Ser forte dá votos
Houve jovens a votar ontem nas presidenciais russas que não conheceram outro líder que não fosse Vladimir Putin, isto partindo do princípio de que mesmo quando foi primeiro-ministro e Dmitri Medvedev assegurou a chefia do Estado (2008-2012) era ele o homem forte do Kremlin. Ora, se há razão que explique o novo êxito eleitoral de Putin é mesmo a força que projeta, seja na exibição das fotos em tronco nu, seja nas imagens que o mostram a lutar judo, seja na forma como anexou a Crimeia e salvou também o regime sírio, seja ainda nas recentes declarações sobre armas invencíveis em poder da Rússia, resposta à crescente hostilidade do Ocidente.
Os mais jovens cresceram vendo esta constante demonstração de força, desde que na véspera do ano novo de 1999 Putin herdou o cargo de Boris Ieltsin (e depois foi eleito). E as gerações mais velhas têm a vantagem de poder fazer comparações, seja com os tempos finais da União Soviética e Mikhail Gorbachev a ser incapaz de reformar o sistema e acabando por enterrar uma superpotência, seja com a era de Ieltsin como presidente russo, marcada pelo caos interno e pelo alargamento da NATO a vários antigos países do bloco comunista.
A memória de Gorbachev (tão idolatrado no Ocidente como desprezado na Rússia) e de Ieltsin (um homem corajoso que se deixou tornar uma caricatura) joga totalmente a favor de Putin, mas na verdade os chamados liberais também nunca conseguiram impor-se como alternativa aos olhos da população e a prova disso é que os outros dois candidatos mais votados ontem tenham sido o comunista e o ultranacionalista.
Respeitador formal da Constituição (por isso em 2008 cedeu lugar a Medvedev), Putin já deu sinais de que não quererá mudar as regras para se manter depois de 2024 (agora os mandatos são de seis anos e não de quatro). O que levanta a questão do seu sucessor, mas também do seu legado. E neste último campo a força dá lugar a alguma debilidade: sob Putin, a Rússia recuperou o prestígio e a autoconfiança, mas a economia continua demasiado dependente do petróleo e do gás, enquanto a demografia, depois de uma ligeira recuperação, permanece terrível, pois o maior país do mundo vive uma sangria de gente. Mais do que preocupar-se com o senhor que se lhe vai seguir, Putin deverá aplicar-se a fundo para vencer estas duas frentes de batalha e entregar um país mais dinâmico e de facto mais forte. Vai precisar mesmo de muita força.