Socorro, o meu filho tem medo da escola

Parece um capricho de criança. Mas não é. Aquela dor de barriga que surge todas as manhãs pode ter um nome. A fobia escolar, que, segundo alguns estudos, atinge cerca de um a cinco por cento dos estudantes nos países ocidentais, é um caso de estudo para os pais. Saiba como reconhecer os sintomas.<br /><br />
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Todas as manhãs o mesmo drama. Uma dor de barriga repentina, um ataque de choro e uma desculpa - nem sempre «esfarrapada» - para não ir à escola. Do outro lado da barricada, uns pais à beira de um ataque de nervos porque o filho teima em ficar em casa. Um cenário que quase se confunde com uma birra de criança. No entanto, estas situações repetidas dão pelo nome de fobia escolar, uma síndrome que afecta entre um e cinco por cento das crianças em idade escolar.
Segundo a Associação para a Fobia Escolar (AFE), com sede em França, os estudantes sentem «uma terrível angústia associada à instituição de ensino (escola ou universidade)». Esta síndrome, que «geralmente afecta os adolescentes, também pode atingir crianças mais pequenas». Para João Lopes, docente na Escola de Psicologia da Universidade do Minho, esta fobia caracteriza-se pelo «evitamento sistemático da escola». De acordo com o psicólogo, «a razão do medo é a aproximação do objecto» - neste caso particular, a escola.
Na perspectiva da AFE, a fobia escolar é distinta da ansiedade de separação (típica da criança no jardim-de-infância) ou do absentismo ou abandono escolar. «É uma fobia real em relação à instituição de ensino.» O medo de enfrentar a escola manifesta-se, normalmente, por ataques de ansiedade ou pânico e crises de choro. «A ansiedade pode ser identificada através de reacções psicológicas ou físicas: dor abdominal, náuseas, diarreia, dores de cabeça, suores e ritmo cardíaco acelerado», refere o site da AFE (http://phobie-scolaire.wifeo.com).
De acordo com João Lopes, a reacção das crianças ou jovens não é padronizada. Contudo, em causa estão habitualmente «manifestações psicossomáticas fortes». Mas para os pais nem sempre é fácil entender a origem do problema, já que, regra geral, a criança esconde ou reprime o motivo da fobia. «Em caso de abuso de outros colegas ou devido a um mau relacionamento com um professor, a criança tenta camuflar a verdadeira razão para não ir à escola, porque tem medo de retaliação», adianta este especialista.

Capricho ou cisma?
Para João Lopes, o comportamento das crianças que sofrem de fobia escolar raramente poderá ser um mero capricho pessoal. «A escolaridade é universal e uma criança que não vá à escola terá invariavelmente de passar o dia todo sozinha. A instituição de ensino acaba por funcionar como um local de socialização. E quando este padrão é afectado é porque algo está errado. Mas haverá quase sempre uma razão para que isso aconteça.»
A ideia de ir à escola pode causar tremor e provocar insónias na criança. «Em casos mais graves, a fobia escolar pode conduzir à automutilação, depressão, tentativas ou concretização do suicídio», escreve a AFE. «Se a fobia for uma situação continuada, provavelmente, a criança terá um sentimento de impotência, que desperta variações de humor, irritabilidade, tristeza e pode arrastar para a depressão», corrobora João Lopes.
«Numa fase inicial, o jovem chega atrasado à escola e, para não assistir às aulas, desdobra-se em desculpas para voltar para casa. Após uma série de ausências, a criança ou jovem sente-se incapaz de voltar para a sala de aula. É nesta fase que se recusa a sair de casa e até de se levantar da cama, durante a manhã. Chega a renunciar ao lazer. Deixa de ver os amigos e entra num beco de isolamento», esclarece a AFE.
«Este comportamento reflecte um sofrimento emocional forte que rapidamente perturba o equilíbrio da esfera familiar. Os pais tentam encontrar estratégias (através de manifestações de carinho, negociação ou ameaças) para convencer o jovem a regressar à escola. Mas, por vezes, as tentativas revelam-se frustradas. A criança sente-se num ponto sem retorno e incapaz de regressar ao ambiente escolar», defende a associação.
Segundo João Lopes, os pais devem sempre tentar «apurar o motivo da recusa». O psicólogo indica que os progenitores não devem cair no erro de exercer demasiada pressão sobre a criança, ao ponto de a forçar a ir à escola, principalmente numa fase em que a causa ainda não foi detectada. No caso de fracasso, o passo seguinte é procurar ajuda especializada - um psicólogo ou pedopsiquiatra. «As fobias escolares têm uma razão, quase sempre lógica, que origina estes comportamentos», refere.
Há situações em que a criança, por incapacidade de lidar com as tarefas académicas, se refugia em casa, para não enfrentar a escola e o motivo da frustração. «A origem da fobia varia de indivíduo para indivíduo. Mas geralmente existe um medo excessivo de falhar, o receio de um professor ou problemas relacionais com os seus pares», indica a AFE. Esta associação reforça a ideia de que os pais e educadores devem estar atentos a alguns sinais suspeitos, já que, «uma vez detectada, a fobia escolar deve ser tratada por um especialista».

Graus de gravidade
De acordo com João Lopes, «há quem distinga a fobia escolar do tipo I (aguda) de uma fobia do tipo II (crónica)». No primeiro caso, a fobia tem uma maior incidência «nos três primeiros anos de escolaridade (entre os 5 e os 8 anos)» e o prognóstico nestas situações é «mais favorável». Já a fobia do tipo II «ocorre mais frequentemente entre os 10 e os 13 anos», acarretando «problemas mais graves» e um diagnóstico menos favorável.
 «A fobia de tipo I tende a ocorrer subitamente como resposta a um acontecimento adverso na escola (problemas académicos, dificuldades de relacionamento com os colegas, com os professores, medo de ser exposto ao ridículo, abuso, entre outros). Estas crianças, ao serem excessivamente dependentes dos pais, tentam manipulá-los para que estes não os pressionem a ir para a escola - tarefa, aliás, na qual são bem sucedidos», fundamenta o psicólogo.
Na resolução desta síndrome, as «abordagens comportamentais ou intervenções familiares breves são bem sucedidas em setenta a noventa por cento dos casos». «A fobia de tipo II é menos súbita e tem uma progressão lenta e insidiosa - a ansiedade tem uma base mais familiar e liga-se menos directa e claramente à escola. Nestes casos a taxa de sucesso da intervenção não ultrapassa os cinquenta por cento e o seguimento tende até a mostrar taxas menos favoráveis.»

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