades parentais e estas devem ser sempre norteadas, no "superior interesse da criança", que se apresenta, assim, como um objetivo a prosseguir por todos quantos possam contribuir para o seu desenvolvimento harmonioso: os pais, no seu papel primordial de condução e educação da criança; as instituições, ao assegurar a sua tutela e o Estado, ao adotar as medidas tendentes a garantirem o exercício dos seus direitos e a sua segurança."
Levanta-se ainda uma outra questão: a de saber se, uma vez que os pais da criança retratada no primeiro episódio revogaram a sua autorização ao solicitar, associando-se à CPCJ de Loures, a retirada das imagens da filha do domínio público, a SIC, ao mantê-las, não está a incorrer no crime de "Gravações e fotografias ilícitas" (artigo 99º do Código Penal), que prevê pena de prisão até um ano para quem, contra a vontade do retratado, "utilizar ou permitir que se utilizem fotografias ou filmes, mesmo que licitamente obtidos."