Sobre Pedrógão, nada a dizer

Publicado a
Atualizado a

Ou melhor: tanto, que é melhor nem dizer muito. O que não falta por aí são opiniões. Boas, más, assim-assim, "avalizadas" ou amadoras, não interessa. Milhares, milhões de palavras a circular por todo o lado, ditas, escritas, etc. E de tudo sobram dois sentimentos: horror e impotência. Há décadas que ouvimos falar da "reforma da floresta", do "desordenamento", dos proprietários pobres, velhos e isolados que não têm como manter limpo o seu pedaço de floresta. E do problema da coordenação dos bombeiros, da ausência dos aviões da Força Aérea, do escândalo nojento dos Kamov, do Exército que se calhar podia fazer mais para ajudar. Lamento dizer: mesmo que esteja politicamente algo a ser feito, demorará muitos anos a ter efeito. Sessenta e dois (ou mais) mortos e centenas de vidas devastadas não vão mudar nada. Se calhar, o melhor mesmo era entregar a floresta à indústria do papel. Toda. Garanto que haveria ordenamento; e fogos devidamente organizados; e rendimento seguro para os proprietários. No curto-prazo, sacrifique-se a ministra da Administração Interna. Não resolve nada mas alivia.
Mudemos de assunto. Assalta-me a sensação de que está a agravar-se a mania dos políticos nos tratarem a todos como se fôssemos estúpidos. Estou a falar, neste caso, da decisão de candidatar Lisboa a sede da Agência Europeia de Medicamentos. Através de uma fonte próxima, o primeiro-ministro quis construir uma narrativa sobre o seu próprio papel. É assim: "Eu até queria o Porto, mas os técnicos foram a Londres em fevereiro e disseram-me que não era possível." Como o DN reconstituiu, quando esses "técnicos" (o ministro da Saúde e a secretária de Estado dos Assuntos Europeus) foram a Londres, em fevereiro, já estava mais que decidido que Lisboa seria a cidade candidata. Verdadeiramente, nem há nenhum documento governamental que prove que o Porto foi alguma vez considerado. Mas depois o Porto começou a berrar (tarde, mas alto). E estamos a meses das autárquicas. E o PS local não podia deixar Rui Moreira sozinho com essa bandeira e virou o bico ao prego em relação ao que tinha votado no Parlamento. E o Bloco foi atrás e o CDS também e ainda o PSD - enfim, todos esforçando-se para serem os melhores a dar o dito por não dito (menos o PCP e o PEV, honra lhes seja). Costa, capaz de aprender na passada, acionou o Plano B. Afinal o Porto vai ser considerado. Mas - como já tinha acontecido com a história do secretário-geral das "secretas" - fê-lo demons-trando uma notável capacidade para nunca dar a cara pelo seu próprio erro. Um artista, dirão os admiradores. No campeonato da carapauzice de corrida não há como ele.

Artigos Relacionados

No stories found.
Diário de Notícias
www.dn.pt