Sindicatos esperam aumentos acima de 0,4%, mas já pensam em ações de luta
Os sindicatos da administração pública conhecem nesta segunda-feira a proposta negocial para aumentos na função pública no próximo ano. A discussão corre em calendário-relâmpago para ficar fechada já na quarta-feira, e surge à partida limitada pela intenção do Ministério das Finanças de conter subidas na inflação "que hoje se observa" (estava em 0,4% até outubro), possibilidade que já foi considerada "um insulto" pelas estruturas que esperam recuperação do poder de compra dos trabalhadores naquela que será a primeira atualização de salários desde 2009.
Em abril, o governo reservava no Programa de Estabilidade uma margem de 95 milhões de euros para subidas e novos recrutamentos, com mais 527 milhões destinados a promoções e progressões em resultado do termo do processo de descongelamento de carreiras que se conclui neste mês, com encargos para o próximo ano. Aumentos mais expressivos só em 2021, ano em que o plafond para atualizações atinge os 205 milhões de euros nas contas do ministro Mário Centeno. Sobe aos 386 e 307 milhões de euros em 2022 e 2023, respetivamente.
As expectativas dos sindicatos, porém, são de que se possa ir mais longe em 2020. As reivindicações partem dos 3% pedidos pelo Sindicato dos Técnicos do Estado (STE) e 3,5% reivindicados pela Federação de Sindicatos da Administração Pública (Fesap), chegando a uma proposta de aumento em 90 euros para todos os trabalhadores exigido pela Frente Comum.
O secretário-geral da Fesap, José Abraão, ainda acredita que o governo deverá pôr na mesa um aumento de ordem maior do que a inflação deste ano. "Não há razão nenhuma para que se inverta a tendência de negociação com base na inflação previsível, por mais baixa que seja, incluindo ainda alguns ganhos de produtividade e recuperação de poder de compra. São expectativas realistas. Não queremos tudo de uma vez. Queremos é compromissos que produzam resultados já em 2020 mas também nos anos subsequentes."
O nível de inflação esperado pelo governo em 2020, de acordo com a proposta levada a Concertação Social para aumento do salário mínimo, é de 1,4%. Caso sirva de referencial para aumentos, deixará ainda os trabalhadores numa perda real média de poder de compra que andará acima dos 10% após dez anos sem aumentos.
Por isso, também o STE espera mais. "A atualização ao nível da inflação é uma atualização nominal e é uma perda real de remuneração. É legítimo que esperemos uma negociação séria no sentido de que se faça um esforço para que não seja assim", defende a presidente Maria Helena Rodrigues.
Já a Frente Comum confessa as "expectativas muito más" para a reunião que decorre nesta tarde e revela ter já marcada para dia 19 uma reunião para decidir ações de luta caso se verifique o pior cenário. "Tanto quanto sabemos, pode nem sequer ser 0,4%", afirma a coordenadora Ana Avoila, a admitir mesmo ausência de atualizações. "Vamos ver o que sai dali."
Se para o próximo ano o governo prometeu subir salários de forma generalizada, ainda que não de forma expressiva, a opção em 2019 foi a de limitar as subidas às remunerações mais baixas num encargo limitado por Mário Centeno a um máximo de 50 milhões de euros de despesa. O nível de entrada na função pública, aplicado às carreiras com menores vencimentos (assistentes operacionais), passou dos 580 euros aos 635,07 euros, deixando de estar ligado à evolução do salário mínimo - que, entretanto, sobe aos 635 euros no próximo ano.
A Fesap mantém nas reivindicações a exigência de avançar mais um patamar, para que o governo faça neste ano chegar as remunerações mais baixas aos 683,10 euros - o que implicaria a reformulação mais global da tabela de remunerações.
São mais as pretensões dos diferentes sindicatos, incluindo matérias como a recuperação de 25 dias de férias na função pública, o alargamento da ADSE aos trabalhadores com contrato individual de trabalho ou a revisão do regime de avaliação dos trabalhadores, o SIADAP. Mas, para já, o novo Ministério da Modernização do Estado e da Administração Pública, liderado por Alexandra Leitão, pretende fixar a discussão desta semana nas matérias com impacto no Orçamento do próximo ano. Outras discussões são reservadas para o futuro, em data em aberto.