Sim, a vacinação está a correr bem
Nesta semana, soubemos que Portugal, comparando com os restantes países que também estão a ter ações de vacinação em massa, está a fazer um bom trabalho.
Como em todos os pontos de análise a esta pandemia, o balanço deve ser feito no fim. Mais que não seja para se evitar discussões conjunturais espúrias. Claro que isso não pode impedir que se critiquem medidas e comportamentos conforme vão acontecendo e alguns desses têm ajudado a melhorar a situação. Infelizmente, a maioria são apenas ruído ou tentativa de capitalizar politicamente ou em popularidade a terrível situação em que vivemos.
Seja como for, e parece que para infelicidade de alguns, o processo de vacinação em Portugal está a correr bem - por enquanto e no que diz respeito às variáveis que podemos controlar.
Não tem sido, porém, esse o destaque que tem sido dado. Aparentemente, os media e várias pessoas com voz no espaço público descobriram que os portugueses estão longe de ser perfeitos. Há mesmo sacanas que se aproveitam dos seus poderes em proveito próprio. Maior surpresa, há mesmo coisas impossíveis de planear. E, pelos vistos, também se achou possível que um processo deste gigantismo, que nunca foi feito, pudesse decorrer sem muitos problemas.
Nem sequer as notícias de fundo de página que nos contam que exatamente os mesmos problemas estão a acontecer em países que se apresentam muitas vezes como exemplo conseguiram refrear o aparente espanto de não estar tudo a correr na mais absoluta perfeição.
Importa explicar uma coisinha que não devia merecer explicação. Sim, devem ser noticiadas e expostas as situações irregulares; sim, são precisas coimas ou penas, se possível, muito elevadas para os prevaricadores. Uma coisa, porém, é fazer tudo isto, outra, completamente diferente, é passar a imagem de que as exceções são a regra e que o plano de vacinação está a colapsar por causa das vigarices que foram, e bem, descobertas.
Convenhamos, uma vacina que seja aplicada a alguém fora do sistema definido seria sempre condenável, mas dizer que 340 num universo de mais de 380 mil já aplicadas é a prova de que reina a desordem e o caos é capaz de ser, no mínimo, exagero. E, note-se, dessas 340 vacinas, parte não foram vigarices, mas situações de sobras que em várias situações são impossíveis de regulamentar.
Não é que não vivêssemos já num ambiente de criação de perceções erradas (não, não vivemos num país minado pela corrupção e, não, as nossas instituições não estão destruídas e, também não, o compadrio não está generalizado) e com casos relevantes reais graves. O ambiente é tóxico, bem o sabemos. Mas num cenário em que o acesso a um bem escasso e extremamente importante está em causa, os cidadãos estão ainda mais disponíveis para acreditar que há um ambiente generalizado de compadrio e corrupção se aparecerem uma dúzia de bandalhos a praticar vilanias. E escusado será dizer que quem faz vida de vender o "tudo a gamar" e o "vivemos num Estado corrupto" tem aqui uma oportunidade que não está a, nem irá, desperdiçar.
Claro que, sabendo que vivemos num clima deste género, deve haver ainda maior cuidado em não ajudar quem, pelos vistos, quer criar o caos. Punir violentamente quem comete fraudes e evitar decisões duvidosas como aconteceu com algumas opções em termos de prioridade de algumas entidades públicas.
No entanto, deixar que as anomalias, infelizmente normais, se tornem à luz das pessoas como imagem da situação em geral é um verdadeiro crime contra a comunidade.