Sobreviventes preferem desarmamento a desculpas de Obama
Os sobreviventes da bomba atómica lançada sobre Hiroxima admitem que um pedido de desculpas por parte do presidente americano Barack Obama seria bem-vindo, mas a sua prioridade é livrar o mundo de armas nucleares para sempre.
Obama, que em 2009 recebeu o Nobel da Paz em parte por ter colocado a luta contra a proliferação nuclear na sua agenda, torna-se hoje o primeiro presidente dos Estados Unidos a visitar Hiroxima, alvo da primeira bomba atómica, lançada pelos americanos sobre a cidade japonesa a 6 de agosto de 1945.
A cidade de Nagasaki foi bombardeada três dias depois, levando à rendição do Japão e ao fim da Segunda Guerra Mundial no Pacífico.
Obama segue para Hiroxima depois de participar na cimeira do G7 em Tóquio. Esta visita à cidade foi longamente debatida na Casa Branca, com receios de que fosse criticada nos Estados Unidos caso fosse vista como um pedido de desculpas pelo passado.
A maior parte dos japoneses sente que os bombardeamentos de Hiroxima e de Nagasaki foram injustificados. Muitos nos Estados Unidos afirmam que os bombardeamentos encurtaram a guerra e salvaram as vidas de muitos militares de americanos.
Terumi Tanaka, nascido em Nagasaki e com 13 anos no momento em que a bomba caiu, garantiu à Reuters que um pedido de desculpas pelo sofrimento humano causado seria bem-vindo. Apesar de ter saído incólume da explosão, Tanaka tem ainda bem presente na memória como na altura deambulou pela cidade enegrecida à procura de familiares nas pilhas de corpos. "Gostaríamos de ouvir um pedido de desculpas àqueles que perderam as vidas, àqueles que perderam entes queridos, aos pais que perderam os filhos", disse em conferência de imprensa o homem que lidera uma organização de sobreviventes dos bombardeamentos.
Mas insistir num pedido de desculpas mais alargado pode interferir com o objetivo final, que é o desarmamento nuclear, explicou. "O sentimento mais forte entre os sobreviventes é que isto não se pode tornar uma barreira no caminho para o desarmamento nuclear", disse Tanaka.
A bomba largada sobre Hiroxima matou milhares de pessoas de imediato e outras 140 mil até final do ano. Em Nagasaki morreram 27 mil pessoas logo na explosão e cerca de 70 mil perderam a vida até final do ano.
O Japão rendeu-se seis dias depois de a segunda bomba cair sobre Nagasaki.
Toshiki Fujimori, que era um bebé às costas da mãe quando a onda de choque provocada pela bomba os derrubou, afirmou sentir que estão a ser feitos esforços para desvalorizar um pedido de desculpas antes da visita de Obama. "O que quero dizer é que tem havido pressão para criar um ambiente que favoreça a visita dele", explicou Fujimori, recusando fornecer mais pormenores.
O governador de Hiroxima, Hidehiko Yuzaki, garantiu por seu lado que a visita de Obama está a despertar todo um vasto leque de sentimentos nos sobreviventes, mas que a maior parte coloca a esperança no desarmamento nuclear em primeiro lugar. "O seu maior desejo é que mais ninguém passe pelo mesmo que eles", disse à Reuters. "E para o conseguir estão dispostos a pôr a questão do pedido de desculpas de parte."
"Riscos reais"
Ontem, à margem da cimeira do G7, Obama sublinhou que a sua presença hoje em Hiroxima deverá chamar a atenção para "os riscos muito reais" das armas nucleares. "O lançamento desta bomba atómica foi um ponto de viragem da história moderna", disse Obama à AFP. "É algo que temos de gerir, de uma maneira ou de outra."
Se as armas nucleares "já não ocupam o primeiro plano nos nossos espíritos como acontecia durante a Guerra Fria", a eventualidade de um "acontecimento nuclear permanece nos pensamentos mais profundos", afirmou.
A Coreia do Norte é, neste domínio, a nota mais perturbadora do desanuviamento da ameaça nuclear, e Obama fez questão de sublinhá-lo. "A Coreia do Norte é uma grande preocupação para todos nós", afirmou o chefe do Estado norte-americano.
"Não é necessariamente o que oferece mais risco imediato. [Mas] quando temos um regime tão instável, que está tão isolado, isso proporciona o tipo de risco a médio prazo a que temos de dar muita atenção", acrescentou Obama.
Na assistência hoje em Hiroxima estarão pelo menos três sobreviventes do bombardeamento para ouvir o presidente dos EUA.
Jornalista da Reuters, Tóquio