Sobre o Talento… ou seja, pessoas disponíveis para produzir

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Vamos escrever de outra forma, para ver se o storytelling faz um eco melhor. Há um claro desalinhamento entre procura e oferta de talento. Isto vem sendo avisado por quem precisa do talento - as empresas - há muitos anos:

1. Vale a pena refletir sobre o número de talentos "produzidos" para áreas mal pagas, ou sem emprego versus áreas de alta empregabilidade. Basta ver os numerus clausus de acesso às respetivas escolas/universidades;

2. Nas famílias também vale a pena refletir se a motivação deve ir no sentido de produzir doutores desempregados -ninguém fora deste nosso quintal à beira Atlântico entende bem o estatuto à portuguesa da Dra. e do Engº -ou de produzir técnicos especializados bem pagos;

3. E não, não há problema de produzirmos talento com know how que pode ser aplicado no mundo inteiro, correndo o risco de sair:

a) O que observamos no terreno é que essas pessoas mais tarde querem voltar para Portugal;

b) Podemos retê-los com medidas fiscais inteligentes de forma que não saiam até terem filhos: esse é um trigger relevante para abdicarem de viver lá fora com condições melhores. Além disso é o que fazemos com os impostos dos emigrantes/expatriados que ficam cinco anos fora do país e depois retornam. Porque não fazê-lo com a retenção de jovens?

4. Porque não acelerar - ainda mais - programas como o UPskill que transformam pessoas de áreas de formação de baixa empregabilidade em profissionais qualificados para algumas das áreas que têm alta procura de "cérebro-de-obra", em apenas poucos meses? E porque não fazer o mesmo para profissionais tecnicamente especializados sem necessidade de formação superior? - mão de obra -... bastaria perguntar às empresas quantas pessoas são necessárias e desenvolver um programa multi-anual de reconversão... um "basta" metafórico, claro!

Reflexões rápidas e simples pelo lado da "produção" de talento, de quem trabalha num grupo que mantém permanentemente 350 posições de trabalho por preencher - só em Portugal - e em que algumas profissões têm um salário médio duas vezes superior ao salário médio nacional.

... é um ponto onde podemos juntar a razão - desenvolvimento económico - e o coração - criação de emprego bem pago - criando melhores condições de vida a mais pessoas.

E há depois os impactos diretos para as empresas que precisam dos serviços de algumas destas pessoas cujas competências escasseiam no mercado:

• as organizações - públicas e privadas - vão ter um enorme desafio de budget para fazer acontecer os seus projetos: os preços dos projetos vão disparar - nos casos de empresas bem geridas - da área tecnológica;

• perguntarão: mas se os preços vão subir, essas empresas vão reduzir atividade? Negativo...

• as empresas são forçadas a subir os salários que estão a disparar, e por isso vão vender as suas soluções/serviços a entidades que pagam mais. Essas entidades são muitas vezes internacionais. Portugal tem um bom track-record de internacionalização nestas áreas;

• as pessoas vão procurar as empresas que pagam níveis salariais adequados, as empresas vão procurar os clientes que pagam mais - a internacionalização irá provavelmente crescer - e os salários nas áreas tecnológicas vão alinhar mais com os níveis da Europa - para não falar de alinhamento com salários americanos, que estão num nível ainda superior;

• isto quer dizer um curto prazo - dois a três anos - brutal para empresas e pessoas, e quer dizer que as organizações portuguesas - privadas e públicas - têm que decidir: 1. executar projetos com preços atualizados;ou, 2) não executar projetos, atrasando o seu caminho de transformação digital/cognitiva.

No médio prazo - cinco a dez anos - as tecnológicas de Portugal devem refletir se continuam a vender horas a metro para fora, ou se trabalham diretamente para os clientes finais, trazendo para Portugal o EBIT completo de cada projeto/solução/serviço produzido. Aqui devemos trabalhar no sentido do valor acrescentado, da diferenciação, da boutique e não do hipermercado, da especialização e não da generalização... da Marca e não da Produção!

Neste contexto, todas as partes - Empresas, Estado, Associações empresariais e, claro, o Talento - são chamadas a detalhar: 1) um plano de execução e ação; 2) meios e pessoas;3) objetivos claros; e, 4) KPIs a medir, para concretizar isto!

Pensar e teorizar sem fazer dig deep nestes quatro pontos, é ver passar o tempo e contar que daqui a dez anos, estamos exatamente na mesma!

Sobre o Talento - pessoas disponíveis para produzir - é isto, dito aqui de outra maneira!

Pedro Afonso é o CEO da VINCI Energies Portugal.

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