Sete dias, sete continentes e sete maratonas. É este o desafio que espera o português João Neto, de 52 anos, gestor no ramo das telecomunicações que descobriu nas corridas de longa distância, e em condições adversas, uma forma de alcançar objetivos e de superar-se ao nível pessoal..João Neto será o primeiro português a participar na World Marathon Challenge, que começa a 31 de janeiro de 2019, apenas cinco anos depois de ter corrido a primeira maratona, aos 47 anos. Nesta meia década, já correu praticamente em todo o planeta. De início o objetivo era atingir um "marco" que agora parece simples: realizar uma maratona. Ao DN, explicou como chegou até aqui.."Comecei a correr sensivelmente com 47 anos e na altura o objetivo era fazer uma maratona, chegar a esse marco e depois terminar. Fiz uma, correu bem e gostei, e corri a segunda logo nos EUA, em Nova Iorque. Depois candidatei-me à World Marathon Major, que é composta pelas principais maratonas do mundo (Nova Iorque, Boston, Chicago, Tóquio, Berlim e Londres), e terminei na de Boston, já em abril deste ano", começou por explicar..O gestor de profissão entrou depois na "fase das ultramaratonas de trail" (já fez duas) e resolveu mais tarde aventurar-se em sítios pouco conhecidos pelas condições ideais para a corrida. "Corri no polo norte, em abril de 2017, e depois fui aceite na maratona da Antártida. Consegui fazer as duas em seis meses", disse. Depois das adversidades dos polos do planeta, João Neto correu uma maratona num quinto continente diferente, "em Marrocos, no mês de janeiro"..A ideia, segundo o atleta amador, era "fazer um grand slam", ou seja, "correr os sete continentes e o polo norte". "É um feito interessante e que, por acaso, um português já tem. Quando fui inscrever-me para o meu sexto e sétimo continente, deparei-me com a World Marathon Challenge e falei com eles. Tinha um currículo que me dava entrada direta e já que tinha de fazer mais dois continentes, achei que da mesma forma conseguiria acabar o grand slam e fazer os sete continentes numa semana, que é fazer parte do Intercontinental Members. É a primeira vez que Portugal vai estar presente", frisou.."Candidatei-me para ficar num grupo restrito de atletas a nível mundial, que completaram o World Marathon Major, os polos norte e sul, o grand slam mundial e uma intercontinental. É basicamente isto, além de que é uma prova que acontece uma vez na vida, porque é muito cara e exige muita preparação", concluiu sobre o tema. De acordo com o site da prova, a participação nesta prova custa entre 35 e 36 mil euros.."Aproveitar uma prova com este simbolismo para tentar ajudar alguém".João Neto aproveitou o enorme desafio que o espera para acrescentar mais alguma coisa à participação na prova de sete dias, associando-a a uma causa solidária. Neste caso, o atleta de 52 anos tenta angariar fundos para a associação Acreditar, com o objetivo de ampliar a Casa de Lisboa, situada em frente ao IPO de Lisboa, e que aloja de forma gratuita famílias de jovens e crianças com cancro. A ideia concreta é aumentar o número de quartos, de 12 para 32.."A ideia foi minha e surgiu por uma razão. Eu sou voluntário na Comunidade Vida e Paz, junto dos sem-abrigo, e entretanto pensei qual seria a associação que estaria mais necessitada. Uma coisa que me toca bastante, e que nenhum de nós pode controlar, é o cancro. E achei que deveria aproveitar uma prova com este simbolismo e dimensão para tentar ajudar alguém. O que fiz não foi pedir dinheiro para mim. O dinheiro que conseguir fica na íntegra para a associação e para ajudar essas pessoas", explicou.."Chegar, correr, viajar. Chegar, correr, viajar... vai ser a minha vida".O primeiro português a participar na World Marathon Challenge explicou ainda como é que se preparou para uma semana em que vai correr 295 quilómetros em sete dias e em que irá