Quem vive em Lisboa já notou com certeza a sua presença em força nas ruas. Nos cruzamentos, como polícia-sinaleiro, em viaturas e motos a patrulhar, em grandes eventos a gerir o trânsito. Desde o início do ano, a Polícia Municipal (PM) herdou da PSP estas competências e, para as honrar, a autarquia apostou em grande neste novo "exército" da cidade: 3,3 milhões de euros de investimento para 2017, seis vezes mais do que no ano passado (470 mil euros) e o maior efetivo de sempre, com 602 polícia, 257 dos quais entrados neste ano, todos vindos da PSP. Com 98 civis, totaliza 700 pessoas..A visibilidade tem produzido os seus efeitos e, ao contrário do que se poderia esperar - mais agentes igual a mais multas -, as infrações e respetivos autos de contraordenação de trânsito estão em tendência descendente (ver números). Até nos radares fixos, agora com todos os 21 painéis a funcionar, se registou uma diminuição de condutores apanhados em excesso de velocidade, nos primeiros três meses do ano. "Há uma clara consciencialização dos condutores para o cumprimento das regras de velocidade e resultados muito positivos das campanhas de sensibilização efetuadas", sublinha o vereador da Câmara Municipal de Lisboa (CML), Carlos Castro, que tutela este setor. Prevenção acima de tudo e criar condições para uma boa mobilidade na cidade, dos peões e veículos. Sem esquecer que, com a Carris sob a sua responsabilidade, a câmara quer evitar demoras na circulação dos autocarros. Para isso, a PM tem previstas patrulhas nas zonas mais complicadas de trânsito e estacionamentos para "limpar" as estradas e impedir paragens..Mas há outro efeito, não menos surpreendente, da nova visibilidade desta polícia da cidade: há cada vez mais lisboetas a denunciar ilegalidades, conhecidos na PM, em tom de brincadeira, como "profissionais da denúncia". 20 435 telefonemas, e-mails e mensagens no Facebook foram recebidos na PM, no primeiro trimestre do ano, a denunciar infrações, sobretudo de trânsito, obras e ruídos. Segundo dados oficiais cedidos pela CML, deram origem ao levantamento de 2527 autos de contraordenação. Para fiscalizar o trânsito, principalmente carros mal estacionados, a PM conta com uma espécie de "milícia" de lisboetas que "quase se profissionalizaram em denunciar infrações", conta um agente desta divisão. A lei prevê esta possibilidade (artigo 5 do artigo 170 do Código da Estrada) e os denunciantes identificam-se, enviam fotografias da infração, indicam qual a violação da lei em causa e às vezes até testemunhos. Entre janeiro e março deste ano foram levantadas 1332 autos com esta origem. O maior número dos últimos anos (780 em 2015 e 990 em 2016)..O reforço de efetivos e de meios - carros e motos - serviram principalmente para as novas competências do trânsito. Os novos agentes, de farda nova e vários de carros-patrulha e motos a estrear, recebem as ordens ao início dos turnos das 06.30 da manhã e das 15.00. Na quarta feira, lá estava, cerca de meia centena, numa sala espaçosa na sede da PM, junto à Praça de Espanha, sentada em carteiras a fazer lembrar uma sala de aulas, o grupo da tarde. O supervisor operacional ia chamando os nomes e distribuindo a missão do dia. "Pessoal dos bloqueadores, Cruz, Costa, Gaspar e Lobão, vocês vão para aquela zona junto ao El Corte Inglés, Rua Cardeal Cerejeira. Branco fazes parceria com o Pontes a dar apoio à pintura de sinalização horizontal ali na estrada de Chelas. O Reis e o Caiado vão para a Praça do Comércio..." Vai chamando o supervisor operacional, Leonel Pereira. Tem o mapa da escala na mão e distribui o trabalho para a tarde. "Definem-se antes, entre o Secretariado dos oficiais, as missões do dia e depois definem-se as prioridades, tendo em conta o efetivo disponível", explica ao DN. "Atenção, Amorim e Rodrigo, vocês vão para a zona da Rotunda 25 de Abril com a Infante D. Henrique. Há obras e aquilo é complicado. Há três faixas reduzidas a uma. Se for necessário começar a levantar o braço para auxiliar, façam-no", aconselha à última equipa. O "levantar o braço" é como se referem ao trabalho de polícia-sinaleiro..Há cerca de 10 anos, quando o atual primeiro-ministro era ministro da Administração Interna, a ideia de transferir competências de trânsito da PSP para a PM causou polémica e resistência da hierarquia da força de segurança. Ainda não é totalmente pacífico, mas com a nova legislação e o "sangue fresco" entrado neste ano na PM, a cooperação entre ambas as polícias tem funcionado. Gosta mais da PSP ou da PM? É uma pergunta que nem faz muito sentido. Para responder, Leonel Pereira mete a mão ao bolso, tira uma carteira preta e abre-a para mostrar o cartão profissional da PSP. "Agora visto esta camisola da PM, mas sou sempre polícia", garante.