Sócrates e um ponto final na "exceção"
José Sócrates foi detido no aeroporto de Lisboa, em novembro de 2014. O ex-primeiro-ministro foi constituído arguido no âmbito da Operação Marquês. Esteve dez meses em prisão preventiva. Saiu em setembro de 2015 do Estabelecimento Prisional de Évora. Neste ano e meio já foi dilatado o prazo para a investigação. Os advogados de Sócrates garantiam já se ter esgotado o limite imposto pela procuradora-geral da República, mas a espera prometia prolongar-se até ao final da semana para saber se a acusação ia ou não ser deduzida.
O suspense quebrou-se ontem. Os magistrados titulares do processo vieram de novo pedir a Joana Marques Vidal uma dilatação do prazo, mais dois meses, para investigar novos factos ligados a outros processos em que, alegadamente, estariam cruzados com a Operação Marquês. A procuradora tinha dito que só admitiria mais tempo de investigação a "título muito excecional". Mas há poucos dias lembrou o caso Madoff, cuja investigação se prolongou vários anos nos Estados Unidos, para contrariar a ideia de que a Justiça portuguesa está a demorar demasiado tempo a lidar com um processo como este.
A quem não está por dentro do processo é difícil dizer se é tempo a mais ou a menos para investigar alegados crimes de corrupção e fraude fiscal. Um puzzle destes é complexo, mas quem mandatou a detenção de José Sócrates, a medida de coação mais grave de todas, por "indícios fortes", devia estar seguro de que tinha provas suficientes, há dois anos, para vir produzir uma acusação sólida.
Os magistrados pedem agora mais tempo para concluir o inquérito. E a procuradora terá outro remédio senão abrir a "exceção"? Joana Marques Vidal dificilmente poderá recusar o que os procuradores lhe pedem - e se recusar o processo fica na terra de ninguém -, mesmo correndo o risco de perpetuar a ideia de que a Justiça em Portugal é lenta e atropela os direitos dos arguidos. Mas desta vez será de exigir à procuradora que fixe uma data e não abra mais "exceções" para prolongar o processo.
Por envolver um ex-primeiro-ministro, este é, talvez, o caso mais melindroso com que a Justiça lidou. E a exposição de José Sócrates é a exposição da Justiça portuguesa, que também acabará por ser julgada, mais do que já está a ser. Se houver falhas na acusação - e a hipótese de não existir ainda se tornou mais remota com este pedido do prolongamento do prazo de investigação - seria uma machadada muito séria na credibilidade da Justiça. Que, além da Operação Marquês, está a braços com outros casos bem complexos.