também passar cerca de 63 horas em aviões. "Chegar, correr, viajar. Chegar, correr, viajar... vai ser a minha vida", confessou. E, olhando para o calendário da prova, que pode ver abaixo, é de confiar que assim será..Calendário da World Marathon Challenge 31 de janeiro - Voar da África do Sul para a Antártida, maratona e voo de regresso 1 de fevereiro - Maratona na Cidade do Cabo, viagem para Perth (Austrália) 2 de fevereiro - Maratona em Perth, viagem para o Dubai 3 de fevereiro - Maratona no Dubai, viagem para Madrid (Espanha) 4 de fevereiro - Maratona em Madrid, viagem para Santiago (Chile) 5 de fevereiro - Maratona em Santiago, viagem para Miami (EUA) 6 de fevereiro - Maratona em Miami.Acerca da preparação, diz que é "impossível saber se se está preparado". "Só quando chegar lá é que vou perceber se vou conseguir, é um teste impossível de fazer", ressalvou, explicando que já anda a fazer "testes físicos há sete meses, com muita corrida". "Na semana passada fiz seis meias-maratonas em sete dias, para treinar e perceber qual é o tempo de recuperação. Tenho de ver também a fase da prova em que tenho de andar, alimentar-me e tratar da nutrição, porque é uma prova de resistência. É uma panóplia de treinos e circunstâncias que têm de ser geridas. Agora, como é que sabemos que estamos preparados? Nunca vamos saber, só quando lá chegarmos", referiu..Hérnia apareceu a um mês da prova, mas o desafio é "60% psicológico".João Neto falou também dos contratempos que "vão surgindo constantemente", acrescentando a estes uma má notícia recente: "Ontem [quinta-feira] disseram-me que tinha uma hérnia inguinal, que é uma coisa ótima a um mês da prova...", disse em tom irónico. "É grave, mas vai ter de ser ultrapassado, porque obviamente não posso ser operado antes da prova porque não tenho tempo para recuperar. É mais um dado a ter em conta, que tem de ser gerido, e é mais um desafio. Mas a vida é mesmo assim, vou em frente e tentarei concluir", garantiu..Esta não é a primeira vez que o atleta tem problemas de saúde relevantes antes ou depois de uma prova, o que já aconteceu "muitas vezes, com muitas lesões". Lembra já ter terminado uma maratona a sentir-se mal e acabou "internado nove dias com um problema grave no intestino". Por isso, refere que "tudo é possível", comentando que este tipo de desafios são "40% físicos e 60% psicológicos".."É na parte psicológica que muitos atletas tombam, porque é completamente desconcertante estar a começar uma maratona e pensar que faltam sete. É complicadíssimo. O problema é que não há descanso, vai-se para um avião, dorme-se no chão e é preciso gerir, não há outra forma", explicou.."Já que estamos a fazer uma coisa, que seja emblemática e marcante".Sobre o equilíbrio entre as corridas e a vida pessoal e profissional, referiu ser a parte "horrível" da situação, e que é necessária "uma metodologia de trabalho e um esforço enormes porque é muita coisa ao mesmo tempo"..A motivação pessoal, no entanto, é contínua e simples: "Superação pessoal e alcance de objetivos são as principais razões." "Sou um amador não é? Mas, ao fim ao cabo, sou quase um profissional. Mas faço isto por gosto e para chegar a objetivos. Também, de certa forma, para promover Portugal lá fora em termos desportivos, o que é um alento adicional. É por isso que me candidato a estas provas mais extremas", disse.."Comecei a correr aos 45 anos e a fazer maratonas aos 47. Tenho 52 anos e é preciso muita perseverança, força de vontade, esforço e dedicação. É a única forma, não há outra. Em cinco anos tenho duas ultramaratonas, mais 19 maratonas. Se Deus quiser, daqui a um mês terei 28 e, portanto, é tudo com muito trabalho, muita dedicação, e sempre a dar a volta ao mundo, porque são sítios muito díspares uns dos outros. Mas já que estamos a fazer uma coisa, que seja emblemática e marcante", frisou.